19/05/2015 - 18:06
Mais do que nunca nesta temporada, as principais Ligas europeias tiveram como campeões os clubes de maior orçamento, condenando os outros a um papel de meros coadjuvantes.
A última vez que um azarão ignorou o favoritismo dos rivais mais ricos foi em 2012, com o título francês conquistado pelo Montpellier.
Na época, o clube do sul da França tinha apenas o 13º maior orçamento entre os vinte clubes da Ligue 1, com 36 milhões de euros, menos que o valor pago no início daquela temporada pelo Paris Saint-Germain para contratar o argentino Javier Pastore.
O meia custou 42 milhões, e foi o primeiro grande investimento do fundo de investimento catariano QSI, que comprou o PSG em agosto de 2011. Mesmo assim, os parisienses amargaram o vice-campeonato.
“Montpellier foi sem dúvidas a última anomalia deste tipo”, avalia Didier Primault, diretor do Centro de direito e economia do esporte (CDES) de Limoges.
Desde então, o PSG vem esmagando a Ligue 1 de forma implacável. No último sábado, garantiu o terceiro título seguido.
Já tinha conquistado a Copa da Liga francesa, em abril, e tem tudo para faturar a inédita ‘Tríplice coroa’ nacional, se vencer a final da Copa da França, contra o Auxerre, da segunda divisão, no dia 30 de maio.
Para alcançar tal supremacia, o clube parisiense começa vencendo de goleada no âmbito financeiro. Com um orçamento de 480 milhões de euros, é três vezes mais rico que os três principais rivais, Lyon, Monaco e Olympique de Marselha.
“As surpresas são cada vez mais improváveis, por conta da força financeira do PSG. Se olhar para a classificação da Ligue 1, é possível observar algumas pequenas defasagens entre o orçamento e o lugar na tabela, mas são diferenças ínfimas”, ressalta Primault.
Na Alemanha, Itália, Espanha, e, com algumas nuanças, na Inglaterra, a situação é a mesma.
Na Bundesliga, o Bayern, com orçamento de 487 milhões de euros, papa todos os títulos. Nos últimos anos, só deixou escapar alguns troféus na mão do Borussia Dortmund, longe de ser um primo pobre (285 mi).
O mesmo acontece na Itália, com a Juventus (280 mi) conquistando o tetra ao tirar proveito da derrocada dos clubes de Milão, abandonados pelos investidores.
Na Espanha, a hegemonia da dupla Real-Barça foi quebrada no ano passado, com o título do Atlético de Madri, mas tudo voltou ao normal com mais uma conquista catalã (484 Mi).
Clube mais rico do mundo (550 mi), o Real é vice-líder, mas vai passar o ano em branco, depois de conquistar a Liga dos Campeões na temporada passada.
Na Inglaterra, as riquezas são menos concentradas, mas os cinco primeiros colocados estão entre os dez clubes de maior orçamento do mundo (Manchester United 518, Manchester City 414, Chelsea 388, Arsenal 359 et Liverpool 305).
Nesta temporada, quem levou a melhor foi o Chelsea, terceiro time mais rico da Premier League, mas os pequenos chegam a protagonizar algumas zebras, porque contam com mais recursos do que clubes de menor escalão em outros países.
“A Inglaterra tem sem dúvidas o campeonato mais solidário, porque os direitos de TV são divididos de forma igualitária entre os clubes. Por isso existe real possibilidade de alternância”, explica Primault.
Uma alternância entre ricos, porque dificilmente um clube fora do top 5 pode conquistar o título.
Na Espanha, o governo e a Liga Profissional local (LFP) estão tentando diminuir o abismo entre os ‘gigantes’ Barça e Real e os demais clubes, com um decreto que acaba com a negociação individual dos direitos de TV, mas a Federação do país (RFEF) e o sindicato dos jogadores ameaçaram fazer greve nas últimas rodadas do campeonato.
O ‘Fair-play’ financeiro, implantado pela Fifa para diminuir a influência de investidores externos, pode, por incrível que pareça, aumentar ainda mais essas diferenças de orçamento.
Ao impedir que um clube gaste mais do que arrecada por conta própria, a medida acaba obrigando todos a serem competitivos em todos os setores, o que é mais difícil para times sem tradição.
“Hoje, os grandes clubes são os mais eficientes para tirar o melhor de todas as fontes de arrecadação: categorias de base, estádios, bilheteria, marketing. São melhores em todos os aspectos, e só contratam profissionais de ponta”, explica Lionel Maltese, professor de marketing esportivo na Kedge Business School de Marselha.
Didier Primault não acha necessariamente que a hegemonia dos mais ricos coloca em risco o interesse do torcedor pelas competições. “Só uma hegemonia muito longa pode acabar com o interesse do público”, o que sequer aconteceu na França na década passada, apesar dos sete títulos seguidos do Lyon, hoje desbancado pelo PSG.
Primault está mais preocupado com o destino dos ‘primos pobres’. “O modelo econômico dos clubes dominantes precisa ser reinventado, senão, a casa toda corre risco de cair”, opina, justificando a tentativa espanhola de diminuir as diferenças.
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