05/08/2025 - 13:35
A próxima escalada na briga entre EUA e Brasil já está programada. Há temas conflituosos de sobra além de Bolsonaro. De repente, o “país tropical” se vê de volta ao centro da geopolítica.O presidente Luiz Inácio Lula da Silva apostou alto – e saiu-se surpreendentemente bem até agora. Embora os Estados Unidos tenham taxado as exportações brasileiras em 50%, o maior valor na comparação global, a Casa Branca poupou quase metade dos bens, sujeitos à tarifa mínima de 10% imposta em abril.
Sendo assim, a estratégia de Lula pode ter valido a pena. Diferentemente da maioria dos chefes de governo ao redor do mundo, o ex-sindicalista não reagiu às ameaças tarifárias de Trump com bajulação, concessões unilaterais ou subserviência precipitada, e sim com críticas claras. Chamou as ameaças de Trump de “chantagem inaceitável” e declarou: “Não é um gringo que vai dar ordem a este presidente da República.”
Porém, mal houve espaço para negociações. Trump havia combinado sua ameaça de tarifa recorde com exigências políticas: o Brasil deveria suspender imediatamente o processo judicial ao qual o ex-presidente Jair Bolsonaro responde por envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado. Mas o governo brasileiro não podia e nem queria atender a essa demanda.
Foi por isso que Trump reagiu na semana passada com duas medidas mais duras. A primeira foi o sancionamento do ministro do STF Alexandre de Moraes, relator do processo na Corte contra Bolsonaro e enquadrado na Lei Magnitsky – instrumento dos EUA geralmente reservado a ditadores e seus cúmplices. Ao mesmo tempo, Trump anunciou a imposição do tarifaço recorde, embora com uma extensa lista de isenções.
Por causa do tarifaço americano, economistas esperam que o Brasil deixará de crescer, no máximo, 0,4%. No fim das contas, a economia brasileira é extremamente fechada e a conjuntura não depende tanto do comércio exterior, como é o caso da Alemanha ou do México, por exemplo.
Confronto Brasil x EUA está só no início
Ainda assim, tenho minhas dúvidas. Acho que o Brasil e os EUA estão só no início de um confronto, e que ele seguirá escalando. Desde a semana passada, a espiral de medidas se acentuou. Depois que Bolsonaro foi posto em prisão domiciliar, o Departamento de Estado americano agora ameaça com mais sanções. E o ministro Moraes não parece se deixar intimidar pelas ameaças de Trump, de modo que novas retaliações podem estar a caminho. É provável que Bolsonaro seja condenado nos próximos meses. Por isso, Trump continuará de olho no Brasil – pelo menos até as eleições de 2026.
Há temas conflituosos de sobra além de Bolsonaro: a cooperação econômica crescente do Brasil com a China; o papel de Lula no Brics, bloco que reúne adversários dos EUA como Rússia, China e Irã; as importações de diesel e fertilizante da Rússia; a atuação do judiciário brasileiro contra empresas americanas de tecnologia, como o X, para citar alguns exemplos.
Os cenários para novas escaladas são sombrios. Trump poderia usar a Lei Magnitsky para, sob o pretexto de repelir uma ameaça à nação, sancionar outros políticos, juízes e membros do governo brasileiro. Também poderia vetar a emissão de vistos a brasileiros, ou anular vistos existentes.
Até agora o Brasil sempre esperou passar despercebido por Trump, ser visto como insignificante demais em comparação aos parceiros comerciais ou concorrentes de peso dos EUA, como a Europa, a China ou o Japão. Mas essa esperança se desfez no ar. Mais uma vez, o Brasil se vê subitamente no olho do furacão.
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Há mais de 30 anos o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.