23/07/2025 - 8:22
Tensão comercial e diplomática entre Brasil e EUA serve a ambos os presidentes, mas economia brasileira pode sofrer consequências graves se Lula resolver ajudar com subvenções os setores afetados pelo tarifaço.Já faz duas semanas que a briga entre o Brasil e os Estados Unidos sobe de tom quase todos os dias. Ela começou com a ameaça do presidente Donald Trump de impor uma tarifa de 50% a produtos importados do Brasil caso o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro não fosse encerrado.
A disputa ameaça virar a pior crise de política externa entre os dois países em um século. E por um motivo questionável: tanto Trump quanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva miram sobretudo ganhos políticos internos. As provocações calculadas beneficiam ambos, e ambos aceitam que haja danos econômicos colaterais.
Dá para resumir a disputa da seguinte maneira: Trump quer punir o Brasil, maior economia da América Latina, porque o país se volta cada vez mais para a China. Assim como já havia feito antes com a África do Sul, ele escolheu o mais fraco dos países do Brics para dar uma lição. Pois, ao contrário da China e da Índia, o Brasil praticamente não dispõe de opções para ameaçar os Estados Unidos.
Ao mesmo tempo, Trump quer, com seu apoio a Bolsonaro, fortalecer os movimentos de extrema direita em todo o mundo.
Do lado brasileiro, Lula ganhou uma injeção de energia com o ataque de Trump. O presidente, um tanto enfraquecido no seu terceiro mandato, pôde puxar a carta da soberania nacional e rotular o clã Bolsonaro e apoiadores de traidores da pátria. A popularidade do petista, que andava em queda, voltou a subir.
Efeitos
Ao fim, a conta vai ficar para os consumidores, sobretudo os mais pobres, tanto no Brasil como nos Estados Unidos. Num primeiro momento, porém, parece que os brasileiros vão pagar um preço mais alto, pouco importando no que esse imbróglio vai dar. Pois não são as tarifas ou sanções, mas sobretudo a reação de política econômica de Lula que mais pode afetar o Brasil no médio prazo.
Explico: os Estados Unidos querem elevar as tarifas para produtos brasileiros de exportação. Além de aço, petróleo e produtos agrícolas, isso atinge principalmente produtos industriais, como autopeças, motores elétricos e aviões. A Embraer, por exemplo, depende muito do mercado norte-americano. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos estão ameaçando os países que compram produtos da Rússia com sanções, e o Brasil importa diesel e fertilizantes da Rússia.
No Brasil, os investidores apostam que Trump, ao contrário do que anunciou, não vai impor uma tarifa de 50% em 1º de agosto. Afinal, se o suco de laranja, o café, a carne bovina e os jatinhos ficarem mais caros de uma hora para a outra, os mais prejudicados seriam os consumidores dos Estados Unidos.
Resposta pode piorar quadro
Mas mesmo se essa tarifa for imposta, a consequência dela para a economia brasileira como um todo será bem pequena.
Bem piores, para a economia brasileira, seriam as consequências se o governo Lula resolver ajudar com subvenções os setores afetados pela tarifa de Trump – o governo já discute uma linha de crédito emergencial.
Lula percebeu a chance de melhorar a sua imagem entre empresários que, em sua maioria, apoiam políticos da direita, como Bolsonaro. Ele espera conseguir trazer para o seu lado uma parte do empresariado e do setor agroindustrial que tradicionalmente é conservadora.
Só que o aumento de gastos públicos, somado a um déficit já crescente, ameaça virar, no longo prazo, um fardo estrutural. Os juros iriam subir, o real iria se enfraquecer, e a inflação subiria.
Seria um retorno a uma mentalidade de política industrial que já custou caro para o Brasil no governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Ela também não conseguiu, com um programa bilionário de subvenções, garantir a simpatia do empresariado e levá-los a investir, e o preço que o Brasil pagou por essa política foram anos de estagnação.
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Há mais de 30 anos o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.