Durante um evento com militares na quarta-feira (1º de setembro), o presidente Jair Bolsonaro soltou mais uma de suas frases de palanque: “Quem quer paz precisa se preparar para a guerra”. A declaração, que por si só já seria irresponsável quando dita por alguém que comanda uma nação democrática e historicamente pacífica, fica ainda mais abjeta diante do fato de que um dia antes o IPEA divulgou o Atlas da Violência. No relatório, a constatação de que o Brasil nunca foi tão violento contra seus próprios cidadãos.

Segundo o estudo, entre 2009 e 2019, mais de 623 mil brasileiros foram assassinados. É como se, em 11 anos, o País tivesse eliminado toda a população de Cuiabá, capital de Mato Grosso. Desse total, 333 mil (53%) eram jovens e adolescentes com idade entre 15 e 29 anos; 50 mil, mulheres; e cerca de 2 mil eram índios. Em 70% destes casos, o crime foi cometido com arma de fogo. E o presidente pede que as pessoas comprem fuzis em vez de feijão.

Se depender do número de armas em mãos de civis, o número de mortes tende a aumentar. Nos últimos três anos, esse arsenal duplicou e hoje ao menos um em cada 100 brasileiros está armado. Apenas no ano passado foram registradas 186.071 novas armas, aumento de 97,1% em relação ao período anterior. Com Bolsonaro, o Brasil está de fato se preparando para uma guerra. E as baixas, neste caso, são de civis brasileiros. Mas, para o presidente, o ideal seria quintuplicar o número de armas. “Quanto mais armado estiver o povo, melhor é para todo mundo”, afirmou, ao comentar a alta nos registros.

Além das mortes, outra pesquisa chama atenção. Dados do Instituto Sou da Paz apontam que cerca de 8% das armas apreendidas no Brasil são de origem europeia. Em outras palavras, a comunidade que mais têm pressionado o Brasil no cumprimento de boas práticas ESG (ambiental, social e de governança) está contribuindo para a destruição do bem-estar social do Brasil.

O dado prova que, mais uma vez, quando o assunto é a pauta ESG ainda há muito a ser feito para que a prática acompanhe o discurso. Afinal essas incoerências só reforçam as teses de que por trás de uma pressão pela urgente – e necessária – mudança de atitude rumo à preservação dos recursos naturais, as lideranças internacionais estão mais preocupadas em garantir insumos que encham os cofres dos países que administram.