08/04/2018 - 13:05
Depois de 52 horas históricas carregadas de giros inesperados, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ingressou no sábado (7) em uma prisão em Curitiba, em meio às expectativas de um país dividido entre aqueles que amam Lula e o odeiam, mas não o perdem de vista.
A seis meses das eleições, a vida pública da maior economia da América Latina entra em uma nova etapa, cheia de interrogações.
– Nova vida –
Figura-chave da história recente do Brasil e do continente, Lula se definiu em 2007 como uma “metamorfose ambulante”. Naquele momento, ainda era o presidente com passado de operário que se entendia com o mercado e com uma infância de menino pobre que venceu a fome, conseguindo saltar da fábrica para o Planalto (2003-2010).
Aos 72 anos, Lula começa agora a vida de presidiário e, embora ainda seja cedo para saber se algum recurso pode soltá-lo no curto prazo, ou como ele vai-se adaptar, ninguém tem dúvida de que nada passará despercebido.
“Ele é um líder nato, uma figura fundamental na história política e, especificamente, da esquerda”, afirmou o analista André Cesar, da consultoria Hold.
“Da prisão, vai continuar exercendo sua influência e também poderá explorar o simbolismo da vitimização, como apontou em seu discurso”, acrescentou.
Para a história, nos últimos dias, o que se teve foi um Lula mais Lula do que nunca.
Entrincheirado na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo, mesmo lugar que o transformou em ícone há três décadas, o ex-presidente desafiou ordens, negociou com as autoridades, fez um emocionante discurso e acabou se entregando escoltado e amparado por militantes eufóricos e incansáveis.
– A encruzilhada da esquerda –
Em seu último pronunciamento em liberdade, o ex-líder sindical deixou muitas mensagens. Comunicador brilhante, Lula esteve o tempo todo cercado pelos jovens pré-candidatos da esquerda Manuela d’Ávila PCdoB), que mal conseguia conter as lágrimas, e por Guilherme Boulos (PSOL).
Para ambos, teve palavras sobre seus futuros promissores, que contrastaram com as menções bem mais protocolares daqueles que podem substituí-lo como candidato pelo PT para outubro.
“Agora não tem nomes fortes dentro da legenda. [Os ex-ministros] Jaques Wagner, Fernando Haddad são pessoas qualificadas, mas não têm pegada. Então Lula poderia apostar em alguém de esquerda, mas não necessariamente do PT”, afirmou Cesar.
Ainda é prematuro, contudo, falar da eventual união de uma frente progressista tão fraturada quanto a brasileira.
“Talvez Lula tenha lançado esse anzol para ver qual é a reação, levando-se em conta que o país inteiro estava vendo, com Globo transmitindo seu discurso ao vivo”, sugeriu.
– Os adversários –
Com Lula preso e sua participação nas eleições praticamente inviabilizada, abre-se a disputa pelo capital eleitoral daquele que era o líder com folga nas pesquisas.
E, apesar de a maioria de seus adversários ter-se mostrado prudente em um primeiro instante, os movimentos após a prisão do petista podem decidir o nome do próximo presidente.
“O cenário ficou agora menos previsível e mais pulverizado, porque já não tem uma pessoa que polarize tanto quanto Lula”, disse à AFP o professor Oliver Stuenkel, da Fundação Getúlio Vargas.
Um novo panorama que, segundo vários analistas, pode neutralizar a ascensão da extrema direita, cujo candidato Jair Bolsonaro (PSL-RJ) aparecia em segundo lugar nas sondagens.
“Quem mais vai sofrer com o fato de Lula estar fora é Bolsonaro, porque ele cresceu como um dos possíveis anti-Lula e, agora, a campanha tende a ser menos polarizada”, acrescentou.
Como vem acontecendo nos últimos e frenéticos anos no Brasil, tudo pode mudar em questão de horas, porém.
“No Brasil, tudo é possível. Pode acontecer de Lula passar uma semana na prisão e, por exemplo, um juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) mandá-lo depois para prisão domiciliar”, afirmou Stuenkel.
“Como faz tempo que estamos no campo das decisões sem precedentes, é realmente complicado dizer o que vai acontecer”, apontou.