Existe um nó górdio no tema da alimentação. E ninguém ainda – país, empresa, associações ou a ciência – tem conseguido desatá-lo por completo. Trata-se de uma corrida contra o tempo. Há uma combinação explosiva que reúne questões climáticas, novos hábitos (em especial o de gerações mais jovens), maus tratos a animais, capacidade de fornecer nutrientes a 8 bilhões de pessoas e inflação no preço de alimentos. Esse caldeirão tem feito o assunto se tornar inevitável à mesa. Nesse cenário, a indústria de comida à base de plantas passa a ser vista como saída da encrenca. Sim, o tal do hambúrguer de vegetais e similares.

Estudo divulgado ano passado pelo serviço Bloomberg Intelligence diz que o chamado mercado plant-based food terá mais que dobrado de tamanho em cinco anos entre 2020 (quando movimentou globalmente US$ 29,4 bilhões) e 2024 (quando estima-se que irá gerar US$ 64,7 bilhões). Até o fim da década, em 2030, o crescimento terá sido de 450% e bater em US$ 162 bilhões.

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O que levará a esse aumento? Segundo o relatório, são cinco pontos: inovação (já que a tecnologia deixará texturas, sabores, cores e cheiros muito próximos aos dos alimentos convencionais); aumento da capacidade de produção; aumento da logística de distribuição; os dois itens anteriores levarão ao quarto ponto, que é a queda nos preços; por fim, aceitação do consumidor. A adoção desse arsenal, no entanto, não vai ser simétrica entre países. No caso brasileiro, será decisivo para um novo padrão do consumo de alimentos a adoção de saídas públicas. Educar e permitir às pessoas a comer de um novo jeito não partirá apenas de setores privados – cuja maioria ainda defende interesses que nem sempre navegarão para o lado certo da história na urgência necessária.

Tampouco sairá vitoriosa uma agenda quase guerrilheira de militantes da causa alimentar. A intermediação desse embate deve se tornar pauta de Estado. Isso não significa deixar na mão de um governo, ainda mais dos nossos. Significa colocar na mesa uma agenda com pesquisadores, empresas, sociedade civil, foodtechs para equacionar dilemas que trombam inclusive na permissividade nacional em deixar virar alimento réguas de controle que muitos países não permitem – de quantidade de açúcares a níveis de conservantes.

Uma parte da resposta está em tratamento fiscal e logístico. Nos Estados Unidos, em que a cultura do alimento feito a partir de plantas está muito mais amadurecida do que aqui, os preços ainda são invariavelmente maiores em relação aos alimentos convencionais. Reportagem de outubro de 2021 do veículo especializado Grocery Dive mostrava uma diferença média de preço de 16% entre a carne de origem vegetal e a de origem animal. É muito. Os fabricantes de carne à base de vegetais disseram que a paridade de preços é decisiva para o aumento do consumo. Nesse campo, o Brasil criou um ecossistema econômico-fiscal diferenciado para o agronegócio que poderia servir de modelo e inspiração.

Não haverá como cuidar do clima, e da fome, sem essa mudança revolucionária sobre como comemos. Até porque os preços dos alimentos convencionais deverão seguir elevados no mundo todo. Segundo o braço da ONU para a alimentação, a FAO, o Índice de Preços de Alimentos (FFPI) teve média de 140,7 pontos em fevereiro de 2022, alta de 5,3 pontos (3,9%) em relação a janeiro e de 20,7% sobre fevereiro de 2021. Foi um novo recorde histórico, superando o topo anterior, de fevereiro de 2011, em 3,1 pontos. E os efeitos da guerra na Ucrânia nem foram totalmente medidos. Inovar no campo da alimentação será a próxima grande batalha. Até porque, comer melhor por um preço menor é tema de saúde pública. E a gente aprendeu na marra, durante a pandemia, que saúde pública é a base da economia saudável.