Por Beto Silva

RESUMO

• A padaria de bairro do México virou uma potência mundial em alimentação
• Presente em 34 países, tem 139 mil funcionários
• O Brasil está no Top 5 da companhia e tem o maior potencial de desenvolvimento
• Funcionários brasileiros deram ideias para produtos e maneira de vender
• Bimbo tem desafios no varejo alimentício do País, mas muitas oportunidades

 

Embrulhar um pão em celofane para levá-lo mais fresco ao consumidor não é uma inovação nos dias de hoje. Mas 78 anos atrás era uma novidade. O pão fatiado para sanduíches produzido em uma pequena fábrica então recém-inaugurada, em 1945, no bairro conhecido como Santa María Insurgentes, na Cidade do México, ganhou o paladar dos mexicanos. E a embalagem foi tão bem aceita quanto o produto. As fornadas da padaria Bimbo, com pães embalados por uma fina película transparente, ficaram famosas no país. Décadas mais tarde, começaram a ser comercializadas mundo afora. Atualmente a operação está em 34 países, com 204 fábricas e 3,3 milhões de pontos de venda. Dos 34 funcionários que iniciaram as atividades há quase oito décadas, a Bimbo chegou a 139 mil, espalhados pelo planeta.

De uma máquina de fazer pães, o negócio virou um instrumento de fazer dinheiro. O faturamento global da companhia bateu US$ 23,2 bilhões ano passado.

O Grupo Bimbo está inserido em um mercado que movimenta US$ 561 bilhões no mundo, segundo estudo da GlobalData (de 2021). A empresa detém 4% desse montante.

O setor é bastante pulverizado, com 36,8% de share para as padarias artesanais — dado que se traduz em uma enorme oportunidade de crescimento.

Para o Grupo Bimbo, isso tem se traduzido em mais receita nos últimos cinco anos, como afirmou à DINHEIRO o sócio da consultoria Valor Investimentos, Gabriel Meira. “Nesse período, as ações registraram variação positiva de 120%”. Para ele, alimentação é essencial e não sofre com sazonalidades.

Cadeia logística da Bimbo trabalha para que o pão chegue ao consumidor em até trës dias após a fabricação

Os principais mercados da Bimbo são:
• Estados Unidos e Canadá, responsáveis por 49,3% da receita,
• seguidos por México (31,4%),
• Europa, Ásia e África (9,9%).

Na América Latina estão 9,5% das vendas, a maior parte delas no Brasil, onde o Grupo Bimbo ligou seu forno em 2001, ao adquirir a Plus Vita e a Pullman. Em 2008, comprou a Nutrella. Aqui ainda detém as marcas Rap10, Ana Maria e Crocantíssimo.

O País está no Top 5 da companhia e tem o maior potencial de desenvolvimento. “É o motor de crescimento para os negócios do grupo, uma referência. Nosso projeto é de longo prazo e estamos otimistas com o futuro”, disse à DINHEIRO o mexicano Alfonso Argudín, CEO da Bimbo Brasil.

A preparação para o futuro começou quatro anos atrás, quando Argudín assumiu o comando da operação brasileira após dez anos como executivo de alto escalão das áreas comercial e de marketing.

Na reformulação do plano de atuação no País, o destaque foi uma gestão mais descentralizada, com empoderamento dos colaboradores. “Tivemos mais de 1 mil iniciativas sugeridas. Tornamos a administração mais democrática”, disse o CEO.

A partir da ideia dos funcionários foram lançados produtos e até a maneira de vender foi alterada. Antes, o modelo de negócio era de venda pré-pronta, em que os caminhões saíam das fábricas para abastecer as gôndolas conforme a necessidade. Agora, o modelo é de pré-venda, com os pedidos tirados antes.

Com aplicação de tecnologia, os processos estão mais rápidos e eficazes para encarar o desafio da logística de entrega no País. “É uma cadeia complexa e cara para entregarmos um pão fresquinho ao consumidor em até três dias após a produção”, afirmou Argudín.

CEO global e chairman do grupo, Daniel Servitje tem citado nos relatórios da companhia a evolução dos negócios no Brasil

O planejamento do Grupo Bimbo para o Brasil prevê a constante ampliação e modernização das atuais 11 fábricas, espalhadas por cinco estados (Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo) e Distrito Federal.

Para atender à crescente demanda do mercado nacional, estão previstas duas novas plantas nas regiões Sudeste e Nordeste. As possibilidades de locais estão sendo estudadas. A expectativa é de que as obras sejam iniciadas no primeiro trimestre de 2024, com produção dos pães entre o fim do ano e começo de 2025.

REGIÃO AQUECIDA

Esses investimentos estão no bojo do US$ 1,5 bilhão que a empresa aplica anualmente em todo o mundo. O trabalho de Argudín junto ao conselho de administração é puxar o pão do Brasil para assar e crescer nos aportes da Bimbo.

Seu principal ingrediente, ou melhor, argumento, é a performance da América Latina, puxada pelas vendas em território tupiniquim. A região foi a que mais cresceu em receita em 2022, com avanço de 36,4% em relação a 2021. A média global foi de 17%. “A gente acredita no potencial do mercado brasileiro. Em menos de dez anos nossos negócios vão triplicar no Brasil”, disse.

(Shutterstock)
Grupo Bimbo possui uma divisão exclusiva de produção, distribuição e comercialização de produtos voltados a redes de fast food como Burger King e McDonald’s

Os bons resultados por aqui são citados em praticamente todos os relatórios trimestrais assinados pelo CEO global do Grupo Bimbo, Daniel Servitje, filho de Lorenzo Servitje e sobrinho de Roberto Servitje, fundadores da empresa.

A expansão é destacada “principalmente devido ao forte desempenho de vendas em todas as organizações, um mix aprimorado de produtos, ganhos de produtividade em toda a cadeia de fornecimento e fortes resultados no Brasil e na Argentina”, disse Daniel Servitje no relatório anual de 2022. O chairman aponta ainda o aumento das vendas no País “beneficiado pela inorgânica contribuição da aquisição da Aryzta”.

A compra da companhia ocorreu em outubro de 2021. O ano passado foi o primeiro completo da Bimbo na gestão da Aryzta, empresa que atua na produção, distribuição e comercialização de produtos de panificação e confeitaria voltados principalmente para o setor de restaurantes quick service.

Entre os principais clientes estão as redes de fast food Burger King e McDonald’s. Além disso, essa divisão da Bimbo estreita a relação com hamburguerias e eventos gastronômicos para ganhar penetração.

A companhia foi uma das parceiras do Fest Burger, maior festival nacional do setor, realizado no mês de novembro.

Argudín explica a estratégia. “Queremos nos aproximar dos estabelecimentos ao mesmo tempo em que levamos essa experiência para dentro das casas das pessoas”, disse.

Com a pandemia, o consumo de pão de hambúrguer cresceu nos lares. E permanece alto.

Marcos Pazzini, pesquisador especializado em consumo e responsável pelo IPC Maps (Índice de Potencial de Consumo), aponta a Bimbo como um player de peso, com marcas consagradas e bem aceitas pela população. Ele cita os desafios da empresa diante do desempenho geral do varejo alimentício, que teve crescimento nominal de 15,2% entre 2019 (antes da pandemia) e 2023.

Alimentação fora do domicílio puxou esse crescimento, com variação de 57% no período. Já despesas com alimentação no domicílio ainda não atingiram os valores de 2019, ficando 1% abaixo em 2023. Em 2019, o tamanho do mercado de alimentação no domicílio foi de R$ 580,4 bilhões. Em 2023 será de R$ 574,3 bilhões.

Já o mercado de alimentação fora do domicílio movimentou R$ 226,4 bilhões em 2019 e, em 2023, chegará a R$ 355,2 bilhões. “O desempenho negativo do segmento de alimentação no domicílio evidencia oportunidades para os grandes players, que podem oferecer o que essa população ainda não encontrou no mercado”, disse Pazzini.

PORTFÓLIO

O Grupo Bimbo aplica um plano agressivo de novidades no Brasil desde 2020. Nesses três anos, apresentou 15 lançamentos. Entre os destaques está a chegada da linha Artesano, marca líder e pioneira no segmento de pães artesanais que entrou no mercado brasileiro a partir das tendências e expectativas do consumidor.

A versão Pão na Chapa, por exemplo, teve origem na sugestão de colaboradores. A marca Nutrella, pioneira e única do segmento clean label — livre de aditivos químicos e conservantes artificiais —, lançou a assinatura Todo Natural, com cobertura de grãos em toda a fatia.

Mais recentemente, neste ano, a novidade ficou por conta de Artesano na versão pão australiano, que também está em bisnagas e pães de hambúrguer.

Com isso, a marca acompanha a rotina dos consumidores desde o café da manhã, passando pelo almoço, lanche e jantar.

“O brasileiro está muito disposto a experimentar produtos novos. Isso nos incentiva a inovar.”
Alfonso Argudín, CEO da Bimbo Brasil

Sobre itens que são comercializados em outros países, como o bolo de banana da bandeira Artesano, que é sucesso na Costa Rica, o executivo mexicano afirma que nos próximos meses entrarão mais novidades nas gôndolas dos mercados nacionais. “Pretendemos ampliar a marca Artesano, que ganhou o paladar do brasileiro. Ela está presente mais em produtos salgados atualmente. Mas temos planos”, disse o CEO da Bimbo Brasil. “Somos uma empresa global, então conseguimos trazer produtos exitosos em outros países. Esse é um movimento orgânico fundamental para termos vantagem competitiva.”

Segundo o consultor especializado em varejo e transformação digital Alberto Serrentino, fundador da Varese Retail, a Bimbo é uma potência, com um portfólio de marcas importante. “Desenvolveram muito a categoria de pães industrializados e estão sintonizados com as tendências de varejo. Entram em linhas funcionais, sem glúten e em tudo o que é tendência de consumo na busca por saúde e bem-estar nutricional”, afirmou. “Tem liderança consolidada e robusta no mercado brasileiro.”

Globalmente, a empresa investe por ano cerca de US$ 1,5 bilhão em Capex, boa parte desses recursos aplicados na ampliação e modernização da operação brasileira

SAÚDE E PLANETA

No cardápio do Grupo Bimbo, 98% dos produtos estão livres de cores e sabores artificiais. Na categoria de itens de consumo diário, a meta para 2025 é que os produtos não tenham mais do que dez ingredientes, todos reconhecidos pelos consumidores, e que os produtos de consumo ocasional estejam livres de ingredientes artificiais até 2030. Em relação à preservação do planeta, a companhia acelera na eletrificação da frota.

No México, inclusive, é a própria Bimbo que fabrica os veículos. Sim, produz pão e carro. Com as 1 mil unidades que entrarão em circulação em breve nas ruas mexicanas, serão 2,4 mil automóveis com emissão zero de carbono. É possível esse projeto vir para o Brasil?

Estudos estão sendo realizados, mas é improvável que seja construída uma linha de montagem de veículos por aqui, como ocorre no México. Sem deixar as questões de saúde e meio ambiente de lado, o Grupo Bimbo está focado em multiplicar os pães — e os resultados.