Custo Brasil. Você já deve ter ouvido falar algumas centenas de milhares de vezes que essa expressão, criada em 1995 pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), incorpora todos os caroços econômicos do País – a culpada pelos elevados preços de serviços e produtos do Oiapoque ao Chuí. De um simples secador de cabelo ou uma Airfryer da Polishop a R$ 1.300, até um iPhone ou um carro zero quilômetro, quase tudo por aqui custa mais caro do que em qualquer outro país civilizado. Muito mais. Custa mais porque o frete rodoviário é caro, porque os impostos são irracionais, porque a liberação de container no porto pode demandar um singelo faz-me-rir para os fiscais aduaneiros, porque parte do lucro das empresas vai para pagar salários de contadores e advogados tributários. Não há como negar. Fazer negócios no Brasil é desafio para ironman, para teimosos ou para ingênuos e desavisados.

Nem toda a responsabilidade, no entanto, pode ser jogada sobre os ombros do tal Custo Brasil. Com uma incrível memória inflacionária – aquela que acha normal impor 100%, 200% ou 300% de margem de lucro sobre qualquer produto –, o brasileiro é vítima de sua própria cultura. É o Lucro Brasil. Uma espécie de flashback dos anos 80 e começo dos anos 90, período em que o funcionário remarcador de preços nos supermercados corria o risco permanente de contrair tendinite por LER (Lesão por Esforços Repetitivos). Em um mesmo dia, os produtos chegavam a aumentar seus preços duas ou três vezes. Em março de 1990, a inflação chegou a 80%.

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Um vinho de R$ 200 no restaurante que custou R$ 30 no importador, um trainee da Geração Z que custa mais do que um cardiologista (com todo respeito à idade e à profissão de ambos), uma revisão veicular em concessionária que sai por quase 30% do valor do carro e planos de saúde que sobem 20% ao ano, seja qual for o cenário, são exemplos de uma economia em pandemônio. Quase não há critério racional na precificação. Uma espécie de bangue bangue econômico, num faroeste em que todos morrem no final.

Nos últimos dias, essa triste realidade ficou mais do que evidente. Ao anunciar a paulada de 24,9% de reajuste no preço do diesel, 18,7% na gasolina e 16% no gás de cozinha, a Petrobras despertou em parte dos empresários a velha cultura da malandragem, que inspirou Walt Disney a criar o Zé Carioca – que tira proveito de tudo, em qualquer oportunidade. Na quinta-feira 10, véspera dos reajustes que começariam a valer no dia seguinte, a gasolina, o diesel, o etanol e o botijão de gás já estavam reajustados. Sabendo que a demanda seria alta, antecipar um reajuste futuro seria um bom negócio para donos de postos e distribuidores.

É verdade que nada disso é proibido ou ilegal. Nas regras do livre mercado, o empresário cobra o que quiser e o consumidor escolhe onde comprar. O oportunismo dos empresários não está fora da lei, mas é um comportamento imoral, no mínimo, por amplificar uma crise já instalada – seja pela guerra de Vladimir Putin na Ucrânia, seja pela incompetência escancarada de Paulo Guedes e Jair Bolsonaro. Mas o gesto quase generalizado no País nos últimos dias revela que muitos empresários conseguem com facilidade trocar a fantasia de vítimas do Custo Brasil a protagonistas do Lucro Brasil. Na paz ou na guerra, cada um será lembrado pela bravura ou pela covardia.