16/09/2024 - 11:55
Navios respondem por maior parte do turismo no local, famoso pelo pôr do sol e prédios brancos com cúpulas azuis; prefeito estuda limitar número de visitantes para 8.000.Turistas desembarcam de enormes navios de cruzeiro no porto antigo de Santorini. Salta à vista o contraste entre as imponentes embarcações e a pequena baía do porto.
Já são quase 18h, mas a temperatura ainda está acima de 30 graus. Uma pequena barraca em frente à entrada do teleférico de Santorini vende água para os turistas que precisam se refrescar.
O teleférico é a maneira mais rápida de chegar a Fira, a pitoresca capital da ilha grega. Só que o veículo tem apenas seis vagões, cada um com capacidade para transportar no máximo seis pessoas, e parte a cada 15 a 20 minutos.
Turistas fazem fila esperam a sua vez por quase uma hora no calor escaldante.
A cena acima descrita ilustra como o turismo excessivo virou um problema crescente em toda a região mediterrânea da Europa.
Alguns lugares são particularmente afetados, como a ilha espanhola de Mallorca, alguns locais na costa adriática da Croácia, e Kotor, em Montenegro.
De todos os destinos de férias europeus, as ilhas gregas, especificamente Santorini, talvez sejam as que mais sofrem com o turismo de massa.
Situada no arquipélago das Cíclades, Santorini é mundialmente famosa por seus prédios brancos com cúpulas azuis e pelo magnífico pôr do sol.
Excursões de um dia lotam a ilha
Uma viagem de ida e volta no teleférico custa 12 euros (cerca de R$73,68). Todos dentro do vagão estão calmos e relaxados, e a vista é de tirar o fôlego.
Um jovem casal tira fotos. Outros preparam suas câmeras e verificam seus equipamentos. A viagem dura menos de três minutos.
A calma se dissipa assim que o teleférico chega ao topo da colina. Os turistas saem dos vagões e, em pouco tempo, as ruas estreitas e sinuosas e os becos de Fira estão lotados de pessoas.
Todos parecem ter pressa para desbravar o lugar. Quem veio de cruzeiro tem apenas um tempo limitado na ilha, mas vários itens para marcar na lista de desejos.
A loja de Flora Danasi fica bem em frente à saída do teleférico. Os navios de cruzeiro são uma fonte essencial de receita para ela, especialmente nesta temporada.
Em comparação com os últimos anos, o número de visitantes que reservam acomodações em Santorini e permanecem por vários dias caiu consideravelmente. Dados do setor apontam que as reservas caíram quase 30% nesta temporada.
“A diferença entre este ano e os dois últimos anos é enorme”, diz Danasi à DW. “Nos dias em que não há navios de cruzeiro atracando, a ilha parece vazia, e eu não faço nenhum negócio.”
Moradores se sentem marginalizados
A apenas algumas ruas do teleférico, a multidão de turistas fica completamente parada. Anastasia Vazeou, que trabalha em uma loja de roupas, reclama do efeito do turismo na ilha.
Vazeou cresceu em Santorini, onde mora até hoje, mas diz que se sente marginalizada como residente. “Fomos aconselhados a passar o mínimo de tempo possível fora de casa nos horários de pico dos cruzeiros turísticos”, disse à DW.
“É triste e extremo. Os turistas são mais importantes? Há muitas pessoas. É demais para uma ilha tão pequena.”
Vazeou também trabalha como recepcionista. Os hóspedes lhe contam sobre os tempos de espera intermináveis e as horas gastas em filas. “Parece que agora é mais sobre quantidade do que qualidade aqui em Santorini”, diz ela.
Barulho, lixo e poluição
A grande quantidade de pessoas que visitam a ilha também torna a experiência desagradável para os visitantes. Mona Isazad, professora na Irlanda, está de férias com seu marido na ilha grega. Além das paisagens únicas, ela levará para casa lembranças de outros aspectos da viagem.
“Como turista, sinto que a ilha está superlotada”, diz. “Há pessoas por toda parte, especialmente em Oia e Fira.”
Isazad e seu marido notaram que há muito lixo espalhado por toda parte. “O lixo também parece ser um problema devido à grande quantidade de pessoas. Talvez a Grécia devesse pensar em uma maneira de limitar a quantidade diária de pessoas na ilha e em algumas outras medidas para preservar a natureza, comoVeneza está fazendo”, diz ela.
As pessoas que trabalham no setor hoteleiro também reclamam do barulho. “Das 8h da manhã até as 13h, as vielas ficam cheias de grupos de turistas. Você mal consegue se mover. Como sardinhas em uma lata”, diz Stavros Koukouvelis, descrevendo as hordas de turistas que chegam a Oia, no noroeste da ilha.
Koukouvelis trabalha em Oia há 16 anos. O vilarejo é um ponto de encontro de turistas por ser um local ideal para apreciar o pôr do sol. Os apartamentos que ele administra no vilarejo ficam diretamente na rua estreita que leva ao mirante.
“Os turistas dos navios de cruzeiro estão destruindo o turismo de qualidade. Até mesmo dois navios causam problemas para nós”, diz Koukouvelis.
Os viajantes pagam quase 400 euros (o equivalente a R$ 2.456) por noite por esses apartamentos e frequentemente reclamam do barulho causado pela multidão do lado de fora de suas portas.
Novos limites a partir de 2025
Os desafios que vêm com o turismo de cruzeiros em Santorini não são exatamente uma novidade. Esse foi um dos principais problemas para o prefeito Nikos Zorzos durante seu primeiro mandato, de 2011 a 2019.
Um estudo realizado em 2018 pela Universidade do Egeu mostrou que Santorini pode receber até 8.000 turistas de navios de cruzeiro por dia, desde que sua chegada seja escalonada durante todo o dia. Com base nesse estudo, um sistema de alocação de berços para navios de cruzeiro foi introduzido em 2018.
O esquema funcionou bem, diz Zorzos à DW. “Mas o número de visitantes foi excedido consideravelmente várias vezes este ano.”
A superlotação exerce uma enorme pressão sobre a infraestrutura da ilha, o que é exaustivo inclusive para os próprios turistas, especialmente quando faz calor. Com isso em vista, o prefeito diz que o limite diário de 8.000 visitantes será reintroduzido em 2025.
“Este ano, conseguimos pelo menos limitar o número de dias em que vários navios de cruzeiro visitaram Santorini ao mesmo tempo”, afirma Zorzos.
Agora, em seu segundo mandato, o prefeito também está preocupado com a construção na ilha e com o excesso de oferta de acomodações.
“Esse desenvolvimento irracional da ilha precisa parar. Santorini não precisa de um único quarto a mais”, diz. “Isso está destruindo a paisagem única que tornou nossa ilha mundialmente famosa”, completa.
Redes sociais versus Realidade
São 18h em Oia, e as ruas estão lotadas de visitantes a caminho do mirante para assistir ao pôr do sol. A multidão se move a passos de formiga. Em alguns pontos, as ruas são tão estreitas que os turistas que se deslocam na direção oposta precisam esperar por vários minutos.
Quase não se fala uma palavra em grego. Dois músicos gregos estão sentados em um degrau branco tocando música grega com um violão e um bouzouki (pequeno alaúde com braço longo e fino). A maioria dos turistas nem os nota, de tão ocupados que estão com seus smartphones, filmando sua próxima história no Instagram e tentando tirar a foto perfeita dos prédios com cúpulas azuis, do mar e do pôr do sol.
Todos querem boas fotos com o menor número possível de pessoas – de preferência, sem ninguém. Quando o sol se põe, a agitação diminui. Poucos minutos após o pôr do sol, o mirante está completamente deserto. Mesmo assim, os músicos continuam tocando.