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MANTEGA, NA QUARTA-FEIRA: MUDANÇAS SÓ A PARTIR DE 2010

 

DEPOIS DE MUITA POLÊMICA E discussão dentro e fora do governo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, venceu a primeira batalha para alterar as regras da tradicional caderneta de poupança. Ao lado do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ele apresentou na quarta-feira 13 uma proposta para tributar a aplicação financeira mais popular do País, que hoje é isenta de Imposto de Renda. O rendimento de 0,5% ao mês (6,17% ao ano) além da variação da TR será mantido – ao menos por enquanto -, mas os depósitos superiores a R$ 50 mil cairão na boca do Leão da Receita Federal em 2010, caso o Congresso Nacional aprove as mudanças. Até lá, nada irá mudar, garante o ministro. “Todos os poupadores continuarão com os mesmos rendimentos este ano. Não se mexe na poupança em 2009”, afirmou Mantega.

A mordida irá afetar os ganhos de quase 900 mil poupadores que têm saldo acima de R$ 50 mil e guardam na caderneta uma montanha de R$ 110,5 bilhões. Esses investidores, embora representem somente 1% dos poupadores, detêm 41% do saldo total da aplicação, de R$ 270,7 bilhões em dezembro de 2008. Essa tributação só será acionada se os juros básicos da economia continuarem abaixo de 10,5% ao ano. No momento, a taxa Selic, que reflete a remuneração dos títulos públicos, está em 10,25%. A expectativa dos mercados é de que chegue à casa de um dígito ainda neste ano. O boletim Focus, do BC, indica 9,25% em dezembro. Ou seja: o Leão não vai passar fome no que depender da poupança, se os deputados e senadores concordarem com os argumentos do governo. A oposição promete dar trabalho. Na quarta-feira, três partidos afirmaram, por meio de uma nota, que o governo quebrou a confiança do Brasil sobre a caderneta de poupança. “PPS, PSDB e Democratas estarão ao lado da população brasileira, nas ruas e no Congresso Nacional, lutando para que esta medida não seja aprovada e para que o povo não seja penalizado mais uma vez pelos erros deste governo federal.”

Apesar da gritaria, a tendência é de aprovação da medida. E o que fazer diante disso? Se você tem mais de R$ 50 mil na poupança, por enquanto o melhor é não fazer nada neste momento, pois as mudanças só valerão a partir de 2010. Até lá, o melhor é ter paciência e aproveitar o rendimento não tributado. “Não se deve tirar o dinheiro agora. É preciso aguardar a aprovação do Congresso”, reforça Ricardo Humberto Rocha, professor de mercado financeiro do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper, nova denominação do Ibmec – SP). O desafio do poupador, agora, é entender como será a tributação.

Pela proposta, o IR incidirá somente sobre os juros da caderneta, ou seja, 0,5% ao mês (6,17% ao ano), e somente sobre a parcela dos depósitos que ultrapassar R$ 50 mil. A correção do saldo pela TR, que faz parte do rendimento, não será tributada. A alíquota do IR dependerá dos rendimentos tributáveis do poupador. Os exemplos mostrados por Mantega e Meirelles pressupõem uma mordida de 27,5% (ver quadros abaixo). Para complicar ainda mais, o governo criou um redutor que será aplicado sobre a base de cálculo do imposto, conforme o nível da taxa básica de juros. Assim, quanto maior for a queda dos juros, maior é o imposto proporcional pago pelo poupador.

No exemplo de um investidor com saldo de R$ 200 mil, os juros da poupança (fora a TR) equivalem a R$ 1.000 mensais (0,5% ao mês). Como há isenção sobre o saldo até R$ 50 mil, a base de cálculo é reduzida em R$ 250 (0,5% de R$ 50 mil). Sobram R$ 750 brutos. Se a Selic estiver em 8% ao ano, o redutor sobre a base de cálculo é de 40%, ou seja, ela cai para R$ 450. Apliquem-se 27,5% e tem-se o imposto de R$ 124. Com isso, o rendimento líquido dos R$ 200 mil cai para R$ 876 mensais. A mordida final, nesse exemplo, é de 12,38%. A tributação será realizada somente na declaração de ajuste do IR anual. No caso, em 2011, ano-base 2010. Como o ajuste engloba as demais regras tributárias para as pessoas físicas, incluindo isenções e descontos, os poupadores sem outras fontes de renda tributável só pagarão IR, na prática, se tiverem saldos bastante elevados. Pelos cálculos da Fazenda, os saldos máximos da poupança que ficarão isentos de IR nesse caso serão de R$ 424 mil (com a Selic a 7%), R$ 674 mil (8%), R$ 1,299 milhão (9%) e R$ 1,923 milhão (10%).

Além de mexer na poupança, o governo poderá também alterar a tributação dos fundos de investimento. Desta vez, no sentido contrário: o IR poderá ser reduzido. Hoje, as alíquotas decrescem com o tempo da aplicação e vão de 22,5% (até seis meses) a 15% (acima de 24 meses). Caso entenda que a redução dos juros esteja causando uma fuga de recursos dos fundos para a poupança (o que ainda não ocorreu), o governo poderá aplicar uma alíquota única de 15% sobre os ganhos dos fundos. Se isso ocorrer, será uma medida válida somente para 2009.

A estratégia do governo com essa medida temporária é induzir os bancos a reduzir as taxas de administração dos fundos, que diminuem os rendimentos dos investidores. Taxas a partir de 2% ao ano já significam, nos fundos de renda fixa, remuneração líquida inferior à da poupança. “Os bancos ficarão em situação desconfortável e terão que rever suas taxas de administração”, diz Márcio Macedo, sócio da Humaitá Investimentos. Procurados pela DINHEIRO, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú Unibanco e Santander não quiseram comentar as medidas.

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Com reportagem de Ana Clara Costa, Luciana de Oliveira e Márcio Kroehn