Em visita à China, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lançou um discurso já dito em sua terceira gestão sobre a possibilidade de relações comerciais bilaterais sem passar pelo dólar. “Por que não podemos fazer nosso comércio lastreado na nossa moeda? Por que não temos o compromisso de inovar?”, questionou o presidente na cerimônia de posse de Dilma Rousseff no Banco do Brics, em Xangai. 

Para a felicidade do petista, o líder da China Communications Construction Company (CCCC), Wang Tog, revelou que estaria disposto a criar mecanismos de troca direta entre o yuan, a moeda chinesa, e o real brasileiro. 

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“A ideia é criar uma câmara de compensação (real x yuan) e assim evitar maiores custos de transação ( real x dólar x yuan). É comum entre blocos econômicos e entre parceiros comerciais relevantes”, explica Mauro Rochlin, coordenador do MBA de Gestão Estratégica e Econômica da Fundação Getúlio Vargas.

Por definição, a câmara de compensação é um sistema adotado por instituições financeiras para trocas e pagamentos.  

É possível fazer essa troca direta entre comércio exterior e investimento entre Brasil e China a partir de criação de protocolos e é importante definir regras de paridade e conversibilidade. Podemos comparar os países que existem na Zona do Euro, que entre eles utilizam uma moeda local, o euro, embora nele haja uma conversibilidade e uma paridade em relação ao dólar”, avalia Gilberto Braga, economista e professor do IBMEC RJ.

Moeda única?

Outro caminho possível seria a moeda única. Assim como já foi debatido com a Argentina, por exemplo, há a possibilidade da criação de uma nova moeda. No caso do parceiro latino-americano, ao invés de ter peso ou real, os países abandonam as moedas, e a moeda única seria adotada, tendo o mesmo valor para ambos países, seja Brasil, Argentina – ou outro país que vier adotar.

No caso da relação com a China, poderia se criar uma nova moeda para convergência entre o real e o yuan, com a mesma finalidade. Mas ainda é uma especulação, é apenas uma das medidas possíveis para a desdolarização desse comércio.

Vantagens ao Brasil

A ideia de troca sem dólar é viável, segundo especialistas, desde que sejam estabelecidos protocolos sobre troca de mercadorias. Como a China é o principal parceiro comercial internacional do Brasil, existem possibilidades de trocas recíprocas de tal maneira que isso não precisa estar atrelado ao dólar.

A relações comerciais entre Brasil e China são, sobretudo, de produtos primários: produtos de agro exportação, com destaque na venda de soja, minerais e carne bovina. Em 2022, a China importou mais de US$ 89,7 bilhões em produtos, especialmente soja e minérios, e exportou quase US$ 60,7 bilhões para o mercado nacional.

Considerando as relações comerciais entre Brasil e China, não haveria grande dificuldade para implementação do comércio sem dólar do ponto de vista de liquidez. Segundo Braga, esse movimento poderia atrapalhar as relações do Brasil com outros países.

Porém, existe a possibilidade até de ampliação de comércio entre os países do BRICS, na medida em que o banco está na China e tem a ex-presidente Dilma Rousseff como gestora”, finaliza.