Cobrar preço do carbono no Canadá e subsidiar bombas de calor na Alemanha são propostas verdes que, em vez de agradar, acabaram gerando uma onda de críticas. O que é possível aprender com essas experiências?Na campanha para as eleições no Canadá deste ano , “cancele a taxa” virou um bordão frequente. Ele se referia à cobrança de um preço do carbono que, segundo os políticos conservadores, estava “elevando” os preços da gasolina e da calefação durante uma “crise do custo de vida”.

Mas essa taxa não era tecnicamente uma taxa, pois o dinheiro cobrado dos consumidores era depois devolvido por meio de transferências trimestrais, disse à DW uma das principais arquitetas da política, Catherine McKenna, ex-ministra do Clima e Meio Ambiente, do Partido Liberal.

“Conselho gratuito para quem for fazer isso: não chame de taxa de carbono. E se você torná-la neutra em termos tributários, o dinheiro volta [a quem pagou]. Não é uma taxa”, afirmou.

No Canadá, a entrada em vigor do preço do carbono em 2019 foi acompanhada de uma enxurrada de desinformação, e McKenna chegou a receber ataques pessoais e precisou de segurança.

Quando os liberais implementaram a política, McKenna achou que havia feito o trabalho difícil de angariar amplo apoio. Sua equipe consultou parlamentares conservadores que apoiavam soluções climáticas baseadas em mecanismos de mercado, e fez pesquisas sobre como comunicar o preço do carbono aos eleitores.

Mas a política pública virou um fardo eleitoral. Logo após assumir o cargo, em março deste ano, o novo primeiro-ministro Mark Carney, do Partido Liberal, revogou a cobrança do preço do carbono dos consumidores.

McKenna atribui essa mudança a um fracasso dos liberais em conseguir explicar aos eleitores a importância da política pública. Mas este também é um dos exemplos mais recentes de um retrocesso climático, enquanto vários governos tentam equilibrar o discurso sobre quem paga pela transição dos combustíveis fósseis para fontes sustentáveis de uma maneira que isso não lhes custe votos nas urnas.

Cenouras ou chicotes?

O custo da transição para a energia renovável é alto, estimado em cerca de 2 trilhões a 4 trilhões de dólares por ano globalmente.

Mas o preço da inação é muito mais alto. Até 2050, os danos e a perda de renda causados por desastres climáticos podem chegar a 38 trilhões de dólares por ano.

“Consumidores, contribuintes e empresas – ou seus acionistas – são as três fontes de dinheiro que os governos podem usar para cobrir esses custos”, explicou Gernot Wagner, economista climático da Columbia Business School, em Nova York.

“Não podem ser apenas os contribuintes. Também não podem ser apenas os acionistas. E definitivamente não podem ser apenas os consumidores, certo?”, disse. “A política entra em cena quando tentamos criar o equilíbrio certo entre quem paga.”

No caso do Canadá, foram os consumidores e as empresas que pagaram. Mas também poderiam ter sido os contribuintes e as empresas ou todos os três.

Wagner acrescentou que os diferentes mecanismos financeiros para pagar pela descarbonização também precisam ser avaliados. “O que importa é encontrar maneiras de equilibrar as cenouras [recompensas] e os chicotes [punições]”, disse. As punições são desincentivos como o preço de carbono, que atribui um preço a cada tonelada de CO2 emitida – semelhante ao esquema do Canadá.

“Um problema com a taxa de carbono é que, infelizmente, taxa é considerada praticamente um palavrão”, disse Wagner. “Costuma ficar difícil você se eleger [com alguém] gritando ‘taxa de carbono’.”

McKenna disse que seu partido achou difícil se livrar do rótulo da “taxa” porque as pessoas não estavam associando as transferências trimestrais que recebiam ao sistema de preços de carbono, mas “o percebiam quando abasteciam seus carros ou viam suas contas de energia” e notavam o aumento do custo.

Wagner apontou que os sistemas de limite e comércio de carbono têm mais poder para se estabelecer do que o preço do carbono do Canadá, a exemplo do Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia.

Nesses sistemas, estabelece-se um limite para as emissões de CO2, e as empresas compram licenças para poluir. À medida em que o limite diminui e há menos licenças disponíveis, o custo das emissões aumenta e há um incentivo às empresas para que se descarbonizem.

McKenna concorda que um sistema de limite e comércio de carbono poderia ter sido mais fácil de sustentar no Canadá, porque se aplica às empresas e não aos consumidores, embora o custo geralmente seja repassado no final, de qualquer forma.

O primeiro-ministro canadense, Mark Carney, manteve o preço do carbono para grandes emissores, como os setores de petróleo, gás e cimento, que, segundo McKenna, não estão pagando o suficiente pelo aumento das emissões.

“Se não formos criar incentivos para os consumidores por meio do preço do carbono, então precisamos aumentar a pressão sobre os grandes poluidores”, disse McKenna, acrescentando que, antes das eleições, Carney falou sobre usar o dinheiro da precificação do carbono industrial para subsidiar coisas como a mudança para veículos elétricos e bombas de calor.

Subsídios precisam ser bem pensados

Voltando à metáfora da cenoura e do chicote de Gernot Wagner, as cenouras são incentivos, como as subvenções. Mas mesmo o uso de cenouras pode colocar os governos em apuros se a mensagem e o desenho da política pública forem inadequados.

A adoção pela Alemanha de um subsídio para ajudar os proprietários de imóveis a substituir seus aquecedores a óleo e gás por bombas de calor ecológicas é um exemplo.

Os custos projetados da política pública e a proposta de proibir a instalação de novos aquecedores a combustíveis fósseis a partir de 2024 causaram uma grande reação negativa, e partidos da oposição e tabloides fustigaram a lei e seus idealizadores do Partido Verde.

“Em princípio, é uma boa ideia. Mas acho que a estrutura é o ponto crucial”, disse Barbara Metz, diretora executiva da ONG ambientalista Deutsche Umwelthilfe (DUH).

O governo alemão ofereceu subsídios que cobriam até 70% do custo de uma bomba de calor e sua instalação. Mas essa estrutura baseada em porcentagem incentivou as empresas a inflar os custos das bombas de calor para 30 mil euros e alongar a instalação para 18 dias. No Reino Unido, Dinamarca e Polônia, elas custam 15 mil euros e levam dois dias para serem instaladas.

Para alinhar os custos com o de outros países, a DUH defende um subsídio de preço fixo, porque a política só funciona se as bombas de calor “puderem competir com o custo do aquecimento a gás e óleo”.

Um aquecedor típico a óleo ou gás custa cerca de 7 mil euros. Com um subsídio de 8 mil euros, uma bomba de calor de 15 mil euros custaria o mesmo. Aliado à promessa de contas de energia mais baixas, os proprietários ficariam mais propensos a escolher a bomba de calor.

“É matemática”, disse Metz. Um subsídio de preço fixo aceleraria as instalações e reduziria pela metade os gastos dos contribuintes.

Pagar pela poluição dos gases de efeito estufa e pelas adaptações necessárias para lidar com as mudanças climáticas é complexo, disse Catherine McKenna. Algumas políticas públicas funcionarão, outras precisarão de ajustes e provavelmente haverá resistência da indústria ou do público. Mas o custo da inação será muito maior.

“Sabe, tem sido muito difícil ser honesta”, disse McKenna. “Coisas difíceis são difíceis, e nada é mais difícil do que a política climática.”

Charli Shield contribuiu para este artigo.

Para saber mais sobre este tema e sobre os custos das mudanças climáticas, confira nossa série de podcasts Living Planet. Esta matéria faz parte do The 89 Percent Project, uma iniciativa da colaboração jornalística global Covering Climate Now.