O metanol é usado como matéria-prima para combustíveis, como o biodiesel, e também na fabricação de tintas, solventes e plásticos, por exemplo. Por ser altamente tóxico, mesmo em doses pequenas, ele é impróprio para consumo humano, mas estaria sendo usado na falsificação e adulteração de bebidas alcoólicas.

Por não ter cor e seu cheiro ser similar ao do álcool etanol (encontrado nas bebidas), é muito difícil identificá-lo em bebidas destiladas pelo gosto, cheiro ou aparência, segundo especialistas.

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“O metanol não tem um cheiro desagradável, nem tampouco um sabor ruim. Ele se mistura bem à bebida, ou seja, quando há presença desse contaminante, ele passa despercebido por quem está ingerindo. Isso torna a intoxicação pelo metanol um feito bem traiçoeiro”, diz Álvaro Pulchinelli Junior, médico toxicologista e patologista clínico, presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML).

No entanto, ao comprar a bebida é importante ficar atento aos detalhes da embalagem, como rótulo borrado ou mal colocado, e analisar se o valor está compatível com o de mercado, desconfiando de preços muito baixos. Os consumidores também deveriam buscar fazer a compra em supermercados e lojas confiáveis, evitando locais informais.

Em caso de doses consumidas em bares e restaurantes, onde não é possível analisar a garrafa e o rótulo, o indicado é não consumir drinks feitos com bebidas destiladas como vodca, gim e uísque.

Estabelecimentos confiáveis

Mas caso haja o consumo é importante observar se há alteração de cor em bebidas que deveriam ser transparentes, como vodca, gim, saquê e cachaça. Apesar de não ser comum, algumas falsificações mais grosseiras podem mudar o aspecto da bebida.

“Um cheiro diferente, mais forte ou um sabor mais adocicado, podem ser sinais de uma bebida falsificada. Mas hoje o falsificador consegue disfarçar essas características. Então o principal alerta é desconfiar de preços abaixo do mercado e o principal e o mais seguro é sempre comprar de estabelecimentos confiáveis”, acrescenta Guilherme Mendes Zaque, médico emergencista e intensivista, coordenador das UTIs do Hospital Santa Marcelina.

Ao notar alguma diferença na bebida, o consumidor não deve fazer testes caseiros como cheirar, provar ou tentar queimar a bebida. Essas práticas não são seguras e nem conclusivas, segundo o Procon de São Paulo. O órgão emitiu uma nota com essa e outras orientações para os consumidores. Entre elas estão ainda exigir sempre a nota fiscal ou comprovação de origem e buscar atendimento médico imediato em caso de suspeita de contaminação.

Pesquisa aponta que 36% das bebidas são falsificadas

Pesquisa da Federação de Hotéis, Bares e Restaurantes do Estado de São Paulo divulgada em abril deste ano apontou que 36% das bebidas alcoólicas comercializadas no Brasil em 2024, eram falsificadas, adulteradas ou contrabandeadas. Uma das substâncias usadas na falsificação é o metanol.

Segundo o governo de São Paulo ainda não está clara a origem do metanol que vem causando intoxicação no estado. Três bares e adegas nas regiões dos Jardins e Mooca, na capital paulista, listados entre os suspeitos de comercializar bebidas que causaram a intoxicação, foram fiscalizados nesta segunda-feira (29/09) pelas secretarias estaduais da Saúde (SES) e da Segurança Pública (SSP).

Nos locais foram apreendidas 117 garrafas de bebidas sem rótulos e sem comprovação de procedência. O material será encaminhado à perícia no Instituto de Criminalística (IC) da Polícia Técnico-Científica. Dois dos estabelecimentos fiscalizados foram autuados por irregularidades sanitárias.

Quais os sintomas de intoxicação por metanol?

Os sintomas da intoxicação por metanol podem ser confundidos com uma ressaca comum, com náuseas, vômito e dor de cabeça intensa. No entanto, quando há confusão mental ou alterações na visão é necessário buscar atendimento médico urgente. As primeiras 48 horas são consideradas cruciais para evitar complicações irreversíveis, como a perda de visão ou até a morte.

“O metanol, ao ser ingerido, é transformado no organismo em ácido fórmico, e esse ácido ataca o nervo óptico, que transmite impulso visual. Então os intoxicados podem apresentar alterações visuais, como vista borrada, ver um brilho intenso nos objetos ou, ainda, perda de visão. E essa perda de visão pode ser irreversível dependendo da evolução do quadro”, explica Pulchinelli Junior.

O diagnóstico de intoxicação por metanol é feito em ambiente hospitalar por exame de imagem e de sangue. O tratamento deve ser imediato com o uso de medicamentos para corrigir a acidez no sangue ou até mesmo com hemodiálise para retirar o metanol do organismo.

“Mesmo com tratamento, muitos pacientes ficam com sequelas visuais permanentes”, explica Hanna Flávia Gomes Soares e Silva, oftalmologista.

Casos ao redor do mundo

Mortes causadas pelo consumo de bebidas alteradas por metanol ocorrem em diversas partes do mundo. Em meados de setembro, ao menos 25 pessoas morreram após consumirem vodcas adulteradas na região de São Petersburgo, na Rússia. Oito dessas mortes já receberam a confirmação de intoxicação por metanol.

Informações preliminares indicam que os envenenamentos ocorreram através de bebidas produzidas por vendedores não autorizados. Ao todo, 14 pessoas já foram presas.

Em novembro de 2024, seis pessoas morreram no Laos após ingerir bebida falsificada com metanol. As vítimas eram duas australianas, dois dinamarqueses, um americano e uma britânica. Na ocasião, os turistas teriam recebido doses gratuitas de uísque e vodca em um hostel onde cinco das vítimas estavam hospedadas.