Crise econômica nos Estados Unidos e na Europa, capitalização da Petrobras em 2010, perspectiva de juros mais altos em 2011. Pode escolher o seu motivo para explicar a queda das ações. Nessas horas, o ideal é sair da bolsa, certo? Errado. Há outras estratégias para lidar com um mercado em baixa. Elas podem proteger o valor de uma carteira de ações no longo prazo, melhorar a rentabilidade dos papéis e gerar lucros até quando o mercado cai. 

 

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Bender (à esq.) e Leite: bons lucros apostando na queda das ações

 

Não são as maneiras mais óbvias de operar: exigem conhecimento, perspicácia e coragem para assumir riscos, mas um número crescente de investidores está aproveitando o desempenho fraco da bolsa para tentar ganhar dinheiro assim.

 

A estratégia de ganhar na baixa que mais vem crescendo é o aluguel de ações (veja gráfico ao lado). Funciona exatamente como o aluguel de um imóvel: quem tem ações cede sua posse (mas não a propriedade) a outro investidor, em troca de dinheiro. 

 

O proprietário das ações, chamado “doador”, obtém uma rentabilidade entre 2% e 6% ao ano, que não é isenta de imposto. Pode não ser uma grande taxa, mas ajuda. “Essa estratégia serve, por exemplo, para diminuir o custo de carregamento das ações”, diz Manuel Lois, diretor da corretora Spinelli. 

 

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“A renda com o aluguel é parecida com a dos dividendos”

Allan Panossian: investidor aluga oito das 15 ações em que aplica

 

Esse custo é o equivalente aos juros que o investidor deixa de ganhar na renda fixa ao preferir a bolsa. Um dos maiores e mais conhecidos usuários dessa estratégia é o investidor Lírio Parisotto. 

 

Dono da Videolar, o empresário concentrou suas vultosas aplicações no fundo exclusivo Geração L.Par, cujo patrimônio no fim de 2010 era de R$ 2,58 bilhões. “Colocamos 25% das ações do fundo para alugar”, disse ele à DINHEIRO. No ano passado, essa estratégia rendeu R$ 20 milhões, uma rentabilidade média de 3%.

 

Ele não agiu sozinho. Segundo a Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC), empresa da BM&FBovespa que processa essas transações no chamado Banco de Títulos, o movimento de 2010 foi de R$ 465,6 bilhões, um crescimento de 80% em relação a 2009. 

“Quem não quer correr riscos atua como doador”, diz Paulo Antônio Rodrigues, da Um Investimentos. É o caso de Allan Panossian, 26 anos, sócio de uma empresa de estratégia em mídias sociais. 

 

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Ele investe em cerca de 15 ações diferentes e coloca oito delas para alugar. Entre elas, Hypermarcas, Saraiva, Equatorial, Confab e Gerdau. “Deixo minhas ações alugadas por períodos entre 30 e 90 dias, dependendo de por quanto tempo quero manter os papéis”, diz. 

 

Panossian investe em bolsa desde 2006 e começou a alugar seus papéis em 2008. “O rendimento é parecido com o dos dividendos”, avalia. O único risco que o doador corre é perder a chance de vender seus papéis se as cotações subirem, diz Alexandra Almawi, economista da Lerosa Investimentos.

 

Quem admite correr mais riscos pode participar dessa estratégia na outra ponta, alugando ações de outros investidores. Os “inquilinos” das ações são denominados tomadores. 

 

Eles alugam papéis para vendê-los no mercado, esperando comprar mais tarde por um preço menor. Se as cotações caírem, o tomador compra os papéis mais barato, devolve-os para o doador e embolsa a diferença. 

 

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É assim que o empresário Rodrigo Leite, 46 anos, atua. Investidor assumidamente agressivo, ele é bastante ativo. “Alugo ações, vendo quando acho que elas não têm mais espaço para subir e então recompro na baixa”, diz ele. 

 

Falar é mais fácil do que fazer, pois essa estratégia requer muita atenção ao mercado e decisões rápidas. Leite conta com a ajuda de seu sobrinho Lucas Bender, 26 anos, que o ajuda a acompanhar o mercado. 

 

Ambos não têm do que reclamar: essa estratégia fez os investimentos da dupla renderem cerca de 50% em 2010, quando o mercado subiu 1,04%. O tomador corre mais riscos que o doador: se ele vender as ações e os preços subirem, vai ter de recomprá-las mais caro, pagando a diferença. 

 

Se você quiser fazer o mesmo, atuando como doador ou como tomador, basta avisar sua corretora, que vai intermediar o negócio. Vale notar que os proventos como dividendos e juros sobre capital próprio ficam com o inquilino enquanto durar a locação.

 

Lidar com inquilinos assusta você? Há mais alternativas para ganhar com a baixa das ações. Uma delas é a chamada operação long & short. Nela, o investidor escolhe duas ações por vez. 

 

Ele aposta na alta de uma delas e na queda da outra, assumindo uma posição “comprada” (ou long) e outra “vendida” (ou short) ao mesmo tempo. A ideia aqui é que há ações cujos preços oscilam pelos mesmos motivos. 

 

As cotações podem subir e descer ao mesmo tempo, mas com amplitudes diferentes, no caso de papéis do mesmo setor. Elas também podem se mover em sentidos opostos, mas pelo mesmo motivo. Comprando uma delas e vendendo a outra, o investidor garante uma rentabilidade fixa, independentemente da direção da bolsa. 

 

Maurício Ceará, estrategista de pessoa física da corretora Santander, explica que essas operações podem ser feitas em qualquer momento do mercado, pois a combinação de apostas garante o ganho, mesmo que a bolsa caia. 

 

“Essa é uma estratégia defensiva muito boa e que também vem crescendo. Também é possível fazer isso por meio de fundos long & short. Em 2010, essas carteiras renderam em média 12,4%, bem acima do Índice Bovespa e superando ligeiramente os juros de mercado, segundo a Economática.

 

Aluguel de ações e long & short podem ser adotados por todos os investidores. Há mais três alternativas que podem render bem mais, mas que expõe os baixistas a riscos muito grandes. 

 

Uma delas é uma simplificação do aluguel de ações como tomador e trata-se da venda a descoberto dos papéis. Fazer isso é simples: quem acredita que uma ação vai cair, faz a venda sem ter o papel e espera recomprar mais barato. 

 

Essas apostas em geral são feitas em prazos curtíssimos, de um dia. “Isso só é recomendado para quem é muito agressivo”, diz Ceará, do Santander. “Os riscos de o investidor não conseguir comprar os papéis mais baratos é muito grande.” Não é possível calcular a rentabilidade dessas operações.

 

Outra alternativa é usar opções de ações – o investidor tem o direito de comprar e vender uma ação a um determinado preço no futuro. Elas são negociadas por uma fração do preço da ação. 

 

O investidor pode comprar uma opção de venda que lhe dá o direito de vender a ação a uma determinada cotação. Se a bolsa cair, o valor de venda estará garantido. O risco, aqui, é que a bolsa suba e o investidor não exerça esse direito. “Nesse caso, a perda é o prêmio pago pela opção”, diz Lois, da Spinelli. 

 

Em média, nos momentos de mais volatilidade da bolsa, o rendimento dessas operações pode chegar ao dobro dos juros de mercado, mas esse percentual varia muito. Também é possível praticar vendas a descoberto com as opções, da mesma forma que com as ações, mas o risco é muito maior neste caso. Portanto, mesmo que a intenção seja ganhar na baixa, essa é uma opção para poucos.

 

Colaborou Jaqueline Mendes