19/11/2022 - 13:00
O Dia da Consciência Negra, celebrado no dia 20 de novembro, entrou no calendário escolar a partir da sanção da Lei 10.639, de 2003. A legislação também obriga o ensino de história e cultura afro-brasileira na educação do País.
A ex-presidente Dilma Rousseff oficializou a data como comemorativa em 2011. Para conquistar isso, jovens universitários batalharam, na década de 1970, por um dia que representasse a luta da população negra brasileira.
Zezé Motta, a cantora Iza, a atriz Juliana Alves, Maíra Azevedo, as ex-BBBs Gleici Damasceno e Jessi Alves e outros artistas contam ao Estadão como a implementação da data alterou e impactou suas vidas.
Veja os depoimentos em primeira pessoa:
Zezé Motta – atriz e cantora, 78 anos
“Sou do tempo que em novela tinha apenas dois ou três atores negros, que faziam sempre papéis subalternos. O problema não era fazer empregados, mas é que esses personagens vivem a reboque. Essa era a questão, não tinham uma história própria, estavam a serviço de outros personagens. Então, se a gente fizer uma comparação, vamos ver que houve avanços, mas ainda somos poucos em muitos departamentos. É um grande avanço.
Fico muito feliz que nossa luta venha se fortalecendo a cada ano que passa, sabemos que falta muito ainda. Para mim, o dia 20 de novembro, é um dia muito importante para o nosso país e sociedade, um dia de reflexão contra o racismo, mas, que essa reflexão reflita todos os dias na nossa sociedade.
O recado que deixo é que devemos lembrar sempre que somos bonitos, capazes e não somos inferiores. É nosso dever passar esses pilares e informações para as nossas crianças e reforçar que a cultura negra entre no currículo escolar porque só assim poderemos trabalhar a autoestima dos jovens e só dessa forma eles podem se orgulhar de serem negros.”
Ju Colombo – atriz, 57 anos
“Na minha forma de ver, todas as ações que passaram a acontecer, fruto da profunda indignação da população preta, têm alterado drasticamente as estruturas sociais que estabeleceram de forma tão cruel a segregação racial no Brasil.
Hoje somos muitos, ocupando espaços antes inacessíveis. Cada vez mais instruídos, conscientes e pró-ativos. Sendo assim, cada vez mais, essa data deixa de ser uma comemoração banalizada, para ser um momento de conscientização sobre a nossa cultura e nossas histórias, sobre as conquistas e, principalmente, sobre o que ainda precisa ser feito!”.
Raphael Logam – ator, 36 anos
“Qualquer criança negra no Brasil, durante muito tempo ao frequentar as escolas, só teve como informação histórica a escravidão. Negros como escravizados, pacíficos e subservientes foi a narrativa que as escolas nos davam.
Para além disso, o currículo de História nunca tratou das realizações dos nossos ancestrais. História geral, ao invés de tratar sobre o mundo, limitou a narrativa da histórica ocidental/europeia. Ou nas escolas ensinam sobre Índia, Kemet, Império Mali, ou China? Chamamos a Europa de ‘mundo’ e os Africanos de ‘escravos’, sem qualquer contribuição positiva para a história global.
A nossa consciência foi deturpada por uma nação colonial de História. Portanto, a data da Consciência Negra se propõe ao resgate de uma narrativa positiva sobre a história negra no mundo. Isso é fundamental para restabelecer a verdade e para a afirmação das pessoas negras como atores importantes da História do mundo.
Esse dia é um marco e renova o compromisso de todos na luta por diversidade e inclusão. Os negros africanos foram os inventores da civilização, da matemática, da escrita, da música, da química e é preciso fazer essa justiça em relação ao ontem, ao hoje e ao futuro. O Dia da Consciência Negra é sobre democracia real, justiça, educação e cidadania.”
Maíra Azevedo – atriz, 41 anos
“O 20 de novembro, o Dia Nacional da Consciência Negra, despertou em mim mais interesse sobre a história de luta do meu povo. Quis conhecer os heróis e heroínas que os livros de história me esconderam. O 20 de novembro me conectou, ainda mais, a minha ancestralidade!
Nossa luta é por mais respeito, mais oportunidades, mais dignidade. Lutamos para não sentir medo, para nos sentir lindos, para nos sentir livres. Essa data representa toda essa luta, toda essa resistência do povo preto dentro de uma sociedade racista, que nos diminui e nos marginaliza. Merecemos ter nossa voz forte e influente, nós somos sim poderosos, talentosos, merecemos ter mais representatividade nos lugares importantes dessa sociedade. Nós merecemos ser vistos como nós somos!”.
Aline Borges – atriz, 47 anos
“O Dia da Consciência Negra, é uma data que traz luz à luta pelos direitos do povo preto. Me trouxe de fato mais consciência sobre minha própria história, sobre todo o apagamento das histórias dos que vieram antes de mim.
Embora a gente saiba da necessidade e urgência em colocar a pauta racial como prioridade todos os dias, ter uma data específica que celebre o dia da consciência negra, traz ainda mais visibilidade à uma luta tão necessária!”.
“O Dia da Consciência Negra é uma data que me faz lembrar do porquê de estarmos lutando e resistindo! Em pleno 2022, nós ainda lidamos com o racismo todos os dias. Cansei de ver o povo preto sendo atacado e ferido! Essa data é para lembrarmos da nossa força, da nossa coragem e continuar resistindo, pois nossa batalha é diária! Nossa voz tem poder e é por isso que precisamos continuar lutando!
Eu acredito que é o momento de reflexão entre o povo preto sobre os nossos valores e nossa força, pessoas negras potentes em destaque afetam a minha vida diretamente, pois sou uma pessoa negra também. A data muda minha vida diretamente em muitos aspectos, um deles é porque as marcas procuram muito as pessoas negras para trabalhar apenas nesse período, não sou a única, e isso deveria diferir, pois sou negra e interessante o ano todo.”
Jessi Alves – influenciadora e professora de biologia, 26 anos
“Eu acredito que o Dia da Consciência Negra é importante para fazer com que a sociedade olhe para si mesma e se questione: ‘Queremos mesmo um futuro cheio de preconceitos, como é o nosso passado e presente, ou seguir avançando em busca de um caminho melhor para a nossa sociedade?’.
A data afetou diretamente a minha vida quando eu passei a entender o motivo de precisarmos ter esse dia. Foi a partir daí que busquei saber mais sobre quem eu sou enquanto mulher preta, o letramento racial e compartilhar isso com meus alunos crianças e adolescentes, pois não tive esse tipo de conversa – que acho que teria me salvo de diversas situações que aceitei [passar] por achar que era ‘normal’”.
Juliana Alves – atriz, 40 anos
“O Dia da Consciência Negra no calendário oficial representa, justamente, a nossa persistência, a nossa tomada de poder – no sentido do combate ao racismo. Muito mais importante do que o que ele gerou estando no calendário oficial, é o movimento do entorno, que possibilitou que esse dia fosse implementado.
O movimento que possibilitou a implementação desse dia mudou a minha vida no sentido de ter um respaldo, de ter um movimento e um grupo ao qual eu possa me associar em uma luta coletiva da vida da população negra. [Precisa haver] Um reconhecimento da necessidade de se combater o racismo através de uma conscientização de todos.
De lá para cá, as nossas vidas vem sendo transformadas através de uma constante luta e conscientização de cada vez mais pessoas de que o racismo não é mais admitido. Isso porque há uma valorização muito grande da cultura, das nossas histórias e por entendermos que a população negra precisa ser mais bem representada. Não vamos mais tolerar uma estrutura inteira de poder que deixa as pessoas negras à margem.”
Iza – cantora, 32 anos
“Para mim e para a minha família, eu acho que, diretamente, ligado à instauração da data, não impactou nada – no sentido da nossa evolução emocional, social e financeira. Mas, de fato, é uma data que é muito importante. Nós somos negros todos os dias do ano e, por isso, essas questões batem na nossa porta todos os dias.
É muito importante que a gente tenha um dia no ano para falarmos sobre isso nacionalmente, que seja reconhecido e que a gente tenha pessoas que possam falar sobre isso. Talvez, por eu ter 32 anos, a instauração da data não tenha feito tanta diferença na minha existência. Porém, tenho certeza que isso vai fazer diferença para as próximas gerações. (…) Na minha opinião, eu acho que a gente precisa de espaço para falar.”