06/08/2025 - 7:27
Oitenta anos após bombardeios atômicos, com número de sobreviventes diminuindo, sociedade japonesa se esforça para manter memória dos ataques viva e advertir para as consequências das armas nucleares.O Japão rememora nesta quarta-feira (06/08) os 80 anos do lançamento da bomba atômica sobre a cidade japonesa de Hiroshima. O primeiro ataque nuclear da história, nos últimos dias da Segunda Guerra Mundial, matou cerca de 80 mil pessoas na explosão inicial.
Eram esperadas dezenas de milhares de pessoas do mundo todo para as cerimônias de homenagem às vítimas em Hiroshima e, três dias depois, em Nagasaki, também alvo nuclear naquela semana de 1945.
No entanto, oito décadas depois dos ataques, as cerimônias vão contar com menos sobreviventes — conhecidos como hibakusha — do que em eventos passados.
À medida que os relatos em primeira pessoa sobre os ataques estão se perdendo, museus, organizações e indivíduos vêm se mobilizando para manter suas histórias vivas.
Nesta quarta-feira, horas antes da cerimônia oficial, enquanto o sol nascia sobre Hiroshima, alguns sobreviventes e suas famílias começaram a prestar homenagem às vítimas no Parque Memorial da Paz, próximo ao hipocentro da explosão nuclear.
Às 08h15 — hora em que um bombardeiro americano U.S. B-29 lançou a bomba atômica sobre Hiroshima — tocou o tradicional Sino da Paz e houve um minuto de silêncio.
O primeiro-ministro japonês, Shigeru Ishiba, o prefeito de Hiroshima, Kazumi Matsui, e outras autoridades depositaram flores no monumento que homenageia os mortos.
O total de mortos na cidade subiria a 140 mil até o fim de 1945, em consequência de severas queimaduras ou doenças relacionadas à radiação. Até hoje, o número de vítimas permanece controverso, uma vez que a população sofreu com sequelas de longo prazo.
Contra armas nucleares
Vocal defensor da abolição das armas nucleares, o prefeito fez um alerta sobre a atual corrida armamentista global, citando as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio.
“Esses acontecimentos desconsideram flagrantemente as lições que a comunidade internacional deveria ter aprendido com as tragédias da história”, disse ele. “Eles ameaçam derrubar as estruturas de construção da paz que tantos trabalharam arduamente para construir.”
Ele instou ainda as gerações mais jovens a reconhecerem que tais “políticas equivocadas” podem causar consequências “completamente desumanas” para o seu futuro. Dezenas de pombas brancas, símbolo da paz, foram soltas após o seu discurso.
Kazuo Miyoshi, um aposentado de 74 anos, foi ao local homenagear seu avô e dois primos que morreram no bombardeio. Ele rezou para que o “erro nunca se repita”. “Não precisamos de armas nucleares”, disse.
Do lado de fora do parque, sob forte esquema de segurança, mais de 200 manifestantes se reuniram, segurando cartazes e bandeiras com mensagens contra o desenvolvimento de armas nucleares e a guerra em Gaza.
Pressão sobre governo japonês
Ishiba, por sua vez, reiterou em seu discurso o compromisso do governo de trabalhar por um mundo sem armas nucleares, mas não mencionou o Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares. Sobreviventes, ativistas e parte das autoridades pressionam o governo a assiná-lo e ratificá-lo.
Em uma entrevista coletiva, o primeiro-ministro expressou confiança na disuassão nuclear dos EUA. Ele afirmou que o Japão segue um princípio não nuclear e está cercado por vizinhos que possuem armas nucleares. A postura, disse ele, não contradiz a busca do Japão por um mundo livre destes armamentos.
Mais cedo neste ano, parte dos sobreviventes expressou decepção com o que consideraram uma resposta branda do governo japônes, neste ano, a uma observação do presidente dos EUA, Donald Trump, sobre o ataque contra o Irã em junho. O republicano comparou o bombardeio americano aos ataques contra Hiroshima e Nagasaki.
Ex-primeiros-ministros enfatizaram o status do Japão como o único país do mundo a ter sofrido ataques nucleares e expressaram determinação em buscar a paz. Mas, para parte dos sobreviventes, estas são promessas vazias.
O governo japonês pagou indenizações apenas aos veteranos de guerra e suas famílias, embora os sobreviventes tenham buscado reparação para vítimas civis.
Menos sobreviventes
No entanto, este ano já conta com menos sobreviventes — conhecidos como hibakusha — do que 2023.
Um relatório do governo divulgado em março confirmou que agora existem apenas 99.130 hibakusha vivos — 7.695 a menos que no ano passado. A idade média dos sobreviventes hoje é de 86 anos.
Em contrapartida, museus, organizações e indivíduos se mobilizam para manter suas histórias vivas.
Em Hiroshima, um deles é Shun Sasaki, que ajuda a transmitir o horror do ataque à sua cidade natal e suas consequências. Desde agosto de 2021, o menino de 12 anos conversa com turistas estrangeiros no Parque Memorial da Paz de Hiroshima.
“Eu estava guiando um americano e ele disse que agora acha que devemos proibir todas as armas nucleares. Isso me deixou feliz, porque, se ele for embora e contar a verdade sobre Hiroshima para alguém, e depois essa pessoa contar para outra pessoa, a mensagem de paz se espalhará”, disse.
Sasaki foi escolhido para falar na cerimônia desta quarta-feira, como representante das crianças comprometidas com a paz no Japão.
Esforços semelhantes transmitem as experiências dos hibakusha em Nagasaki, que foi alvo de uma bomba de plutônio ainda mais poderosa em 9 de agosto de 1945. A contagem de mortos chegou a 80 mil pessoas, em decorrência da detonação original e de efeitos de longo prazo.
O Museu da Bomba Atômica de Nagasaki lançou uma nova campanha internacional sobre o tema. “Hiroshima ficará para sempre gravada na história como o primeiro local de bombardeio atômico”, disse Takuji Inoue, diretor do museu. “No entanto, se Nagasaki permanecerá como o último depende do futuro que criarmos.”
“Estamos nos aproximando de uma era em que os hibakusha não estarão mais entre nós”, disse Inoue. ‘No entanto, como cidade bombardeada por uma bomba atômica, estamos profundamente preocupados com o risco crescente do uso de armas nucleares, alimentado pela turbulência das guerras na Ucrânia e no Oriente Médio e outros eventos preocupantes.”
ht (AP, DW)