12/02/2025 - 5:30
Foi sob a promessa de “tornar os Estados Unidos ricos novamente” que o presidente Donald Trump justificou a decisão de cobrar tarifas de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio.
Trump assinou na Casa Branca nesta semana as ordens executivas que entrarão em vigor em março e serão aplicadas sem exceção ao aço e alumínio que chegarem ao país vindos de qualquer parte do globo. As medidas são as mais recentes de uma longa série de ameaças tarifárias feitas pelo presidente americano desde que ele retornou ao cargo no mês passado.
+ PlatôBR: O que está por trás da decisão de Trump de taxar aço e alumínio
Muitos economistas, no entanto, discordam que as tarifas de Trump devem marcar o início de uma nova “era de ouro” para os EUA e rejeitam sua afirmação, ao assinar os decretos, de que os exportadores estrangeiros – e não o cidadão comum americano – arcariam com o peso das tarifas.
“Tarifas significam grandes perdas para todas as partes envolvidas”, afirma à DW Abigail Hall Blanco, professora associada de economia na Universidade de Tampa, na Flórida. “A literatura sobre isso é abundantemente clara”, explica, referindo-se ao volume de pesquisas e dados científicos produzidos sobre o tema, e que amparam essa conclusão.
Embora as novas sobretaxas tenham como objetivo fortalecer os produtores americanos de aço e alumínio, especialistas acreditam que as indústrias dos EUA que dependem fortemente de metais, como automotiva e construção, enfrentarão maiores custos de produção.
Esses custos quase certamente serão repassados aos consumidores dos EUA, reacendendo a inflação em um momento em que os formuladores de políticas públicas estão determinados a empurrá-la para baixo.
Importações mais baratas do que o produto nacional
Meredith Crowley, professora de economia na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, avalia que os americanos de baixa renda, que em grande parte votaram em Trump, serão os maiores prejudicados pelas tarifas.
“Se você é alguém que está apenas lutando para pagar pelo carro não muito bom que você tem agora, isso se tornará um fardo muito mais pesado. Se o preço de um automóvel subir 1.000 dólares (R$ 5,7 mil), sua família simplesmente não conseguirá comprar um”, diz Crowley.
Os setores de aço e alumínio dos EUA enfrentam vários desafios estruturais que os deixaram com dificuldades para competir com rivais estrangeiros, incluindo altos custos de produção, infraestruturas defasadas e capacidades limitadas.
Embora os EUA não sejam muito dependentes de bens chineses, o domínio do país asiático em ambas as indústrias gerou excesso de oferta. A segunda maior economia do mundo produz mais de 50% do aço mundial e 60% do alumínio, a preços com frequência subsidiados pelo Estado.
“Nós [fabricantes americanos] frequentemente importamos aço de lugares como a China para a costa oeste dos Estados Unidos. Por quê? Porque é mais barato do que comprar aço da costa leste [dos EUA] e transportá-lo para a costa oeste”, explica Hall-Blanco.
O efeito das tarifas no 1º mandato de Trump
Em seu primeiro mandato, as tarifas de Trump sobre aço, alumínio e a China ajudaram a impulsionar a produção doméstica desses metais. No entanto, um estudo do Federal Reserve (o Banco Central dos EUA) estimou que os empregos no setor de manufatura caíram 1,4%.
O mesmo estudo descobriu que as perdas de empregos foram sentidas mais fortemente entre os produtores que estavam mais expostos aos aumentos de tarifas, pois enfrentavam custos crescentes de insumos e taxas retaliatórias.
A Oxford Economics estimou em 2021 que a guerra comercial durante o primeiro mandato de Trump tolheu 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA e corroeu a renda real em 675 dólares por domicílio.
Tarifas semelhantes sobre o aço impostas pelos EUA em 2001 também causaram uma menor demanda entre os fabricantes nacionais e estrangeiros, o que levou a dezenas de milhares de demissões.
“Os produtores nacionais dos EUA tiveram que reduzir o emprego porque não conseguiam produzir carros [suficientes devido à falta de aço importado]. Essa foi uma das coisas que incentivou o presidente George W. Bush a começar a eliminar as tarifas sobre o aço”, diz Crowley.
Impacto maior no Canadá
O primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, cujo país será o mais impactado pelas novas tarifas sobre os metais, classificou as sobretaxas como “totalmente injustificadas” e disse que Ottawa “resistiria forte e firmemente”.
No ano passado, o Canadá foi o maior exportador de aço para os EUA, com cerca de 6,6 milhões de toneladas, seguido pelo Brasil (3,9 milhões de toneladas), México (3,5 milhões de toneladas), Coreia do Sul (2,9 milhões de toneladas) e Vietnã (1,4 milhões de toneladas), de acordo com o Instituto Americano do Aço e do Ferro.
O Canadá também é o maior exportador de alumínio para os EUA. Com 3,1 milhões de toneladas no ano passado, as importações canadenses foram o dobro das vendas dos nove países exportadores seguintes combinados, segundo dados do governo americano.
Outras grandes fontes de alumínio dos EUA são os Emirados Árabes Unidos, China, Coreia do Sul e Bahrein – sendo que todos forneceram abaixo de 350 mil toneladas métricas.
De acordo com a consultoria Roland Berger, em torno de 25% das exportações europeias de aço vão para os EUA, vindas da Alemanha, Holanda, Romênia, Itália e Espanha, o que levou a União Europeia (UE) nesta terça-feira a prometer agir para proteger seus interesses econômicos diante do ataque tarifário de Trump.
UE promete resposta “firme e proporcional”
Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia – o braço executivo do bloco – alertou que “tarifas injustificadas sobre a UE não ficarão sem resposta; elas desencadearão contramedidas firmes e proporcionais”.
A alemã disse “lamentar profundamente” a decisão do presidente dos EUA, mas assegurou que o bloco de 27 nações agirá para “salvaguardar seus interesses econômicos” e proteger “nossos trabalhadores, empresas e consumidores”.
Contudo, ainda não se sabe exatamente qual será a resposta da UE. O bloco poderia responder com tarifas recíprocas, entre outras medidas. Alguns especialistas acreditam que seria possível reativar tarifas já existentes. Em casos extremos, Bruxelas poderia impor ainda restrições comerciais de serviços ou dificultar o acesso a investimentos diretos e licitações públicas.
Ex-presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker obteve sucesso nas negociações com Trump em 2018, conseguindo evitar tarifas ameaçadoras como, por exemplo, sobre importações de automóveis. Em troca, ele prometeu que a UE compraria gás natural liquefeito e soja dos EUA.
Na UE, a aquisição de tecnologia militar americana e gás é considerada uma moeda de troca. Von der Leyen também já havia mencionado o aumento da compra de gás liquefeito americano em novembro.
Crowley, da Universidade de Cambridge, avalia que Trump pode obter uma “vitória política” se conseguir forçar a UE, que cobra taxas mais altas sobre carros importados do que os EUA, a cortar sua tarifa sobre os veículos.
“Ele está pensando em acordos setoriais entre as indústrias […], fazendo parecer que ele conseguiu abrir um mercado ao fazer a União Europeia cortar tarifas”, explica a economista.
Exportadores torcem por isenções
Além de preparar medidas retaliatórias, vários países – incluindo a Austrália – pediram a Washington que isentasse suas exportações de metais. Trump prometeu considerar o assunto diante do déficit comercial do país com os EUA.
O jornal britânico The Times citou algumas autoridades que disseram que o governo do Reino Unido também esperava negociar uma exceção às tarifas. Não se espera que o país retalie a ação de Trump, embora medidas tenham sido elaboradas.
O primeiro-ministro indiano Narendra Modi, que deve se reunir com Trump na Casa Branca esta semana, já cortou tarifas sobre dezenas de produtos importados e estaria preparando cortes adicionais em uma tentativa de apaziguar Washington.
A Índia impõe tarifas que são normalmente entre 5% e 20% maiores que as dos EUA em 87% dos produtos importados, de acordo com dados do Global Trade Alert.
A Ucrânia, enquanto isso, espera também poder contornar as tarifas, possivelmente como parte de um acordo para fornecimento de terras raras, necessárias para a produção de tecnologia de ponta. Metais ucranianos representaram quase 58% das exportações para os EUA no ano passado, no valor de 500 milhões de dólares.
“Em 2018, houve acordos feitos com Argentina, Brasil e Austrália. Assim sendo, ainda há espaço para negociação”, afirma Inga Feschner, economista sênior para Alemanha e comércio global no banco holandês ING. “Certamente haverá isenções para alguns países.”
Brasil fala em “reciprocidade”
O governo brasileiro evita falar em “retaliação” às medidas de Trump, no intuito de evitar uma guerra comercial com Washington.
“Se ele, ou qualquer país, aumentar a taxação com o Brasil, nós iremos utilizar a reciprocidade. Nós iremos taxar eles também. Ou seja, isto é simples e é muito democrático. Não há por que ficar tentando colocar uma questão ideológica nisso”, afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na semana passada.