O empresário Eike Batista, fundador e presidente da EBX, holding nacional do setor de infraestrutura e exploração de petróleo e mineração, não economiza energia para manter sua vida digital atualizada. No comando de um grupo que tem cinco empresas listadas na bolsa, com valor de mercado de R$ 62,2 bilhões, ele tem perfil  na Wikipédia e possui um site pessoal repleto de artigos, vídeos e notícias sobre suas empresas. O canal digital que Batista elegeu para ser seu principal meio de comunicação pessoal, no entanto, é o Twitter. Seu perfil no microblog é um sucesso: são mais de 378 mil seguidores, que repercutem suas mensagens e conversam com ele. “Estou ótimo. E você?”, escreveu Eike para um internauta. Além de utilizar esse site para falar de negócios e compartilhar links de reportagens sobre as companhias do grupo, o oitavo homem mais rico do mundo, dono de uma fortuna pessoal de US$ 30 bilhões, também troca ideias sobre futebol: “Estou muito feliz de ver o Brasil fazendo quatro gols! Vem mais?”. Essa mensagem foi publicada durante a partida entre Brasil e Equador, pela Copa América, na quarta feira da semana passada. “O Twitter é minha caneta eletrônica”, disse Batista à Dinheiro.

 

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Eike Batista, presidente do grupo EBX: o empresário está nas redes porque considera fundamental ter um caminho direto com as pessoas 

 

Trata-se de uma “caneta” que não para de escrever. Em pouco mais de um ano em que mantém a página no microblog, já postou 13 mil tuítes, dos quais 75% foram redigidos por ele mesmo. Os demais 25% foram feitos por sua equipe de assessores. “Costumam me perguntar por que estou no Twitter. Explico que é fundamental ter um caminho direto com as pessoas”, diz Batista. Além disso, os textos de até 140 caracteres do microblog são uma ótima maneira de mostrar o que pensa e produz. “Hoje, as pessoas me conhecem melhor, assim como a nossos empreendimentos e iniciativas.”  

 

Eike Batista tem uma companhia ilustre no rol dos empresários brasileiros influentes nas redes sociais. O presidente do conselho de administração do Grupo Pão de Açúcar, Abilio Diniz, 74 anos, também é um fenômeno do Twitter, com mais de 108 mil seguidores. Diniz mantém, ainda, um site pessoal caprichado, com vídeos produzidos especialmente para esse espaço, artigos e dicas sobre desenvolvimento profissional, entre outros assuntos. Seus braços digitais, no entanto, se estendem para páginas na Wikipédia e para um canal próprio no YouTube. No portal do Google, ele publica vídeos curtos com conselhos sobre desenvolvimento profissional, por exemplo. 

 

No comando de uma companhia que fatura R$ 36,2 bilhões por ano e mantém 79 mil funcionários, o empresário usa as mídias sociais para dar vazão a assuntos de que gosta muito, como esporte e cuidados pessoais. Mas, quando a temperatura do mercado sobe, ele usa a internet para dar seu recado. É o que vem acontecendo nas últimas semanas, em razão da polêmica e malograda tentativa de fusão com o Carrefour. “Estou sendo muito criticado, mas acredito que a fusão com o Carrefour será boa para o País e para os brasileiros”, afirmou no microblog. “Tudo acabará bem e em breve contarei toda a história.”

 

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Abilio Diniz, presidente do conselho do grupo Pão de Açúcar: as novas mídias servem para expor ideias e sua opinião sobre os negócios    

 

Eike Batista e Abilio Diniz são as duas maiores estrelas do mundo empresarial brasileiro nas redes sociais. E, como sempre ocorre com aqueles que desbravam veredas, também estão aprendendo a lidar com o desconhecido. Não há receita pronta à disposição de ninguém. O importante a se observar na postura deles – e que pode servir de inspiração a outros CEOs – é que, mais que simplesmente terem contas nesses ambientes digitais, eles interagem com os usuários e demonstram, na prática, que estão em sintonia com uma nova realidade do mundo dos negócios: hoje, o gestor moderno deve estar aberto ao diálogo e às demandas da sociedade, no ritmo da comunicação digital. Deve ouvir o que se diz dele e das empresas que dirige e estar perto daqueles que compram seus produtos. É como fazia o comandante Rolim Amaro, fundador da TAM, que recebia os clientes de sua companhia aérea no portão de embarque e mantinha um canal especial de comunicação, o “Fale com o Presidente”. A diferença, agora, é que isso pode ser feito na internet. Nesse sentido, o tapete vermelho no mundo digital são as mídias sociais.     

 

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Batista e Diniz estão na vanguarda de um processo que já começou a transformar a relação dos CEOs com o mundo à sua volta e com a gestão de suas companhias. Como toda etapa que se inicia, a travessia será longa, até que esse comportamento seja mais bem assimilado pelo conjunto do mercado, se generalize e se torne tão comum para um alto executivo ou empresário quanto falar inglês. Uma pesquisa inédita que acaba de ser concluída pela Medialogue, empresa paulista especializada no estudo de mídias digitais, ajuda a entender o estágio em que os líderes das empresas brasileiras se encontram nessa questão. O estudo “O CEO nas mídias sociais” fez uma radiografia da exposição dos presidentes das 50 maiores empresas do Brasil nas principais redes, como Linkedin, YouTube, Orkut, Facebook, Twitter e Flickr. 

 

A análise também levou em conta os canais colaborativos, como Wikipédia, além do resultado de busca no Google, blogs e, claro, o site das empresas dos CEOs. A principal constatação é que, ao contrário do que ocorre com suas companhias, os executivos, do ponto de vista pessoal, ainda estão relativamente distantes das redes sociais. Em outras palavras, o que acontece é que, enquanto um número crescente delas se estrutura para atuar nas redes sociais, seus presidentes mostram-se reticentes em relação à sua presença nesses canais. “Os CEOs, seja por uma decisão particular de preservar a privacidade, seja por falta de tempo ou por decisão de não personalizar a empresa, evitam a exposição nas mídias digitais”, diz Alexandre Secco, presidente da Medialogue e responsável pela pesquisa.

 

Levando-se em conta que a imagem de um CEO está associada ao que se pensa da companhia, essa decisão talvez devesse ser revista, acredita Secco. “Afinal, trata-se de uma questão estratégica para a companhia e o LinkedIn é uma rede profissional.” A distância do mundo virtual fica mais clara quando se observa que, das 50 empresas pesquisadas, 26 não possuem perfil oficial no Twitter. Além disso, apenas dez entre os 50 executivos avaliados mantêm um perfil completo no site da companhia que dirigem e 46 não possuem página no Facebook. Os CEOs também não têm canais próprios no YouTube, embora haja vídeos publicados com referências a 35 dos 50 pesquisados. Alguns dos que foram mais vistos referem-se a gafes cometidas pelos CEOs, cobrança de consumidores ou críticas. 

 

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É possível argumentar que os sites e as informações oficiais das empresas são as melhores fontes para quem deseja buscar dados objetivos sobre o CEO. É fato. A pesquisa da Medialogue mostra, porém, que apenas 20% das companhias pesquisadas apresentam informações profissionais e acadêmicas completas sobre seus CEOs. Sites oficiais da maioria delas mostram apenas listas de nomes e cargos. Por todas essas razões, pode-se afirmar tranquilamente que os CEOs brasileiros caíram na rede, só não se sabe exatamente o que estão fazendo lá nem o que os colocou lá dentro. Há vários sinais de que os presidentes se preocupam e se mostram curiosos sobre o tema. O problema é que a forma como muitos deles cuidam da própria imagem nas redes sociais revela que talvez, ao contrário do que fazem Batista, da EBX, e Diniz, do Pão de Açúcar, ainda não tenham dedicado tempo ao assunto.  

 

A internet e as redes sociais parecem ambientes caóticos nos quais os jovens trocam piadas, adulteram imagens e idolatram o astro mirim Justin Bieber, um fenômeno da rede que tem a espantosa cifra de 11 milhões de seguidores no Twitter. Sim, a internet é tudo isso mesmo, mas também é o lugar para onde o mundo dos negócios está sendo transferido – e não estamos falando apenas das atividades de natureza digital. A Fiat, por exemplo, já vende carros pela internet. Às vezes, a questão pode não se relacionar propriamente com os negócios, mas afeta diretamente a imagem do executivo. A pesquisa da Medialogue chama a atenção, por exemplo, para o fato de que 70% dos CEOs aparecem em tópicos de discussão no Orkut, enquanto outros 70% constam em vídeos no YouTube, mesmo sem ter uma presença oficial nesses canais. 

 

Benjamin Steinbruch, CEO da CSN, é citado em tópicos que discutem poluição do solo, entre outros temas. Pouco pode se fazer diante dessas situações, mas elas servem para lembrar que, na era da informação digital, ninguém é dono da própria reputação: ela está em permanente construção e, em muitos casos, em desconstrução. Há um ceticismo natural em relação a esse mundo jovem e aparentemente fútil das mídias sociais. Uma pesquisa da consultoria Weber Shandwick revelou que os executivos de alto escalão estão de certo modo intimidados pelo assunto e não se sentem confortáveis para discuti-lo com suas equipes. Embora os novos tempos exijam uma reflexão na maneira como o CEO se relaciona, é preciso dizer que também os executivos não devem sair por aí criando perfis indiscriminadamente. 

 

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Há recomendações sérias para um CEO pensar duas vezes antes de entrar de cabeça nesse mundo aderindo ao Facebook, LinkedIn, Twitter e blogs. Primeiro, porque conquistar uma boa audiência para uma conta no Twitter ou para um perfil no Facebook dá muito trabalho. Além disso, soltar o verbo nas mídias sociais abre caminho para deslizes e escorregões que podem ser inofensivos para um adolescente, mas extremamente problemáticos para um profissional na direção de um negócio bilionário. O Tribunal de Justiça de São Paulo examina um caso em que o réu, um devedor, alega impedimento do juiz que analisou o assunto, em primeira instância, porque descobriu que o magistrado estava na lista de amigos que o autor da ação tinha no Facebook. 

 

Uma das principais razões que fazem os CEOs não entrar nas redes sociais é para evitar o risco de discutir negócios privados em ambientes públicos. “O que se deve fazer é conhecer profundamente esse mundo e definir uma estratégia muito clara, seja para estar dentro, seja para estar fora”, diz Secco. Foi exatamente o que fez o executivo brasileiro Yoshio Kawakami, presidente da Volvo Construction Equipment Latin America, fabricante sueca de equipamentos para construção e de componentes de engenharia para aviões que faturou, em 2010, US$ 631 milhões na região. Quando as notícias sobre o crescimento das redes sociais começaram a frequentar as páginas de jornais e revistas de economia, Kawakami farejou que algo iria mudar nas relações de negócios e por isso tratou de estudar de perto o assunto. Diante disso, decidiu que o primeiro passo para ter condições de criar uma estratégia de atuação digital da companhia seria ele próprio participar das redes. O raciocínio é simples: para entender a dinâmica do jogo, faça parte  dele. Assim, montou um perfil no LinkedIn, há cerca de três anos, e lá é figura assídua em fóruns de discussões sobre temas ligados aos setores nos quais sua companhia atua. Hoje, também usa o Facebook, o Twitter e mantém um blog com artigos sobre carreiras. “Decidi me conectar porque precisava entender as transformações nos negócios que as redes sociais começaram a provocar”, diz  Kawakami. Aos poucos, descobriu a melhor maneira de usar cada canal. Enquanto o Twitter é utilizado para se manter informado mais rapidamente, o Facebook conecta-o a amigos e familiares, e o blog permite a ele conversar com jovens que iniciam a carreira e se preocupam com o desenvolvimento profissional. 

 

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O LinkedIn, por sua vez, serve para estreitar laços com potenciais clientes ou fornecedores. “Mas essa rede também é muito útil para auxiliar em contratações”, afirma Kawakami, que vê benefícios no uso das redes sociais no trato com os subordinados. “As redes sociais são importantes para a aproximação com os funcionários.” No caso do Twitter, a falta de tempo o faz utilizá-lo com menos frequência. Há outra razão, no entanto, que o leva a usar o microblog com muita parcimônia. “Por uma questão de segurança, tomo cuidado para não me expor muito lá”, diz. 

 

A questão da segurança é um ponto importante quando o assunto são CEOs e mídias sociais. Essa precaução é realmente necessária. O que alguns CEOs que participam das redes fazem para evitar complicações é não dar informações pessoais ou que indiquem sua rotina de trabalho e locais frequentados. Outro cuidado é restringir o acesso aos seus perfis em redes como o Facebook, um canal que, por essência, se presta a relações mais próximas, como amigos e familiares. Paulo Kakinoff, CEO da Audi Brasil, toma esses cuidados, mas não vê a questão da segurança como motivo para que o CEO não ingresse no mundo digital. “Não tenho paranoias com relação a isso”, diz. “O que faço é ter cuidado para evitar a superexposição.” Sua rede no Facebook tem mais de 1.740 pessoas, entre amigos, familiares, contatos profissionais e pessoas ligadas à comunicação e marketing.

 

O Facebook é a rede que ele escolheu para participar e o ajudou a definir melhor os contornos para a estratégia digital da companhia. Seu envolvimento com o site vai ao ponto de que ele próprio, eventualmente, abastece o perfil de Guto Kleien. Trata-se do personagem que representa a Audi Brasil na internet. “Quando estou em eventos da empresa e vejo alguma coisa curiosa, eu mesmo posto como se fosse o Guto”, diz Kakinoff. O personagem também ajuda a responder a mensagens enviadas por consumidores das redes sociais, o que inclui o Twitter. Cerca de 30% dos contatos da empresa com os clientes na web são feitos por meio dele. 

 

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O exemplo de Kakinoff mostra que a figura do CEO e de sua empresa na internet estão intimamente ligadas. Ainda que a página num determinado site seja particular, é impossível a dissociação entre pessoa física e jurídica. Esse é o ponto que deve estar claro para qualquer CEO na hora em que decide ingressar na mídia social, diz Sérgio Valente, presidente da DM9DDB. “O CEO deve ter a consciência de que, na rede, ele não é uma persona privada, mas sim a empresa que representa”, afirma. 

 

Um dos executivos de comunicação mais ativos nos canais digitais, Valente acredita ser crucial que o CEO reflita, antes de qualquer coisa, sobre qual vai ser o seu papel na internet. “O ponto de partida é definir a sua estratégia nesse ambiente.” Wilson Ferreira Jr., presidente da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), considera esse ponto tão importante que sua participação nas mídias sociais é menor do que a de sua empresa. Para evitar a exposição pessoal e por falta de tempo, ele optou por não participar de sites como Facebook, Twitter ou YouTube, mas trata esses ambientes como assuntos estratégicos para a CPFL. 

 

Isso se deve ao fato de que, para uma empresa que atende a um total de 22 milhões de pessoas, estar atenta ao que os usuários dizem é fundamental. “As redes sociais permitem que tenhamos um olhar qualitativo sobre o serviço prestado”, diz. “Os relatórios numéricos sobre o que fazemos não dão a real dimensão do que as pessoas pensam de nós.” Marco Antônio Bologna, presidente da holding que controla a TAM , pensa da mesma forma. “Esse tipo de interação é fundamental para uma empresa como a nossa”, afirma. Por isso a TAM atua no Twitter, Facebook e YouTube, por exemplo, enquanto ele próprio só está no Facebook. 

 

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A opção por não participar pessoalmente do Twitter, por exemplo, tem a ver a com a empresa. Se estivesse lá, muitos clientes poderiam mandar para ele mensagens sobre questões operacionais, como dúvidas a respeito de voos ou coisas do tipo, ou reclamações. “Eu ficaria louco com tanta mensagem”, diz. “Para resolver esses assuntos, temos um perfil da TAM no microblog.”

 

Embora corriqueiros, exemplos como o citado por Bologna indicam a complexidade que é para um CEO participar das redes sociais. Sobretudo, quando se trata de empresas de serviços, é humanamente impossível interagir, como pessoa física, com milhões de usuários. O lado positivo, no entanto, é que, assim como ele, um número cada vez maior de executivos está alerta para o desafio de entender esse universo. Nesse processo, podem aprender com gente como o americano Tony Hsieh, CEO da loja online de calçados Zappos.com, que foi vendida por US$ 1,2 bilhão para a Amazon, em 2009. Hsieh desenvolveu para sua empresa uma estratégia de mídia social que tinha o objetivo de aprofundar o relacionamento com os consumidores. O microblog ajudou a substituir o 0800, como meio de contato. E ele próprio é uma estrela do site, com 1,8 milhão de seguidores. “O Twitter permite que sejamos mais humanos com nossos clientes e, dessa forma, possamos construir relacionamentos ao longo do tempo”, disse à Dinheiro. Outro exemplo útil é o da também americana Rachel Sterne. 

 

Ela foi nomeada recentemente pela Prefeitura de Nova York para o recém-criado posto de chief digital officer da cidade. Seu trabalho é coordenar as iniciativas da cidade no mundo da internet. Uma de suas incumbências é melhorar a comunicação do governo local pelas mídias sociais e promover a indústria de tecnologia da região. Além de pioneiro, seu trabalho é reflexo de uma revolução sem precedentes na comunicação e um raro exemplo de contribuição do setor público, que pode ser utilizados pelos CEOs na hora de repensar suas relações de negócio e a forma como se comunicam. 

 

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