A lambança financeira que autoridades monetárias europeias tentaram impor à endividada Chipre só não teve maiores consequências porque o Parlamento daquele país insular, em um momento de rara lucidez, decidiu barrar a proposta de confisco em curso. Sim, a diabólica ideia de tungar a poupança de cidadãos – em confronto aberto com qualquer regra de civilidade e legitimidade – voltou a ser cogitada naquele recanto paradisíaco do mundo, porta dos fundos do Mar Mediterrâneo, como alternativa para cobrir rombos de caixa. Repetiria, com os mesmos requintes de tragédia anunciada, o malfadado esquema imposto no Brasil pelo ex-presidente, agora senador, Fernando Collor, demonstrando claramente que autoridades teimam em não aprender com erros do passado. 

 

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Quem desta vez bolou o frustrado ardil foi o Banco Central Europeu (BCE) em conluio com o FMI e o Fed americano. A rapinagem grassava com fervor nas cabeças mais coroadas da cúpula financeira global. O governo cipriota encampou a ideia para agradar aos credores. A população, em desespero, correu às bocas de caixa dos bancos para salvar o que podia. Protestos tomaram as ruas. Um desastre geral! E o exaustivo esforço feito até aqui para resgate da credibilidade do sistema no continente europeu – e consequente saneamento de sua dívida soberana – quase foi por água abaixo dada a ideia de dementes. Não estão descartados sequer arranhões à imagem do euro. Afinal, pode se alastrar o receio de que a medida tome impulso e avance em outras praças do Velho Mundo. 

 

No saldo do episódio, o que os líderes financistas europeus fizeram foi dar munição para o agravamento da crise. Erro primário, descabido e inesperado. Países membros da zona do euro perderão tempo e dinheiro aos montes para contornar o estrago e acalmar os alarmados correntistas de suas instituições. Uma investida destrambelhada de depositantes aos bancos é tudo o que a Europa não precisa neste momento. Não se salva o mercado com desordem social. E Chipre, no caso, esteve bem perto disso dada a falta de habilidade de quem tinha o poder de decidir. Que a lucidez e o equilíbrio voltem a prevalecer na cabeça desses senhores do capital. Do contrário, Chipre pode se transformar no epicentro de uma nova hecatombe monetária internacional.