Quando começou a fazer balas em um tacho de cobre dentro da própria garagem para vender pelas ruas do bairro Florestal, em Lajeado, no Rio Grande do Sul, Natalício Heineck não imaginava que as receitas que tanto agradavam sua vizinhança pelos idos de 1930 conquistariam prateleiras de 80 países diferentes e um faturamento de R$ 570 milhões em 2022, um crescimento de 45% na comparação com o ano anterior.

Também é de se supor que ele se espantaria ao saber que isso é só o começo, pois a Docile prevê dobrar de tamanho e conquistar seu primeiro bilhão até 2025.

Ao menos é o que planejam os herdeiros da tradição familiar de quase um século. Hoje, fabrica mais de 170 itens entre balas, pastilhas, chicletes, refrescos e marshmallows – o carro-chefe da empresa -, exportando mais de 4 mil toneladas de doces por mês.

Maior exportadora brasileira de balas

A empresa foi fundada pelos netos de Natalício – os irmãos Ricardo, Fernando e Alexandre – como uma distribuidora de doces, em 1991. Atualmente, cerca de 40% da receita é oriunda de mercados como Estados Unidos, Inglaterra, países árabes e latino-americanos.

Com o câmbio favorável e maior foco comercial no mercado internacional, a Docile se tornou a maior exportadora brasileira de balas no ano passado, ultrapassando o volume da paulista Riclan, dona de marcas como Freegells e My Toffee.

Apesar de ser uma marca ligada à tradição, a companhia aposta mesmo é em tecnologia e inovação. A marca está investindo R$ 100 milhões na ampliação dos seus parques fabris, localizados em Lajeado e Vitória de Santo Antão, em Pernambuco.

Recentemente implantou o primeiro robô na linha de produção. Mas como produzir doces que agradam paladares no mundo inteiro e ao mesmo tempo disputar espaço com a espanhola Fini e a alemã Haribo no Brasil?

“Muita flexibilidade de produção, compromisso com os critérios de mercados exigentes e estratégia comercial sólida”
Ricardo Heineck, Sócio-fundador e diretor responsável pelas áreas de P&D da Docile.

A empresa pesquisa e investe em tendências. Um exemplo é o recém-lançado ‘Maxmallow para Assar’. Segundo o diretor, uma novidade para inserir o “jeitinho brasileiro” no conceito americano de comer a guloseima em volta do fogo. “Realizamos pesquisas e entendemos que poderíamos oferecer um produto que ficasse ainda melhor quando aquecido”, afirmou.

E as inovações não param. “Lançamos produtos veganos, exportamos doces sem matéria-prima geneticamente modificada e somos a primeira empresa a receber a certificação internacional de segurança de alimentos FSSC22000, o que garantiu espaço nas prateleiras do mundo”, disse o executivo.

De Lajeado para o mundo: com a ampliação, a planta totalizará 37 mil m2 (Divulgação) (Crédito:Divulgação)


A estratégia anda sobre rodinhas

Com bons produtos no mercado, faltava uma estratégia que tornasse a marca conhecida. Ano passado a empresa fechou contrato com a medalhista olímpica e campeã mundial de skate, Rayssa Leal. Como embaixadora, a Fadinha, como é chamada a atleta, estampará as embalagens da linha Doces Gentilezas.

“Queremos consolidar nossa imagem no mundo e a Rayssa é perfeita como porta-voz.”

Outro exemplo que confirma o olho no futuro da marca é a preocupação ambiental e o investimento em sustentabilidade. As fábricas da Docile reciclam 97% dos resíduos sólidos gerados, tratam e utilizam a água deixando de emitir mais de 750 toneladas de CO2 no meio ambiente todos os anos.

A unidade pernambucana possui mais de 1,1 mil placas fotovoltaicas capazes de abastecer 100% da energia necessária. O investimento na instalação do sistema foi de R$ 1,7 milhão – com a geração de energia solar, a empresa deixou de emitir 68 toneladas de gás carbônico e economizará R$ 250 mil por ano.

O diretor garante que os desafios aos planos da Docile já estão identificados. Em um cenário econômico ainda instável à espera de definições políticas que afetam a capacidade de planejamento de longo prazo, a saída é apostar na eficiência produtiva e mitigar o custo logístico que a extensão territorial do País representa. “Como bala tem uma margem de lucro pequena, nós precisamos oferecer preços competitivos e chegar aos pontos de venda que não estamos até agora.”

E se o começo da companhia exigiu iniciativas pouco ortodoxas, como quando os irmãos usavam uma betoneira adaptada para misturar ingredientes ou equipamentos da indústria farmacêutica para fazer pastilhas, o sucesso da empresa familiar ainda demanda ousadia.

Uma delas é traçar um plano de sucessão e contar com o apoio de especialistas para a gestão, mas abrir mão de ter um presidente, mantendo os três irmãos dividindo a função principal. “Funciona bem para gente desta forma”, afirmou Ricardo, provando que ousadia é o segredo doce do sucesso.