O Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional reuniu-se nesta segunda-feira, 4, para debater, em audiência pública, a remuneração de conteúdo jornalístico pelas plataformas digitais. O evento teve a participação de integrantes do grupo, membros da sociedade civil e especialistas sobre o tema para publicar um relatório o mais breve possível.

A discussão no colegiado se alonga desde agosto de 2023, quando o documento começou a ser idealizado. Na visão dos participantes, naquele primeiro momento era preciso haver mais discussões para aprofundar a análise.

“Estamos num momento em que a discussão parlamentar no Legislativo não está encontrando uma saída no curto prazo. Nosso objetivo foi fazer um debate, que a Câmara e o Senado não estão fazendo, para quando esses projetos voltarem a tramitar”, diz Patrícia Blanco, vice-presidente do conselho.

No debate desta segunda, que durou pouco mais de duas horas, os participantes discutiram perspectivas e soluções diante da dificuldade de existir um modelo financeiramente viável, na internet, para veículos noticiosos que realizam o jornalismo profissional.

A pesquisadora e professora da Universidade de Brasília (UnB) Marisa von Bülow afirma que a discussão ganha ainda mais relevância diante do cenário em que o consumo de notícias na internet ocorre cada vez mais em redes sociais, plataformas digitais e aplicativos de mensagem.

Marisa também abordou como está a discussão em outros lugares do mundo e como ainda há incertezas sobre um melhor modelo regulatório. “É desse tipo de fórum que a gente precisa para tentar desatar esses muitos nós com participação e pluralidade, para dar a voz para todos os interessados. Não são só as plataformas digitais e as empresas de conteúdo jornalístico que têm interesse sobre o tema, mas a cidadania como um todo”, disse a professora, autora de um relatório feito para o Comitê Gestor da Internet (CGI) sobre o tema.

Marcelo Rech, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), aponta que veículos jornalísticos puramente digitais, anteriormente vistos como a solução diante do desafio encontrado por empresas jornalísticas nas plataformas digitais, “vêm sendo devastados” por não encontrarem um modelo economicamente viável.

Para ele, há uma “drenagem de recursos tremenda” por parte de “oligopólios digitais”, composto por empresas como o Google, principal site de buscas da internet, e a Meta, empresa dona do Facebook e do WhatsApp, principal rede social e aplicativo de mensagens instantâneas do mundo.

“Da mesma forma que é preciso combater o aquecimento global, tem que haver a mesma lógica para uma ameaça à saúde mental do planeta”, disse Rech. Ele afirma ser necessário também pensar um modelo que remunere veículos jornalísticos independentemente se as empresas usarem o conteúdo ou não.

Francisco Brito Cruz, diretor-executivo do InternetLab, indica a necessidade de um diagnóstico que reúna o que houve de melhor em outros lugares do planeta para a criação de um modelo próprio no Brasil diante a urgência de regulação. Só que o remédio não é simples, já que, para ele, ainda não há na literatura acadêmica sobre o tema “um diagnóstico que prevaleceu”.

“A transformação digital agravou a crise de sustentabilidade (dos veículos jornalísticos). É possível entender que há uma desorganização nesse mercado, levada pela digitalização e que esse efeito foi destrutivo, sim”, disse Francisco. “Por consequência, há a necessidade de regular (o mercado) e, na prática, isso que está sendo discutido.”

Outros integrantes participaram da discussão. Maria José Braga, representante da categoria profissional dos jornalistas do grupo, falou de uma proposta feita pela Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) sobre a taxação de plataformas a partir de uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), dispositivo tributário que incide sobre setores da economia que interferem em outros setores.

“Sabemos que as plataformas digitais provocaram desorganização e há uma decadência mesmo por questões financeiras do jornalismo no Brasil”, afirmou. “Nada mais justo que haja uma reorganização do sistema financeiro.”

João Camilo Júnior, representante das empresas de televisão do Conselho acredita que é preciso que a discussão avance com celeridade diante da falta de regulamentação não apenas sobre o conteúdo jornalístico nas redes, mas das próprias plataformas digitais.

“Neste ano, teremos eleições municipais e a gente vai sentir uma ausência de regulamentação para esses players de redes sociais e das plataformas”, afirmou. A maior preocupação, acredita João Camilo, é que novos “desertos de notícia” surjam nas redes e se amplie esse cenário em ambientes digitais.

Projetos sobre o tema tramitam no Congresso

Três projetos sobre o tema tramitam no Congresso. Um deles é de autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que altera a Lei dos Direitos Autorais para, entre outras medidas, obrigar plataformas digitais a remunerarem artistas e empresas jornalísticas pelo conteúdo criado. O projeto está em análise na Câmara dos Deputados.

Também na Câmara tramita o Projeto de Lei das Fake News, de relatoria do deputado Orlando Silva (PcdoB-SP). A proposição passou por ampla discussão na Casa e chegou a ter o requerimento de urgência aprovado no plenário. Desde então, a matéria está parada após pressão das big techs e de deputados apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).