12/11/2003 - 8:00
Do seu novo escritório de mil metros quadrados, que ocupa todo um andar do edifício Eluma, na Avenida Paulista, o administrador e advogado Alcides Tápias, de 61 anos, tem uma vista estratégica. Dali, o ex-ministro do Desenvolvimento de Fernando Henrique, ex-presidente da Camargo Corrêa e ex-vice-presidente do Bradesco observa o quartel general da indústria paulista, o imponente prédio piramidal da Fiesp, a Federação das Indústrias de São Paulo. A proximidade com o setor produtivo não é mera coincidência. Estar perto, muito perto, da indústria é a alma do novo negócio de Tápias ? a Aggrego Consultores, fundada oficialmente na tarde de quinta-feira passada, dia 6, quando seus 11 integrantes reuniram-se pela primeira vez na sede da empresa. Ainda meio perdidos entre caixas e móveis semi-montados, os sócios foram descobrindo o novo ambiente ao mesmo tempo em que posavam para as fotos do catálogo inaugural da companhia. Serão impressas duas mil cópias que vão ser enviadas para a elite das empresas brasileiras. Nesse documento, o primeiro com o timbre da Aggrego, já constará aquilo que pretende distinguir a nova consultoria de seus antecessores e concorrentes: exclusividade. ?Quem contratar o Tápias terá o Tápias resolvendo pessoalmente seus problemas?, afirma o mentor do negócio. ?Isso vale para mim e para qualquer outro consultor aqui. Seremos assessores pessoais.? Aggrego, aliás, é a palavra latina para agregar, e foi sugerida pela mulher de Tápias, Luzia, com quem ele está casado há 40 anos.
Ao ex-ministro juntou-se a primeira divisão do mundo dos negócios. Estão na empresa Hermann Wever, ex-presidente da Siemens; José Cechin, ex-ministro da Previdência; Alkimar Moura, ex-Banco Central; e o publicitário Mauro Salles ? antigo sócio de Tápias na Interamericana, onde o ex-ministro estreou na atividade de consultor. Antônio Hermann, 49 anos, ex-presidente do Banco Itamarati, é especialista em gestão financeira de risco. Jaime Singer, 37, economista egresso do CSFB Garantia, vai cuidar de fusões e aquisições. Roberto Vaz, 65 anos, especialista em sucessões familiares, cuidará com Tápias dos casos de reestruturação. A consultoria funcionará como cooperativa com três áreas básicas de atuação: mercado financeiro, previdência privada e reestruturação. Pretende na prática aglutinar funções que vão desde a mera consultoria de gestão até a criação de fundos de previdência ? sempre com o conceito de personal adviser. Tápias não gosta de ver bandos de pessoas envolvidos no mesmo projeto e garante que quem contratá-lo terá de lidar apenas com ele mesmo e sua secretária, Denise. Por isso, o ex-ministro define de antemão sua capacidade limite: algo entre quatro e cinco projetos simultâneos. ?Trabalho 12 horas por dia, mas não dá para pegar todos os projetos que aparecerem?, diz ele. Se algum projeto exigir habilidades multidisciplinares, pode-se trazer um outro consultor da Aggrego, até o limite de três. ?Mais que isso vira uma equipe e o comprometimento pessoal é menor?, diz Tápias.
Mas, afinal, quanto custa uma assessoria desse gabarito? Tápias e seus sócios não gostam de falar disso, mas o mercado faz contas. A remuneração nesse tipo de trabalho é calculada através da chamada ?taxa de sucesso?, que varia de 1% a 2% do total da negociação. Uma bem-sucedida reestruturação de dívida no valor de R$ 500 milhões, por exemplo, custa cerca de R$ 5 milhões. A intermediação de compra ou venda de uma grande empresa não sai por menos de R$ 1 milhão. Mas esse não é um dinheiro certo. ?São trabalhos que podem durar até um ano e há o risco de o negócio não ser concluído?, diz o economista Singer, que já assessorou grupos como Kraft e Nestlé. O mercado também vê com bons olhos o atendimento personalizado que a Aggrego quer oferecer. ?Desse jeito que eles estão fazendo é novidade?, diz o ex-ministro Mailson da Nóbrega, sócio da consultoria econômica Tendências.
Também agrada ao mercado as áreas escolhidas pelos novos empreendedores. O setor de previdência privada está em franca expansão, assim como áreas do mercado financeiro como securitização e preparação de emissões. São especialidades que a Aggrego tem em casa. O ex-ministro Cechin, o executivo Nilton Molina, da Icatu Hartford, e René Topfstedt, ex-controller do Bradesco, com várias décadas de experiência somada nessa área, pretendem ajudar as empresas a montar fundos de pensão ou melhor manejar os fundos já existentes. Existem no Brasil 361 fundos de pensão privados, que representam um universo de 2.100 empresas. Quando se lembra que existem no País 2,3 milhões de empresas, o potencial desse negócio salta aos olhos. ?O mercado está lá. Só precisamos encontrá-lo?, diz Cechin, que está debutando no ramo da consultoria privada. Das áreas de atividade da empresa, somente um setor ? fusões e aquisições ? é visto pelo mercado com algum ceticismo. Não porque seja mau negócio, mas porque a concorrência é vasta e respeitável. Tápias não se intimida com essa análise. Ele diz que a economia está saindo de uma recessão e que este é o momento em que as empresas começam a olhar em volta à procura de oportunidades. ?As estrangeiras estão de olho novamente nas companhias brasileiras?, diz Singer. Tanto a área de fusões quanto a de reestruturação de dívidas costumavam ser uma reserva de atuação quase exclusiva dos grandes bancos de investimento estrangeiros como J.P. Morgan e Bank of America. Com a redução de atividades desses gigantes no Brasil, sobrou um grande espaço de atendimento local que a Aggrego pretende aproveitar. ?Ninguém ainda tentou ocupar esse terreno?, diz Erivelto Rodrigues, da Austin Asis.
Mais que experiência e conhecimento técnico, o grande ativo da Aggrego é a rede de contatos dos seus consultores ? todos eles homens de negócios muito bem resolvidos em suas áreas e donos de sólido patrimônio pessoal. ?Não dá para calcular quanto vale a agenda de telefones desses caras?, diz Tápias, referindo-se aos sócios. Ele mesmo carrega na pasta sete crachás diferentes, referentes à empresas nas quais atua como conselheiro, entre elas Itaú e Sadia. Seus sócios são da mesma estirpe, pessoas que circulam pelos corredores da economia com desenvoltura e tratam diretamente com os grandes homens de negócio do Brasil. Isso sem falar nas relações com o poder público. Esse acesso à cúpula das empresas, imagina-se, vai encurtar o caminho até os novos contratos. Veja-se o caso de Hermann Wever. O executivo, que esteve à frente da Siemens por 15 anos, é campeão de conselhos: oito empresas e oito entidades. Um exemplo da possível sinergia entre executivos ocorreu semanas atrás. Tápias desenvolvia um trabalho para a Eletra, fabricante de ônibus elétrico de São Bernardo do Campo, e sugeriu a Wever que apresentasse a nova tecnologia elétrica-diesel da empresa a Ben van Schaik, presidente da filial brasileira da Mercedes-Benz no Brasil. Foi feito.
Se um contrato surgir no futuro, ponto para a Aggrego ? e remuneração, claro.
Com tantos bons contatos, não falta gente batendo à porta de seu escritório pedindo ajuda nas esferas federais. ?Não faço lobby no governo, no Banco do Brasil nem no BNDES?, avisa Tápias. ?E também não dou canelada em banqueiro.? Por canelada entenda-se calote. ?Nisso não há arte nenhuma e nem precisa de consultor.? Em termos de remuneração, o princípio da Aggrego é simples: ganha mais quem trabalha mais. Mas a idéia é que todos tragam clientes, trabalhem muito e recebam projetos excedentes dos colegas. Os sócios vão formar um fundo comum para bancar as despesas correntes do escritório, mas o investimento principal saiu mesmo do bolso de Tápias. Com suas ?economias?, ele ?raspou o tacho? para comprar e reformar o andar inteiro que abriga a nova consultoria, avaliado em quase R$ 3,7 milhões. Enquanto os contratos não viram dinheiro vivo, ele irá bancar o telefone e o cafezinho da turma. E se o negócio não der certo? Tápias ergue as sobrancelhas, põe um ar de riso nos olhos azuis e brinca com o destino. ?Bom, nesse caso terei um escritório de mil metros quadrados para ler jornal todos os dias.?