Detentores de US$ 17,3 bilhões em títulos de dívida do Credit Suisse, chamados no jargão do mercado de “bônus conversíveis contingentes”, ou “CoCo bonds”, se organizam para brigar na Justiça por investimentos que viraram pó da noite para o dia com a compra da instituição pelo também suíço UBS. Isso pode prolongar as incertezas relacionadas à venda, feita às pressas no final de semana. Em Wall Street, são apontados entre os maiores afetados pesos-pesados norte-americanos, como a gestora Pimco e a Invesco Capital Management, que juntas teriam mais de US$ 1 bilhão.

Escritórios de advocacia especializados em litígios complexos como o Quinn Emanuel Urquhart & Sullivan e o Korein Tillery têm reunido demandas de investidores que não admitem o cancelamento de seus títulos. A estratégia ainda está sendo definida, com várias opções na mesa, mas o caminho litigioso ganha força na esteira do que aconteceu após a venda do banco espanhol Popular ao Santander, neste que promete ser o grande teste dos “CoCo bonds”.

Criados após a crise financeira internacional de 2008, esses títulos são usados por bancos para captar recursos e atender a exigências regulatórias de capital. Os “CoCo bonds”, também conhecidos como “AT1? ou “Additional Tier 1 Bonds”, são um instrumento de dívida com retorno maior para os investidores, mas o risco também é mais elevado. Na escala de credores, são os penúltimos da fila a receber por seus investimentos, estando à frente só dos acionistas.

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Porém, na venda do Credit para o UBS, os US$ 17,3 bilhões em títulos AT1 do banco foram reduzidos a zero, de acordo com o regulador financeiro da Suíça, Finma. Apesar de essa ser uma possibilidade, o que incomodou os credores foi o fato de não receberem nada, enquanto os acionistas vão embolsar cerca de US$ 3,25 bilhões com a transação. Havia a expectativa de que fosse ocorrer ao menos parte da conversão dos papéis em ações.

“A questão é a incerteza em relação à hierarquia de credores, já que o AT1 teve uma perda maior em relação aos acionistas, o que foi uma surpresa negativa para o mercado de crédito”, diz o JPMorgan, em nota a clientes.

Uma reunião organizada pelo escritório Quinn Emanuel Urquhart & Sullivan (QE) atraiu ontem mais de 600 interessados de diferentes praças como Suíça e outros países europeus, Estados Unidos e Ásia, segundo apurou o Estadão/Broadcast.

Para o vice-presidente e diretor associado para bancos da FacSet, Sean Ryan, os investidores podem ter ficado surpresos porque a crise surgiu e se tornou séria muito rapidamente. No entanto, por trás do rendimento mais elevado desses títulos, havia um risco associado, e esses investidores estavam cientes dele. “Este é o primeiro teste desses instrumentos. A ideia de que isso poderia acontecer é bem conhecida, mas talvez houvesse uma falta de avaliação do risco que não era apenas fictício, mas algo que poderia ser muito real”, diz Ryan, em entrevista ao Estadão/Broadcast.

ABALO

A baixa contábil de US$ 17,3 bilhões do Credit é a maior perda já registrada no mercado de AT1. O único evento até então havia sido na venda do Popular ao Espanhol por cerca de US$ 1,45 bilhão, nos quais os detentores de títulos também viram seus investimentos reduzidos a pó. Esse tipo de papel é especialmente comum na Europa. O mercado europeu de “CoCo bonds” é estimado em US$ 275 bilhões e na segunda-feira teve forte venda dos papéis, com investidores temendo um risco até então fora do radar.

A Autoridade Bancária Europeia (EBA), o Banco Central Europeu e o Conselho Único de Resolução (SRB) agiram para restaurar a confiança nos títulos AT1. O Banco da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês) foi na mesma direção, o que levou a uma recuperação dos papéis na terça-feira. Para especialistas, os “CoCo bonds” devem sobreviver ao primeiro grande teste, mas o resultado será um instrumento de captação mais caro.

RISCO DE CONTÁGIO PERMANECE

Apesar da compra do Credit Suisse pela UBS, parte do mercado ainda tem preocupações quanto a possíveis contágios derivados da quebra do banco europeu.

A compra, no entanto, serviu para reduzir as perdas das ações do setor bancário, que estavam em queda livre na semana passada.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.