18/02/2010 - 10:03
Você investiria em ações de uma empresa brasileira, mas sediada na longínqua Bermudas para driblar a rigidez da legislação local? E se os controladores dessa companhia fossem presos pela Polícia Federal? E se a crise de governança corporativa resultasse na paralisação dos negócios e num processo de recuperação judicial? E se ela não publicasse balanços desde 2008?
Pois muita gente, apesar de tudo isso ter acontecido com a Agrenco, comprou papéis da companhia no ano passado. A especulação foi tamanha que, em 2009, sua ação (negociada por meio de recibos, ou BDR) liderou o ranking de valorizações da Bovespa, com alta de 1.195%. Pois na quinta-feira 11 quem ainda tinha o papel ficou com as calças curtas.

Furo: a coluna Moeda Forte da edição 644 antecipou a possibilidade de suspensão da Agrenco
A Comissão de Valores Mobiliários suspendeu o registro de companhia aberta da Agrenco e as negociações com o BDR foram interrompidas na bolsa. Até segunda ordem (ainda há chances de reversão da medida), o investimento virou pó. Não vale um mísero grão de areia, nem se vier de uma ilha britânica em algum paraíso do Atlântico. E para quem ficou com as ações, a sensação hoje é parecida com a de quem teve recursos bloqueados no Plano Collor ? todo o dinheiro está retido.
Muitos dos que apostaram com essas ações hoje choram as mágoas nas salas de bate-papo na internet, mas era evidente que a aventura com as ações da Agrenco não era propriamente segura. É fato que os especuladores tinham o direito de especular, apostando em boatos de que a multinacional suíça Glencore (que fez um acordo operacional com a brasileira em plena crise) acabaria salvando-a da falência.

Mas não se pode dizer que os investidores de última hora foram vítimas inocentes, pois qualquer um que aplica na bolsa tem o dever de obter informações detalhadas sobre a companhia da qual pretende tornar-se sócio. Como não publicava balanços há quase dois anos, a Agrenco levou cartão amarelo. E porque demorou tanto para o xerife do mercado de capitais agir?
Até janeiro passado, isso não estava previsto na legislação sobre os BDRs, o que só passou a ser feito a partir de janeiro, com a Resolução 480 da CVM. A lição que fica, para as pessoas físicas lesadas, é prestar mais atenção antes de comprar ações. ?O cidadão comum que investe na bolsa não está preocupado com a governança corporativa e não faz nenhuma análise profunda dos dados das empresas?, diz o professor de governança corporativa da Trevisan Escola de Negócios, Roberto Gonzalez. ?É simplesmente um absurdo.?
Já os investidores mais antigos, que compraram ações a R$ 10,40 em 2007, na abertura de capital, têm muitos motivos para reclamar. A empresa foi vendida como promissora pelo Credit Suisse. Contratou conselheiros independentes respeitáveis, como José Guimarães Monforte, Cassio Casseb Lima e James Terence Wright, que seriam os guardiões da governança corporativa. Mais um mito do mercado caiu. ?Conselheiro independente não é garantia de segurança para o investidor?, diz Gonzalez. Não é mesmo.