01/01/2021 - 13:12
“Todo mundo está preocupado, o cubano vive do susto!”, diz Yusbel Pozo, um comerciante de 36 anos que, como o restante de seus concidadãos, está na expectativa do forte ajuste econômico que começa neste 1o de janeiro, quando se completam 62 anos do triunfo da Revolução.
Os cubanos acordaram após o Réveillon com aumento salarial (525% no caso do mínimo), mas de ressaca devido aos aumentos substanciais de preços, que incluem cesta básica e energia elétrica, além de redução nos subsídios.
Desde que o presidente Miguel Díaz-Canel anunciou a reforma econômica há algumas semanas, os governantes têm se empenhado em explicar pela televisão cada uma das medidas para preparar os cidadãos para o chamado “dia zero”.
Para Yusbel Pozo, “o futuro é incerto”. “Não sabemos o que vai acontecer. A eletricidade aumentou cinco vezes, a comida subiu”, diz perplexo.
As autoridades previram um aumento generalizado de preços de 160% e esperam que as empresas privadas aumentem os preços 300% ou mais para sobreviver.
Um dos maiores descontentamentos da população que se viu nas redes sociais se deve ao aumento da energia elétrica inicialmente anunciado no Diário Oficial.
A tarifa aumentaria de nove para 40 pesos mensais para quem usa menos eletricidade, mas subiria muito mais para os setores de maior consumo. Esta semana o governo reconsiderou essas taxas e anunciou que esse aumento será de apenas quase 33 pesos.
Segundo o governo, o salário mínimo de 2.100 pesos cobre 1,3 cestas básicas, mas o economista da Universidade de Havana, Ricardo Torres, lembra que esse cálculo foi feito em junho de 2019, antes da chegada da pandemia do coronavírus e a grave escassez de produtos durante 2020.
– O “xadrez não contempla tudo” –
“Eles trabalharam muito, muitos grupos analisaram as diferentes questões dessa grande mudança”, mas há aspectos que fogem ao controle do governo como a possibilidade de inflação descontrolada, acrescenta Torres.
O acadêmico também critica o aumento da dolarização estimulado por essas ações.
Com as novas medidas haverá muito mais dinheiro em circulação e “o perigo que corremos é que, com todas as pressões inflacionárias que temos na economia, lançar mais dinheiro sem aumento de bens e serviços pode desencadear uma inflação acima do que é” planejado, disse o especialista.
Além disso, Cuba possui uma rede de lojas onde só se pode comprar com contas em MLC (moedas livremente conversíveis), abastecidas por dólares geralmente depositados fora do país.
Nestes estabelecimentos se vende boa quantidade de produtos de consumo diário para as famílias não contempladas com a caderneta de abastecimento, com a qual é fornecida aos cubanos alimentos básicos como arroz, açúcar, ovos, frango, óleo e outros.
No entanto, os dólares dessas contas não podem ser adquiridos em bancos ou casas de câmbio em Cuba.
O governo tem pensado cuidadosamente em todos os movimentos do tabuleiro, mas “neste xadrez nem tudo o que as famílias obtêm no mercado informal está contemplado e não há controle de preços ali”.
– “Tudo está em dólar” –
O ajuste econômico ocorre após uma queda do PIB de 11% em 2020, a pior em 27 anos, causada pelo forte golpe que a indústria do turismo, motor da economia da ilha, recebeu durante a pandemia e o aperto do bloqueio americano sob a administração de Donald Trump.
“Meus filhos não podem comer doces ou biscoitos neste Dia dos Reis. Tudo em dólares”, diz Ariadna Rodríguez, 28 anos e trabalhadora de um refeitório público, que não tem a sorte de estar entre os 50% de cubanos que recebem recursos de parentes ou amigos no exterior.
“Espero que eles percebam que estão nos prejudicando muito”, disse enquanto caminhava pela rua Amargura, na área turística de Havana.