A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), xerife do mercado financeiro, deixou de ser um órgão regulador superprotetor e com cultura de impor limitações para ser ‘mais propositiva’ e moderna, segundo o ex-diretor da instituição, Daniel Maeda.

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Atual diretor da B3, o ex-membro da CVM destaca que a autarquia passou, aos poucos, por uma mudança relevante.

“Há uma nova visão do papel que a CVM atribui a si mesma. Tem uma evolução clara e gradual. A CVM outrora tentava proteger o investidor, bloqueava produtos, vedava acessos. Agora é mais inclusiva, mais democrática”, disse, em evento do Nubank que ocorre em São Paulo nesta quinta-feira, 4.

“Hoje, nem se você quisesse você conseguiria acesso dos investidores a muita coisa. A CVM está mais propositiva e mais desenvolvimentista, e também mais realista. Agora ela reconhece as coisas como elas são e tenta trabalhar com isso”, completou.

Sobre a modernização da Resolução 175 da CVM, o ex-diretor observou que a norma ‘tenta criar um pavimento e uma arquitetura regulatória’ para que a inovação avance dentro do mercado financeiro.

A visão é de que existe um ‘potencial enorme’ com a estruturação de classes e subclasses dentro da indústria de fundos de investimento.

Apesar disso, o entendimento é de que a modernização ainda causa dúvidas na indústria e de que levará um tempo significativo para ampla adesão.

“Eu de fato ainda acredito nessa ideia, do instituto das classes e subclasse. Ele realmente vem para criar essa esteira, de toda uma gama nova. E eu sei que é difícil, eu sei que assim, na hora, participantes do mercado olham e falam ‘isso é muito diferente, eu nunca trabalhei desse jeito'”, afirmou Daniel Maeda.

“Eles [fundos] convivendo com diversos perfis de público conseguem escalar os produtos de forma muito melhor. Eu acredito bastante que vai dar muito certo, vai ser bem usado pela indústria, ainda que leve algum tempo. Até a indústria se acostumar com esse conceito que, de fato, é muito novo”, completou.

Entenda a resolução 175 da CVM

A resolução começou a ser implementada no início do ano de 2023, de forma faseada, e no fim de junho deste ano de 2025 acabou o prazo para os fundos se adaptarem às normativas.

A regra consolidou uma série de normas – mais de 40 – em um único lugar, mudando a regulação dos fundos de investimento.

Como exemplo, a resolução trouxe ao investidor a responsabilidade limitada ao capital investido – o que significa que, em um cenário de prejuízo, o cotista não corre mais o risco de ter que colocar dinheiro adicional para cobrir o rombo do fundo, um receio que afastava muitos investidores.

Outra mudança relevante foi o balanço de riscos entre gestora e gesto, dado que anteriormente a figura do administrador do fundo tinha um peso maior, ao passo que o gestor e tomador de decisões tinha uma responsabilidade diluída – cenário que mudou e, agora a regra deixa mais claro o que cada um faz e pelo que responde.

A normativa ainda abriu porta para fundos com alocação no exterior, antes mais restritos, e criou a estrutura de classes e subclasses.

Assim, um fundo que antes era como uma casa, agora passou a ser um prédio – esse com vários apartamentos, que são as classes.

Nesse contexto, cada classe pode ter uma estratégia de investimento diferente, com ativos distintos, e possui seu próprio CNPJ, mantendo seu patrimônio totalmente separado dos outros ‘apartamentos’.

Com isso, caso uma classe, um ‘apartamento’, tiver um problema grave e chegar a ter patrimônio negativo, não há contaminação de outras classes do mesmo fundo.

A resolução 175 da CVM então permite que as gestoras não precisem mais criar um fundo do zero, com toda a sua estrutura e custo, para lançar uma nova estratégia – agora podem simplesmente criar uma nova classe dentro do ‘prédio’ já existente.