Dona Anna Maria é uma mulher que gosta de manter a rotina. Vai ao cabeleireiro todas as segundas-feiras, para fazer as unhas e arrumar o cabelo. Veste um terninho cor-de-rosa às quintas e se transforma em voluntária num hospital. E às sextas-feiras, não perde a sessão de massagem. Mas engana-se quem avalia esta mulher de 61 anos por seus hábitos, digamos, triviais. O que absorve grande parte de seu tempo é colocar a mão na graxa. Literalmente. Há dois anos, ela assumiu a direção do mais antigo centro automotivo do País, a Rede Zacharias, uma empresa familiar com 48 lojas de troca de pneus espalhadas por Rio de Janeiro e São Paulo. E, mesmo sem nunca ter lido um
balanço, deu uma virada de 180 graus na companhia, demitiu
os executivos que tocavam o negócio, contratou uma diretoria feminina e se prepara para a maior revolução dos 69 anos da rede: abrir franquias Zacharias pelo País afora. ?Estamos na segunda fase do plano. Primeiro, saneamos a empresa, agora partimos para o crescimento?, conta à DINHEIRO.

A passagem de dona-de-casa para empresária ocorreu por acaso. Era 1999 e seu marido Adhmar, o então presidente da rede, ficou doente. Para não deixá-lo sozinho, Anna Maria fazia visitas semanais à sede da companhia no Centro de São Paulo. Sentava na sala da diretoria, atendia a telefonemas e dava dicas para melhorar o atendimento. Era muito pouco. A morte do marido em 2000 mudou de vez sua vida. No primeiro dia em que sentou na presidência, descobriu que não entendia nada do negócio. ?Não sabia trocar um pneu e nem faculdade tenho?, explica. Resolveu, então, assinar o primeiro documento como presidente da rede. Era um cheque para contratar um professor de economia. ?Tive aulas por sete meses?, diz. ?Ele me ensinou tudo. Até a ler balanços.? De posse de conhecimentos básicos, ela começou a agir. Um a um, os diretores foram sendo demitidos. E Anna Maria ia se cercando de pessoas de confiança. Empossou a filha, Anna Cláudia, como diretora comercial do grupo. O genro, Eduardo Lara Correia, virou diretor de vendas.
E uma amiga da família, Patrícia Stierli, assumiu a área financeira.
A empresária também jogou no acostamento uma parceria de 65 anos que tinha com a Goodyear. E a rede tornou-se revendedora exclusiva da Michelin.

Depois de trocar os pneus era preciso rebalancear a companhia. A Zacharias era uma rede de 54 lojas, algumas sem retorno, estava com a imagem desgastada e tinha 500 funcionários. O plano era simples: modernizar. Para alcançar este objetivo, Anna Maria informatizou a empresa, demitiu 20% dos funcionários e lançou uma série de serviços como a troca de óleo, de amortecedor e até inspeção veicular. Recentemente, resolveu se aventurar numa nova área: lojas exclusivas para caminhoneiros, chamadas Truck Centers. O primeiro foi inaugurado em São José dos Campos (SP). A procura foi tanta que, até 2003, a empresária pretende abrir outras duas lojas. Nada mais natural. Afinal, a Michelin, nova marca que representa, é dona de 35% do volume de vendas de pneus de carga do País. É certamente uma mudança de perfil. ?Só teremos retorno em dois anos?, calcula.

Se o novo serviço com caminhões ainda não se mostrou rentável, é uma questão de tempo. Mas Anna Maria já tem do que se orgulhar. Anualmente, a rede vem atendendo 200 mil carros e 24 mil caminhões. Ninguém fala em faturamento. Mas, num setor onde o tíquete médio é de R$ 250, basta fazer as contas. O faturamento do grupo orbitaria, por baixo, em R$ 56 milhões. O futuro da Zacharias? Ele pode ser resumido numa frase que a executiva costuma pregar nos corredores da empresa: ?Pneu é commodity, o que fideliza clientes é o serviço?. Em outras palavras, a rede pretende deixar para trás a fama de mera vendedora de pneus para se tornar uma faz-de-tudo debaixo do carro. A mudança faz sentido. Hoje, os pneus respondem por 46% do faturamento do grupo ? os outros 32% vêm da venda de peças e 21% são garantidos pelos serviços. Toda essa efervescência fica guardada em seu escritório. Quando deixa a garagem da Zacharias, Anna Maria ainda arruma tempo para mais uma tarefa. Entra no carro, ao lado do motorista, e visita as lojas da concorrência. ?Nada melhor do que eu para saber como estão os preços da concorrência?, brinca. Na vida da empresária, tudo mudou. Mas ela continua gostando de manter as rotinas.