Se no discurso oficial os assessores do presidente Lula indicam que as derrotas subsequentes do governo no Congresso Nacional são parte de uma democracia de coalizão, são as regras do jogo e engrandecem a discussão política, nos bastidores o tom é outro. Já são sete derrotas consecutivas no Congresso. Nem o crescimento do PIB, nem a popularidade acima da média do chefe da República, parecem funcionar como capital político para que o governo alcance vitórias. E se, em um primeiro momento, essa sequência de baixas só sinalizava que algo na relação entre os Poderes não ia bem, agora, com a agenda econômica precisando avançar antes das eleições municipais, rever a interface entre o Executivo e o Legislativo se tornou imperativo. E Lula precisará entrar no jogo para evitar uma goleada ainda maior.

•  Desde o ano passado, não foram poucas as vezes que o presidente Lula foi cobrado publicamente pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, para entrar mais na articulação política — atualmente chefiada por Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais).

Em todas as ocasiões, o presidente afirmou que melhoraria a interlocução com os parlamentares, algo que não aconteceu.

À Dinheiro, Arthur Lira afirmou que não há qualquer tipo de desentendimento ideológico com o governo, apenas um esforço para que o diálogo se aprofunde. “Não há pressão por emenda parlamentar ou chantagem”, disse. Segundo ele, a interlocução com o governo é boa, mas pode melhorar. “O interesse do Legislativo é melhorar as condições econômicas e sociais do governo.”

“Não somos uma casa que apenas carimba textos. queremos discutir e elevar a qualidade dos projetos apresentado pelo executivo. Este é o rito.”
Rodrigo Pacheco, presidente do senado

DERROTAS

Nos últimos seis meses, foram sete grandes perdas do governo na queda de braço com o Legislativo. Algumas delas da agenda de costumes, como o fim das saidinhas da população carcerária e o endurecimento do combate às fake news. Outras de cunho econômico, como o fim da desoneração da folha de pagamento e a MP do PIS e Cofins, que reduzia a oferta de crédito tributário. Para Andreas Soares Lima, especialista político e consultor da CCJ do Senado para assuntos econômicos, o calendário eleitoral coloca pressão no governo para acelerar a apresentação de pautas, mas também põe em risco a aprovação.

“O governo tem pulado etapas para garantir uma agenda mais dinâmica, com muitos textos correndo de modo concomitante. Mas os parlamentares interpretam que essa celeridade tira deles o espaço para o diálogo”, disse.

O caminho, segundo ele, é reforçar a imagem de Fernando Haddad, ministro da Fazenda, que tem sido arranhada nos últimos meses, justamente pelos parlamentares entenderem que a Fazenda tem pecado na comunicação política com o Legislativo. Depois disso, uma solução seria colocar o Lula na articulação frontal, ou seja, marcando mais encontros e se mostrando mais presente nas negociações por bancada e partido. “Isso pode ajudar, ainda não é tarde demais”, disse.

46%
Dos agentes da câmara votaram com o governo nos projetos levados ao plenário em maio

20
Derrotas para o governo nas votações de maio. ao todo foram 52 textos analisados

Para os próximos meses, o governo precisa:
regulamentar seis pontos da reforma tributária,
colocar em pé um novo plano para diminuir o déficit das contas públicas (seja aumentando a arrecadação ou cortando despesas);
avaliar medidas que envolvem desindexação da economia, em especial em commodities dolarizadas como o combustível e energia,
liberar recursos extraordinários para ajudar a reconstrução do Rio Grande do Sul,
aprovar medidas tributárias para colocar o Brasil em conformidade com as práticas da OCDE,
além de aprovar recursos para programas como o Mover de incentivo à indústria.

Em entrevista recente a jornalistas, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que trabalha em linha com as prioridades do governo, mas não descartou atrasos. “Não somos uma casa que carimba textos. Discutimos e melhoramos. Este é o processo”, afirmou.

Político dos bons, o presidente Lula sabe que precisa melhorar o apoio na base.

Um levantamento da consultoria Arko Advice, revelou que, em maio, apenas 46,47% dos deputados acompanharam a orientação do governo em votações na Câmara. Dos 52 textos votados em maio, o governo foi derrotado em 20, um número alto para um governo que, teoricamente, tem alianças de coalizão com mais da metade dos partidos políticos.

Nos governos petistas passados, o segundo mandato de Dilma Rousseff foi o que mais pesou na articulação política, e o resultado já conhecemos.

Apesar das similaridades entre os dois, um dinossauro da política brasileira, há anos no Senado Federal, fez à reportagem da DINHEIRO uma definição assertiva sobre as diferenças na articulação política conduzidas por Lula e Dilma Rousseff. “Enquanto a Dilma quebra, mas não dobra, o Lula dobra, mas não quebra.” Chegou a hora de Lula provar sua capacidade de flexibilização.