A Daslu está de volta, mas não mais como o reduto do luxo em moda e decoração. O retorno veio pelo caminho imobiliário. Arrematada em um leilão em 2022 pela Mitre Realty, incorporadora com foco no mercado de alto padrão, a marca agora batiza um condomínio de luxo nos Jardins, em São Paulo.

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“Houve uma pesquisa bem robusta para entender como a marca seria aceita no mercado, e teve uma resposta muito boa”, explica Renata Florenzano, sócia e conselheira-executiva da Daslu. “Quando falamos Daslu, falamos de marca, lifestyle, não só moda. Tem uma curiosidade pelo saudosismo. Existe uma memória afetiva”, diz. Por conta disso, não se descarta para um futuro próximo abrir licenciamento da marca para outros estados. “Estamos conversando com outras construtoras, nada ainda concreto, mas estamos abertos para esse processo”.

Daslu

As obras do novo empreendimento começaram em setembro, e 30% das unidades estão vendidas.  Uma delas, é propriedade da atriz Marina Ruy Barbosa, embaixadora da nova fase da marca. A Mitre aponta um Valor Geral de Vendas (VGV) aproximado de R$ 600 milhões do projeto, que está previsto para ser entregue em 2028, e opções de 114m² a 545m² (3 ou 4 suítes).

O morador do batizado Daslu Residences terá tudo o que o luxo pode oferecer, como projeto arquitetônico assinada pelo escritórios Königsberger Vannucchi e Anastassiadis Arquitetos, paisagismo de Benedito Abbud e uma série de serviços de conveniência de altíssimo padrão como concierge para realizar reservas e indicações, governança, reparos, instalações, lavanderia, alfaiataria, mudanças (preparação pré e pós-mudanças), além de serviço de ‘mordomia’, que auxilia na organização de bagagens e cuidados do apartamento na ausência do morador. “É pra tirar toda fricção da moradia. São serviços de hotelaria”, diz Florenzano.

Também são oferecidos serviços personalizados e curadoria na área de artes e viagens e experiências, como acesso prioritário a exposições de galerias de arte ou participação em clube de membros, e ainda experiências exclusivas em Inhotim, que começam já em 2026.

O Daslu vai além de um condomínio. O projeto foi pensando como um boulevard, que abrigará uma área comum de circulação aberta ao pedestre, com paisagismo, dois restaurantes – um deles com duas estrelas Michelin, simulador de golfe e academia.

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Estilo de vida como ativo

“O Daslu Residences representa um movimento que vem se intensificando no mercado de luxo: a integração entre moradia, hospitalidade e estilo de vida. Trata-se de uma nova forma de habitar, na qual o imóvel deixa de ser apenas um bem material para se tornar parte de um ecossistema de experiências que combinam conveniência, personalização e bem-estar”, avalia Cristina Proença, coordenadora da pós-Graduação em Negócios e Marketing de Luxo Contemporâneo da ESPM.

Proença destaca que em outros países, o mesmo movimento já se consolida em empreendimentos de luxo voltados ao estilo de vida. “Esse tipo de projeto oferece benefícios simbólicos e comerciais importante”, diz.

A professora lembra que, no caso da Daslu, existe um componente simbólico único, já que a marca faz parte da história do luxo no Brasil, sendo foi uma das responsáveis por aproximar o público brasileiro dos nomes de grandes grifes internacionais e por introduzir no país uma nova forma de consumir e desejar o luxo.

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“Reativar esse nome é, portanto, um exercício de ressignificação: recuperar o prestígio e a aspiração do passado, mas reposicionando-os dentro de uma nova narrativa, em que o luxo é menos ostentação e mais experiência, autenticidade e qualidade de vida”, aponta.

O ‘lifestyle Daslu’ se completa com alguns lançamentos que estão engatilhados, e que flertam com o passado varejista da grife. No próximo mês a marca inaugura um e-commerce, com oferta de produtos como a linha de fragrância para casa, com a essência característica da então loja, resgatada nessa nova fase, ou o espumante desenvolvido especialmente para a marca, pela Vinícola Luiz Argenta, de Flores da Cunha (RS).

“Ficamos impressionados”, conta Florenzano sobre a bebida. “Para um bom empreendimento não basta bom projeto; vai além do design. São serviços e conseguir customizar o que entendemos ser necessidade do cliente”. Como cliente, a executiva aponta um grupo como desde um jovem investidor ou jovem empresário que busca por esse perfil de serviços, até um público mais maduro, que quer também conveniência e comodidade.

Para ano que vem, também já está previsto o lançamento de linha de roupas de cama, mesa e banho da marca.

De templo do luxo a desfecho trágico

Fundada nos anos 1950, a Daslu virou símbolo do luxo e da exclusividade no Brasil. A marca foi criada pelas sócias Lúcia Piva de Albuquerque e Lourdes Aranha, daí o nome “das Lu”. Inicialmente funcionou em uma casa na Vila Nova Conceição, bairro de super-ricos de São Paulo, onde atendia apresentando grifes com exclusividade para o público de alta renda. Nos anos 1980, a empresária Eliana Tranchesi, filha de Lúcia, assumiu os negócios, até então, sob gestão familiar.

Foi sob o comando de Tranchesi que a boutique se tornou um templo (até mesmo na arquitetura) de grandes grifes internacionais no país, referência de sofisticação para a elite do país. A inauguração da imponente “Villa Daslu” em 2005, na Vila Olímpia, São Paulo, foi o auge da marca. O espaço de 17 mil metros quadrados reunia mais de 60 marcas e se tornou um ponto de referência mundial para o mercado de luxo, atraindo celebridades, milionários e políticos. No quadro de vendedoras, por exemplo, estava a filha do então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, Sofia Alckmin.

Pouco tempo depois, a Daslu foi alvo da Operação Narciso, desencadeada pela Procuradoria da República e Polícia Federal. As investigações revelaram um esquema complexo de fraudes fiscais, descaminho e sonegação de impostos na importação de mercadorias. O escândalo resultou na condenação de Eliana Tranchesi em 2009 a uma pena alta de prisão, embora ela tenha respondido em liberdade por um período enquanto recorria.

O abalo na imagem da marca, somado à crise financeira e ao crescente endividamento, fez com que, em 2010, a Daslu entrasse com pedido de recuperação judicial, com dívidas que chegavam à casa dos milhões de reais. Eliana Tranchesi, que chegou a ser presa novamente, mas foi solta por conta de um habeas corpus e do agravamento de um câncer de pulmão. Ela faleceu em fevereiro de 2012, aos 56 anos.

Em 2016, a Justiça decretou a falência da Daslu. Em 2022 a marca foi a leilão, arrematada por R$ 10 milhões pela Mitre Realty.

Em abril deste ano, a Globoplay anunciou que duas produtoras estavam desenvolvendo um documentário sobre a marca.