Pandemia, falta de semicondutores, marcas em debandada, preços ascendentes, vendas em queda. O mercado automotivo brasileiro enfrentou de tudo um pouco desde o advento da crise sanitária, em março de 2020. Já são dois anos marcados por incertezas e expectativas quase sempre frustradas. Da interrupção total da produção nas montadoras, por causa do distanciamento social, ao aumento dos estoques devido à redução da demanda. Fato é que o futuro da indústria automobilística em 2022 se desenha tenebroso diante de números recentes divulgados pela Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). A quantidade de emplacamentos no período entre janeiro e março foi a pior dos últimos 16 anos e ameaça as estimativas da entidade – e também da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) – de pouco mais de 2 milhões de unidades vendidas na temporada.

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Foram emplacados 374,5 mil automóveis e comerciais leves no primeiro trimestre. Uma queda de 25% em relação ao mesmo intervalo de 2021. Se comparados os respectivos meses, o estrago revela-se ainda maior. Não houve janeiro tão ruim nos últimos 14 anos (116,6 mil); fevereiro, então, sucumbiu na comparação com o mesmo mês nos últimos 17 anos (123 mil); e, nem mesmo março, impulsionado pela redução de 18,5% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), anunciada pelo governo federal, apresentou reação nas comparações anuais: pior dos últimos 18 anos, embora o resultado tenha sido superior ao de fevereiro, com 134,9 mil.

Apesar de a falta de semicondutores persistir e a normalização da situação estar prevista apenas para 2023, o mercado dá sinais de que a crise de componentes já não é o principal motivo para a redução das vendas. A elevação da taxa Selic, que impacta nos juros dos financiamentos, o crédito mais restritivo e o desemprego elevado tornaram-se vilões da indústria. E o cenário pode piorar no decorrer do ano dependendo das medidas econômicas que venham a ser adotadas pelo ministro Paulo Guedes para conter a inflação.

Outro agravante são os possíveis novos aumentos nos preços dos modelos, como já admitido por presidentes de montadoras no País, em razão, por exemplo, da alta nos custos logísticos e das matérias-primas. A aposta para atingir a meta de 2,3 milhões de emplacamentos em 2022, como ainda prevê a Anfavea, está nas vendas para o atacado, com destaque para as locadoras, que tiveram pedidos represados em 2020, quando foram adquiridas 360 mil unidades, e 2021, com 442 mil, para a renovação da frota.

A expectativa para este ano, segundo o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, é da aquisição de 600 mil carros pelas locadoras, mas o montante pode não ser alcançado devido às restrições na produção decorrentes da falta de componentes. “Nossa previsão é que o mercado se recupere principalmente a partir do terceiro trimestre”, disse. A Mercedes-Benz, por exemplo, anunciou férias coletivas a 5 mil colaboradores nas plantas de São Bernardo do Campos e Juiz de Fora, entre 18 de abril e 3 de maio, devido à escassez de peças. Um sinal de que as adversidades que afligem o setor estão longe de acabar. Ao menos no curto prazo.