11/08/2001 - 7:00
Não foram os mais de R$ 1,2 bilhão de dívidas com indústrias e bancos, nem o fato de ter colocado no olho da rua cerca de 12 mil trabalhadores com a falência do Mappin e da Mesbla. O empresário Ricardo Mansur acabou atrás das grades na semana passada porque decidiu caluniar a maior instituição financeira privada do País, o Bradesco. No dia 15 de setembro de 1999, já refugiado em Paris, na França, após a bancarrota de suas companhias, Mansur resolveu se vingar do banco que considera ser um dos maiores responsáveis por sua falência, ao não renovar empréstimos. Furioso, entrou em um cibercafé lotado de computadores, sentou-se em frente a um monitor e disparou pela Internet centenas de mensagens eletrônicas anônimas contra o Bradesco. Os e-mails, enviados a operadores do mercado financeiro e jornalistas do Brasil, afirmavam que o banco estava à beira da falência, com um patrimônio negativo de R$ 13 bilhões. Era mentira. O empresário esqueceu, no entanto, do boleto que assinou para usar o computador. Foi rastreado e agora paga caro pela brincadeira.
Após sete meses driblando na Inglaterra um mandado de prisão,
e de conseguir depois seu cancelamento ao desembarcar por aqui em outubro de 2000, Mansur ouviu na tarde da última terça-feira o que mais temia. A voz trêmula de Milton Rosenthal, um dos seus muitos advogados, anunciou que ele teria de se apresentar à sede da Polícia Federal de São Paulo para ser detido. ?Não acredito?, respondeu o homem que um dia sonhou ser o rei do varejo brasileiro e foi dono da franquia da Pizza Hut, de indústrias como a
Leco e do banco Crefisul.
A decisão judicial, expedida pelo Tribunal Regional Federal de São Paulo, foi ainda mais amarga porque, justamente agora, Mansur movimentava-se para abrir novos negócios. A lei de falências permite que, após dois anos de uma bancarrota, qualquer pessoa crie uma empresa. Mansur se fiava nesta brecha jurídica e até enviou representantes para estudar a abertura de uma loja no shopping center de Indaiatuba, no interior paulista. Só que agora os planos terão de ser adiados. Os apelos de Rosenthal não tiveram efeito sobre o juiz André Nabarrete, relator do mandado de prisão. O advogado afirma que o empresário demorou a se apresentar à Justiça no passado por estar ?muito deprimido e impossibilitado de viajar ao Brasil?. Não convenceu. ?O poder judiciário não pode ficar à mercê de diagnósticos pouco circunstanciosos e técnicos?, afirmou Nabarrete no documento fatal.
Portanto, não houve jeito. Mansur chegou cabisbaixo ao seu cárcere no final da terça-feira mesmo. Vestia uma calça de brim. Tentou fugir das câmaras de tevê ao se esconder atrás de um agente da PF. Em vão. Posteriormente, foi levado à sua cela, de seis metros de comprimento por seis de largura, ocupada por outros 19 detentos, como traficantes e falsificadores. Um contraste e tanto para quem freqüentava a corte inglesa e jogava pólo com o príncipe Charles.
De início, Mansur recusou a comida da prisão. ?Estou sem fome?, declarou a um dos agentes. Limitou-se a pedir um sanduíche. Posteriormente, acostumou-se às refeições do local. O pior viria
nos dias seguintes: um bando de 17 oficiais de Justiça foram à PF para entregar intimações de pagamentos de dívidas. Afinal,
agora ele tinha endereço certo e não podia fugir. Mansur
assinou com o próprio punho os autos de cobrança.
Visitas pessoais mesmo, só na quinta-feira 16. Dois amigos passaram alguns minutos com ele. O fato é que Mansur poderia facilmente ter evitado o transtorno. A procuradora Cláudia Cecília Fedeli, que investiga a falência do Mappin, lembra que nenhuma pessoa a princípio é detida por causa de dívidas. A exceção ocorre com pais que não pagam pensão de filhos. Não é o caso. O Ministério Público Federal cravou sua vitória ao argumentar que o empresário não merecia credibilidade, por ter se refugiado na Europa durante meses. A promotora Stella Scampini abraçou a causa do Bradesco e acusou o empresário de crime contra o sistema financeiro. Apesar da ação judicial envolver diretamente seu cliente, Sérgio Bermudes, advogado do Bradesco, declara que não ajudou a promotoria no pedido de prisão. Como jurista, alega que ?o Ministério Público tem a obrigação de promover qualquer ação pública. Difamar um banco tem conseqüências para toda a sociedade?. Algo é certo: a briga contra Mansur promete novos capítulos, com apelações dos dois lados. Mas o empresário terá que resolver problemas com inimigos para começar a sonhar em abrir um novo negócio.