Vista de cima, a Floresta Amazônica brasileira parece não ter fim. Em alguns pontos do sobrevoo, a impressão é que os 4.196.943 Km² cobertos de árvore (cerca de 40% do território nacional) formam um mar verde, tão denso, compacto e vasto que é quase inimaginável conceber que algo possa ser forte o suficiente para ameaçar sua existência. E é justamente essa imagem que o presidente Jair Bolsonaro vem usando para defender que algumas alterações na legislação ambiental brasileiras jamais teriam o poder de destruir o bioma. Durante um evento em Dubai, em novembro do ano passado, Bolsonaro chegou a dizer que a floresta está “exatamente igual a quando o [Brasil] foi descoberto”.

Com essas falácias, o governo e sua base de apoio vão apresentando um projeto aqui e outro ali para facilitar a derrubada de árvores. Se quando vistos do ponto de vista individual, cada um deles já traz algum grau de ameaça à floresta, é quase desesperador pensar no impacto que podem ter se todos forem colocados em prática.

Grandes mineradoras questionam projeto de exploração na Amazônia promovido por Bolsonaro

Mais um desses projetos “que jamais destruiriam as florestas, mas que ajudariam em muito à economia” ganhou as manchetes esta semana: avança na Câmara dos Deputados a proposta feita pelo deputado Juarez Costa (MDB-MT) de excluir o estado do Mato Grosso da Amazônia Legal, o PL 337/2022. Se for para frente, deve aumentar o desmatamento no estado em pelo menos 100 mil km², segundo estimativas do Observatório do Código Florestal. Isso seria correspondente a um estado de Pernambuco.

Outro projeto que deve ser julgado em regime de urgência graças à pressão direta feita pelo presidente da República é o PL 191/20 que regulamenta a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em reservas indígenas. De acordo com estudo conduzido por cientistas da Universidade de Queensland, caso aprovada, essa iniciativa coloca sob risco à integridade de quase 890 mil km² de floresta. Essa área corresponde à soma dos estados de Sergipe, Alagoas, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Paraíba, Santa Catarina, Amapá, Ceará e Paraná.

Feitas as contas, somente estas duas iniciativas somam cerca de 1 milhão de km² de floresta ameaçada. Há ainda que se considerar que incêndios e desmatamentos estão mais comuns neste governo por falta de fiscalização e de punição contra crimes ambientais. De acordo com o Mapbiomas, só em queimadas a floresta perdeu mais de 300 mil km² nos dois primeiros anos de governo (2019 e 2020) e o desmatamento saiu de um patamar de menos de 4 mil km² por ano para mais de 10 mil km². Ou seja, o fogo destruiu uma área equivalente a Rio Grande do Sul e Tocantins, enquanto a derrubada de árvores representou duas vezes o território do Distrito Federal.

Coloque a área de todos estes estados sobre um mapa da Amazônia e se ainda assim restar a impressão que há floresta para dar e vender, lembre-se que na medida em que vai sendo destruído, o bioma se torna menos resistente e pode chegar a um ponto de irreversibilidade no qual perderá parte significativa de sua cobertura e se tornará um ecossistema mais aberto, como o cerrado. Vale o adendo que defender a floresta não é ir contra o desenvolvimento da economia. O que precisa ser feito é um projeto institucional único de como o Brasil irá aliar suas riquezas: a produção agropecuária e o uso dos recursos naturais que a floresta proporciona.

 

Legenda: Os 4 milhões de floresta estão ameaçadas por projetos que flexibilizam a existência da Amazônia legal e a legislação ambiental brasileira (Crédito: EVARISTO SA/AFP)