O ano era 2006. Em uma tarde ensolarada, o economista e banqueiro André Lara Resende, um dos formuladores dos Planos Cruzado e Real, ex-presidente do BNDES e mentor econômico da candidata à Presidência Marina Silva, entrou na empresa que dava seus primeiros passos em um apertado escritório na avenida Faria Lima, em São Paulo. Ele usava o uniforme dos endinheirados de estilo jovial-frugal (tênis, calça jeans desbotada e camiseta branca). Naquele dia estava tão inspirado quanto a escritora americana Dorothy Parker, que dizia que todas as manhãs escovava os dentes e afiava a língua.

“Isso aqui não vai dar certo”, disparou diante do incrédulo olhar dos jovens sócios que, animados, acabavam de contar-lhe seus planos. O Ph.D. em economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), que foi diretor de política monetária do Banco Central entre 1985 e 1986 e sócio de grandes bancos de investimento como o Garantia e o Matrix, continuou, implacável: “Quando precisarem crescer, não vão conseguir vencer os entraves burocráticos do Estado brasileiro e terão de usar boa parte dos ganhos para pagar impostos e taxas”. Em seguida, o tiro de misericórdia.

Lara Resende apontou para a jovem secretária que assistia a tudo de olhos arregalados e disse que dali a um ano ela iria mover um processo trabalhista contra os donos da empresa “porque a cadeira em que está sentada não é ergonômica e ela vai ter um problema de coluna”. Havia naquela cena mais do que previsões alarmistas de um experiente homem das finanças, famoso pelo seu pessimismo cósmico; existia uma dose de rancor, de mágoa. Não pelos empreendedores, mas pela burocracia, pela regulação do País onde eles vivem. Era nesse ambiente de negócios do Brasil que Lara Resende não acreditava, não confiava e a quem dirigia o seu desprezo.

Um país que, naquela época, ele via da janela da sua confortável residência em estilo vitoriano na Evelyn Gardens, em Chelsea, um dos bairros mais caros e sofisticados de Londres, na Inglaterra, onde um imóvel não custa menos do que dois milhões de libras (R$ 8 milhões). Foi para lá que ele partiu algum tempo depois de ter sido demitido da presidência do BNDES, em 1998, quando estourou o escândalo dos grampos telefônicos em que Lara Resende e o ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros discutiam formas de beneficiar o banco Opportunity, de Daniel Dantas, no leilão e privatização da Telebras.

Em 2009, ele (e todos os envolvidos) foi absolvido pela Justiça da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal. Na Inglaterra, Lara Resende viveu como fellow scholar da Universidade de Oxford. Dividia seu tempo entre os ares acadêmicos de uma das mais tradicionais universidades do mundo e as cavalgadas em cavalos puro-sangue no Hyde Park, o mais famoso parque de Londres. Cavaleiro de salto, amador, ele costuma participar das principais provas brasileiras e internacionais.

O gosto pelos cavalos acabou aproximando-o do cavaleiro olímpico Doda Miranda e de sua esposa, Athina Onassis, herdeira do mítico bilionário grego Aristóteles Onassis. Lara Resende, que é sócio de uma gestora de recursos no Brasil, a Lanx Investimentos, passou a administrar parte da fortuna de Athina. Atualmente, ele divide seu tempo entre Londres, São Paulo e sua quinta em Portugal. Em São Paulo, ele vive em um dos edifícios mais caros da cidade, na região do Morumbi, onde os apartamentos de mil metros quadrados chegam a valer até R$ 20 milhões.

PRÊMIO JABUTI Carioca de nascimento e paulistano por adoção, ele é filho do escritor Otto Lara Resende, e aparece como finalista do prêmio Jabuti, o mais importante da literatura brasileira, na categoria economia, com seu livro Os limites do possível (Companhia das Letras). Lara Resende é coautor, junto com o economista e ex-presidente do Banco Central Pérsio Arida, de um dos textos de economia mais estudados no mundo todo, o Documento Larida, como ficou conhecida a proposta de implantar uma unidade monetária (a URV, sigla de Unidade Real de Valor) para desindexar a economia, considerada a chave do sucesso do Plano Real lançado em 1994.

Aos 63 anos, é pai de quatro filhos, sendo três com a primeira esposa, a fotógrafa Claudia Jaguaribe, filha do sociólogo e escritor carioca Hélio Jaguaribe, e a caçula com a atual mulher, Beatriz. Conhecido pela obsessão em não expor sua intimidade, Lara Resende foi procurado pela reportagem de DINHEIRO e declinou educadamente. De fato, o economista consegue se blindar da curiosidade alheia. Um dos poucos ambientes em que fica mais à vontade é no circuito hípico. Foi nesse universo que ele conheceu a amazona Beatriz Rondon da Rocha Azevedo, que assina Lara Resende desde 2005, quando se casaram.

Sócios da Sociedade Hípica Paulista, os dois costumam participar das principais competições do País, geralmente na mesma equipe. Atualmente, ele monta o cavalo puro-sangue Pink Floyd de Maibel e Beatriz salta com o Wall Street ou o Corradino. Os animais pertencem ao haras dos Lara Resende, o Makalu, que faz parte da Makalu Participação e Investimentos Ltda., empresa que reúne o patrimônio e os negócios do economista. O Haras Makalu foi construído há cerca de cinco anos na Quinta da Baroneza, um dos condomínios mais luxuosos do Brasil, que fica entre as cidades de Itatiba e de Bragança Paulista, no interior de São Paulo.

O condomínio reúne o melhor do pensamento voltado exclusivamente para o lazer e conforto de seus privilegiados proprietários – banqueiros, grandes empresários e altos executivos de multinacionais –, cujas casas espetaculares estão distribuídas numa antiga fazenda da família Oscar Americano: em uma área de dez milhões de metros quadrados, foram reservados quatro milhões de área verde, sendo dois milhões só de Mata Atlântica nativa. Cada lote de três mil metros quadrados custa cerca de R$ 1 milhão.

Calcula-se que o haras Makalu tenha cerca de 40 baias para acomodar os cavalos de Lara Resende, como Condor C, Moon Mail, Eskadron e Kiowa Des Isle, entre outros. Discreto como o dono, o haras fica em uma clareira cercada por mata preservada e fechada. Tão fechada que é impossível avistar de fora o que existe lá dentro. Só mesmo o seleto grupo de amigos dos Lara Resende atravessa os portões do Makalu, nome que remete à quinta maior montanha do mundo, bem próxima do Monte Everest, na Cordilheira do Himalaia. Mas também é possível encontrar os Lara Resende no Clube Hípico da Quinta da Baroneza sempre que há alguma prova ou competição.

Viajar pelo mundo para assistir aos eventos de hipismo é um dos hábitos do casal. Lara Resende e Beatriz passaram o mês de julho de 2011, por exemplo, acompanhando várias provas, como o Global Tour em Chantilly, na França, e o CHIO Aachen, na Alemanha, o torneio mais tradicional de hipismo do mundo. Nesse caro universo, o preço dos cavalos pode chegar até as alturas. Entre um milhão e três milhões de euros é o valor dos animais mais premiados do mundo. Mas isso não é exatamente problema para um homem acostumado a lidar com cifras que ultrapassam os seis dígitos.

Lara Resende faz parte do grupo de economistas-banqueiros que entre os governos de Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso se alternaram em cargos públicos e bancos de investimento, ao lado de Pedro Malan, Edmar Bacha, Pérsio Arida e Luiz Carlos Mendonça de Barros. Foi um dos fundadores do banco Matrix – junto com Mendonça de Barros, entre outros – no início dos anos 90. Ao lado do Garantia, do Pactual e do Icatu, o Matrix ficou conhecido na época como um dos mais agressivos bancos de investimento do Brasil. E seus sócios ganharam muito dinheiro no mercado financeiro brasileiro. Em 1997, os fundos de investimento do Matrix chegaram a um patrimônio de quase US$ 2 bilhões.

Formado em economia pela PUC-RJ e considerado um dos alunos mais brilhantes do professor e ex-ministro Mário Henrique Simonsen, Lara Resende queria mesmo era ser engenheiro. “Nunca pensei em estudar economia. Preparei-me sempre para a engenharia. Se não me engano, foi a leitura de A história da riqueza do homem, de Leo Huberman, alguns meses antes do vestibular, que me levou para a economia”, contou Lara Resende durante o seu discurso de agradecimento pelo prêmio de Economista do Ano concedido pela Ordem dos Economistas do Brasil, em 2006.

DUBLÊ DE PILOTO Amante da velocidade, que já lhe rendeu vitórias em importantes corridas, como os 500 Quilômetros de Interlagos, em 1997, Lara Resende também é um dos sócios-fundadores do Clube do Porsche no Brasil. O valor dessas portentosas máquinas alemãs pode variar entre R$ 800 mil e R$ 1,5 milhão. Esses preços aumentam caso o carro tenha de ser preparado para as pistas. Em 1998, os pilotos Lara Resende, Regis Schuch, Flávio Trindade e Maurizio Sandro Lara disputaram a prova de Daytona, nos Estados Unidos, dirigindo o Porsche 911 GT 2. Eles chegaram em quarto lugar em sua categoria e em 21o lugar no geral, num total de 74 carros que disputaram a corrida, desbancando máquinas como a Ferrari 333, um dos protótipos de maior sucesso já construído pela montadora italiana.

Atualmente, Lara Resende corre na categoria Porsche Challenge em autódromos tradicionais como o de Estoril, em Portugal, onde aconteceu a abertura do Porsche GT 3 Cup Challenge Brasil em 2011. Ele também se diverte pilotando carros antigos. Em 2013, por exemplo, o economista ficou em quarto lugar com o seu carro Lotus 26R, uma relíquia que usou na famosa Historic Race Car Festival, em Sonoma, na charmosa região de vinhos de Napa Valley, Califórnia. Quem conhece Lara Resende jurava que seria difícil vê-lo trocar o capacete de piloto de corrida ou de cavaleiro hípico por um quepe de comandante de qualquer cargo público no Brasil.

Isso mudou quando Guilherme Leal, um dos donos da Natura e que foi candidato a vice-presidente na chapa de Marina Silva, na campanha de 2010, fez a aproximação dos dois. Leal é amigo pessoal de Lara Resende. Os dois fazem parte da “turma da Amauri”, grupo de poderosos banqueiros e empresários que têm escritório nos arredores da rua Amauri, na região do Itaim Bibi, em São Paulo, e costumam almoçar juntos nos restaurantes badalados do bairro. Lara Resende já vinha dizendo publicamente que se identificava com a nova visão de desenvolvimento da então candidata a vice-presidente, mas foi quando ela assumiu o lugar de Eduardo Campos, que morreu no trágico acidente aéreo em 13 de agosto deste ano, que ele desembarcou com tudo na campanha da candidata do PSB.

Ao lado do acadêmico Eduardo Gianetti da Fonseca, Lara Resende é o principal assessor econômico de Marina. O pensamento atual dele sobre o modelo econômico encontrou eco no discurso da candidata à Presidência ao afirmar que o crescimento do consumo material está próximo de seu limite em todo o mundo. Ele sugere como um dos caminhos a defesa do meio ambiente a partir da redução do papel do Estado, combinado com forte reajuste fiscal. Isso soa como música aos ouvidos dos empresários e banqueiros que apoiam Marina. Nem parece o mesmo Lara Resende que, anos antes, quase fez dois jovens empresários desistirem de continuar empreendendo no Brasil.