YVES SAINT LAURENT, UM dos grandes estilistas do século XX, era mestre em chamar a atenção da mídia. Em 1966, transformou o smoking, um traje tipicamente masculino, em uma peça do vestuário feminino. Em 1971, posou nu, como veio ao mundo, para anunciar o seu perfume Homme. Na década de 90, Saint Laurent também virou notícia quando teve de se tratar devido ao alcoolismo e quando deixou o dedal e a tesoura por ter vendido sua marca ao grupo Pinault Printemps Redoulte (PPR) por US$ 1 bilhão. Agora, mesmo depois de ter morrido em 1º de junho passado, ele está de volta aos holofotes. Motivo: na semana passada, a casa de leilões Christie’s apresentou o acervo de arte, que pertencia ao estilista e a seu companheiro, Pierre Bergé, que será vendido de 23 a 25 de fevereiro de 2009, no museu parisiense Grand Palais. É, sem dúvida, uma das maiores e mais valiosas coleções particulares do mundo, avaliada pela casa de leilões entre 200 milhões de euros e 300 milhões de euros (US$ 292 milhões a US$ 440 milhões). “Yves está morto. Essa coleção não significa mais mesnada. Não vou continuar com isso”, disse Bergé durante a apresentação. Para o mundo da arte, entretanto, essas obras de arte têm um significado imensurável. Não é para menos. O acervo inclui telas de mestres como Henri Matisse (1869-1954), Paul Cézanne (1839-1906) e Pablo Picasso (1881-1973).

Ao longo de 50 anos, Saint Laurent e Bergé reuniram estilos, cores e movimentos artísticos como poucos colecionadores fizeram. O acervo adornou o hall de entrada, salas e a biblioteca do apartamento em que Saint Laurent viveu desde os anos de 1970, localizado na rua Babylone, em Paris, região cercada por prédios históricos. Algumas peças também fizeram parte do Chatêau Gabriel, na Normandia, comprado pelo casal em 1983; e da casa em que Bergé passou a morar, adquirida no fim dos anos 80, em Paris. “É realmente uma experiência única descobrir tantos trabalhos de magnitude histórica em condições excepcionais”, afirma Thomas Seydoux, chefe internacional do Departamento de Arte Impressionista e Moderna da Christie’s. Há antigüidades, pinturas e gravuras do século XIX, peças asiáticas raras, arte decorativa e mobília e objetos europeus. Uma poltrona da designer irlandesa Eileen Gray (1878-1976) foi avaliada em 3,5 milhões de euros (US$ 5,1 milhões); já uma escultura em bronze da China do século XVIII pode custar 10 milhões de euros (US$ 14,6 milhões). Mas o lote mais desconcertante é o que inclui os quadros de Matisse, Cézanne e Picasso.

Estima-se que um dos quadros de Picasso, batizado de Instrumentos musicais em uma mesa, atinja 40 milhões de euros (quase US$ 59 milhões). Outra obra que chama a atenção dos colecionadores é uma tela de Piet Mondrian (1872-1944). Avaliada em 12 milhões de euros (US$ 17,5 milhões), ela inspirou um dos mais conhecidos modelos de vestidos de Saint Laurent, o Mondrian. De acordo com Capucine Milliot, relações-públicas da Christie’s em Paris, a experiência está sendo única para todos. “Estamos muito entusiasmados porque esta é uma coleção especial”, diz. “Todos os especialistas da casa estão enlouquecidos.”

O leilão é uma ação conjunta com a casa parisiense de leilões Pierre Bergé & Associados, que, segundo Capucine Milliot, “se uniu à Christie’s, para que o leilão tivesse uma grandiosa divulgação”. Saint Laurent deixou sua parte da coleção para a Fundação Pierre Bergé-Yves Saint Laurent, que mantinha com o companheiro. Desde então, Bergé decidiu leiloar todo o acervo e doar o dinheiro arrecadado a uma nova instituição que pretende fundar, visando a pesquisas científicas médicas e à luta contra a Aids. O tradicional museu parisiense Grand Palais foi escolhido para sediar a venda porque a sede da Christie’s não teria espaço suficiente. Conhecido por seu excelente gosto e por uma exigência além dos padrões, Yves Saint Laurent queria que sua coleção criada em parceria com Bergé refletisse seus interesses pessoais. “A qualidade é o único critério que nos guia”, afirmou certa vez. Para Bergé, que permaneceu como herdeiro da coleção, as obras agora têm de circular no mercado. “Eu espero apenas que as pessoas as amem tanto quanto eu e Saint Laurent amamos.”