Da janela de seu antigo escritório em Chamonix (França), François Dewitte, 36 anos, diretor da rede francesa de lojas de material esportivo Decathlon, tinha uma visão privilegiada dos alpes franceses, onde ergue-se majestoso o Monte Branco. Fanático por alpinismo, Dewitte escalou esse monte mais de 10 vezes e de lá desceu sempre de um modo inusitado: saltando de parapente ou equilibrando-se sobre um par de esquis, por exemplo. Há dois anos que a neve não faz parte de seu dia-a-dia. Desde então, seu espírito de aventura e sua capacidade administrativa vêm sendo usadas para desbravar o mercado brasileiro. Dewitte foi o escolhido para cuidar da expansão da Decathlon por aqui. O primeiro passo será dado na quinta-feira 9, com a inauguração de uma megaloja de 3,2 mil metros quadrados no Morumbi (região nobre da Zona Sul de São Paulo). Até então, os gauleses tinham apenas uma loja-piloto em Campinas (interior de São Paulo). A nova unidade, na qual foram gastos R$ 14 milhões, é apenas uma pequena parte do que eles pretendem no Brasil. ?Vamos abrir três lojas em 2005, elevando esse número para 10, a cada ano, a partir de 2006?, contou ele à DINHEIRO. Sediada na cidade de Lilly, a Decathlon é uma gigante que conta com 330 filiais, fatura US$ 3,5 bilhões ao ano e pertence ao Grupo Leroy Merlin (especializada no segmento faça-você-mesmo). Nasceu em 1976 com a ambição de ser uma rede diferente. A começar pelo formato das lojas, que medem até 12 mil metros quadrados. Cada uma das unidades vende acessórios para no mínimo 50 modalidades. Todos os 27 mil funcionários praticam algum tipo esporte e nenhum deles ganha comissão individual por venda. Lá, é proibido empurrar mercadorias ?goela abaixo? do cliente. ?Queremos que os consumidores comprem o equipamento que melhor atende às suas necessidades?, diz Dewitte.

Outro atributo da Decathlon é a sua política agressiva de preços. Para conceder descontos entre 20% e 40% a companhia criou sete famílias de produtos (Quechua, Tribord, Kipsta, Domyos, Inesis, Geologic e Decathlon Cycle). Elas cobrem desde artigos para fitness (Domyos) até caça submarina (Tribord). A produção fica a cargo de empresas terceirizadas em 18 países, incluindo Japão, França, Espanha, México e Brasil. As primeiras encomendas a fabricantes brasileiros ocorreram em 1996, quando a Decathlon nem pensava em fincar a bandeira por aqui. ?Na época já conhecíamos a competência da indústria local?, destaca Dewitte. As marcas próprias respondem por metade das vendas e convivem em harmonia com grifes como Nike, Reebok e Puma. Uma boa mostra disso foi dada por Luciano Kleiman, diretor da Adidas do Brasil, que saudou a expansão da Decathlon: ?É uma boa notícia para o mercado?, disse ele. Quem não deverá gostar muito é a mineira Lojas Centauro, pioneira no conceito de megaloja de esportes.

Diferente também é o processo de concepção e aprovação dos produtos. A primeira etapa é o desenho e a escolha do material, a cargo de uma equipe de 250 engenheiros e designers. Adaptações e possíveis correções são feitas durante as missões-teste, que englobam atletas, funcionários e clientes, enviados para ecossistemas apropriados para a avaliação de cada item. São feitas 100 expedições desse tipo por ano, envolvendo nomes como Karine Ruby, medalhista olímpica de snowboard, e os integrantes da Equipe AG2R de Ciclismo, campeã de várias etapas do circuito profissional na Europa. Os brasileiros também já deram sua contribuição. A linha de chuteiras Kipsta ficou mais leve para atender às sugestões dos clientes locais. O próximo passo será a escolha de uma região do País, com pista para testar novos equipamentos de trekking.