Apaixonado por aventuras, o francês Cedric Burel diz conhecer o Brasil de Norte a Sul, seja praticando kitesurf em alguma praia do litoral brasileiro ou fazendo montanhismo na Chapada dos Veadeiros, em Goiás, onde esteve pouco antes da pandemia. A maratona de Burel no País não percorre apenas destinos paradisíacos, mas também seu escritório na Avenida Paulista, em São Paulo. O executivo assumiu, há cinco anos, o comando das operações da Decathlon Brasil, a segunda maior varejista de artigos esportivos do País, com 41 lojas, atrás apenas da mineira Centauro, com 211 unidades.

Como todo esportista, Burel afirma que está pronto para o desafio de fazer a Decathlon recuperar o fôlego perdido durante a pandemia, quando todas as lojas tiveram de ser fechadas por cerca de cinco meses. “Agora, com todas as unidades reabertas, vamos lançar nosso próprio marketplace, ampliar o leque de produtos trazendo 100% do nosso mix, e continuar com a abertura de lojas físicas”, afirmou o CEO. Até o final deste ano a rede varejista vai dar início à venda de produtos de segunda mão e ao aluguel de produtos com a possibilidade de compra no modo leasing, além de ampliar a participação da frente de seguros, iniciada em novembro do ano passado. “Tudo isso faz parte do processo de escutar os esportistas e facilitar a vida deles”.

Essa empolgação é justificada, segundo ele, pelo potencial de crescimento da multinacional no Brasil. A chegada ao País aconteceu há 20 anos e o mercado brasileiro segue entre os principais da companhia, principalmente por seu tamanho e pela força da prática esportiva. Mas o fator geográfico é também um desafio. Com presença consolidada nas regiões Sul e Sudeste, o plano é reforçar essa atuação com novas lojas e entrar no Norte e Nordeste, com inaugurações em Manaus, Fortaleza, Recife e Salvador. A meta da companhia é abrir cerca de oito lojas por ano e alcançar, nos próximos três anos, 80 lojas no País.

Outro fator importante para o otimismo em relação ao mercado brasileiro foi a mudança de comportamento do consumidor durante a pandemia. “Enquanto as lojas ficaram fechadas, o faturamento digital foi multiplicado por cinco”, disse Burel, sem revelar os números. Segundo o executivo, a operação digital, que antes representava entre 5% a 7%, passou a ser responsável por 15% das vendas. “Os números ainda são modestos, mas o objetivo é continuar crescendo digitalmente.”

Em um mercado cada vez mais competitivo digitalmente, o plano da Decathlon é ampliar a presença em canais digitais fechando parcerias, como a recém-lançada com a B2W, mas também seguindo seu próprio rumo ao lançar, até o final deste ano, seu marketplace próprio. “Vamos trabalhar com parceiros sem perder nosso DNA que é o esporte”, afirmou o executivo francês.

LÍDER DE VENDAS Itens de montanhismo e acampamento lideram vendas nas lojas brasileiras. (Crédito:Marco Ankosqui)

Com o objetivo de se tornar um marketplace do esporte, a empresa vai trazer todo seu portfólio de produtos, com itens que hoje não estão disponíveis no País por falta de espaço nas lojas ou pela imaturidade do segmento, como o mercado de barco a vela, que começará a ser comercializado pela rede varejista no Brasil. Essa ampliação do mix de produtos vai acontecer nos próximos dois anos. “O que mudamos de estratégia é trazer equipamentos avançados que serão vendidos exclusivamente on-line e que atenderão toda a categoria”, disse Burel.

Para dar suporte a esse crescimento, a Decathlon mais que dobrou seu espaço de armazenamento com a mudança do Centro de Distribuição (CD) para a cidade de Barueri, em São Paulo. Com 65 mil m2, o espaço também foi automatizado com a proposta de facilitar a produtividade. O próximo desafio é reduzir pela metade o prazo de entrega dos produtos, que hoje é de três a quatro dias.

INOVAÇÃO O comportamento do consumidor mudou, mas a escolha por um atendimento direcionado e exclusivo se manteve. Com 100 mil funcionários no mundo, 2 mil deles no Brasil, a Decathlon aposta em vendedores esportistas, formados nos segmentos que atuam. Por isso, a rede varejista manteve o atendimento por WhatsApp, iniciado durante o isolamento social. De abril até junho deste ano, mais de 45 mil atendimentos foram realizados. Mas essa relação de proximidade começa bem antes das vendas. Aposta da multinacional, as marcas próprias podem ser produzidas no país de atuação e, em alguns casos, resultar em produtos adaptados. No Brasil, a produção chegou antes mesmo da primeira loja, em 2001. Hoje, são de 50 a 80 parceiros. “É um processo em expansão, agora reforçado pelo câmbio, que incentiva a aceleração de parcerias”, disse o CEO.

Essa proximidade com o consumidor é um diferencial importante para alavancar a marca. É o que afirma a especialista em varejo Flávia Pini. “Quanto mais ele conhece esse cliente, quanto mais customizado é o atendimento, mais ele vende e amplia a penetração no mercado”, afirmou Flávia.

Segundo levantamento do Statista, a receita global da Decathlon caiu 8% em 2020 no comparativo com o ano anterior, para US$ 11,4 bilhões. Sem abrir dados da receita no Brasil, Burel disse que o impacto foi reduzido pela maior preocupação dos brasileiros com a saúde física e mental. No período, a demanda por itens fitness dobrou e, no caso da ioga, chegou a triplicar. Mas outra demanda também surpreendeu: bicicletas. Elas também protagonizaram outro momento importante para a companhia. Em novembro, a Decathlon lançou o B-On, serviço de seguro de bicicletas que hoje contabiliza 470 contratações. Com tanta novidade, a adrenalina no trabalho de Cedric Burel parece só ter começado.