Maior fabricante mundial de computadores pessoais, a gigante americana Dell tem uma vitória a comemorar esta semana no Brasil. Pela primeira vez em seis anos de presença no mercado nacional, a companhia deverá assumir a primeira posição nas vendas de laptops no País, superando a tradicional líder Toshiba. Não se espante, porém, se a empresa ? que também comanda o mercado de servidores ? em alguns anos vier a ocupar posição de destaque na área de impressoras ou mesmo em nichos do setor de eletrônicos. Sim, a marca Dell deve desembarcar em breve em empresas e lares brasileiros estampada em produtos que viraram febre recente de consumo, como os populares tocadores de MP3 ou as sofisticadas TVs de tela plana. A data de lançamento dos aparelhos Dell para ver e ouvir no Brasil ainda não está definida, mas a estratégia, sim. ?Olhamos para os mercados, para os diversos produtos e vemos muitas áreas em que podemos crescer?, afirmou o fundador e presidente Michael Dell à DINHEIRO durante um evento para a mídia latina na sede da empresa, em Round Rock, no estado americano do Texas (leia entrevista ao lado). O plano da Dell é abrir cada vez mais frentes de negócios em áreas de maior rentabilidade, como a prestação de serviço para empresas. Pouco antes, tinha sido anunciado que os resultados da empresa no terceiro trimestre de 2005 ficariam abaixo das expectativas.

O jovem bilionário de 41 anos de idade não se abalou. ?Gostaríamos que nossos números crescessem mais rápido? É claro. Mas isso não é assim. O que importa é que, apesar de os números não crescerem como no passado, continuam crescendo?.

A frase reflete exatamente a posição da Dell: uma empresa muitíssimo agressiva, em qualquer mercado que atue, mas não a qualquer preço. Dona de 18% do mercado mundial de PCs ? com 9,5 milhões de unidades vendidas no terceiro trimestre, segundo a consultoria IDC ? a empresa ocupa apenas a segunda posição no Brasil. Fez de tudo para ganhar mercado, inclusive usar o peso de sua marca global para pleitear, com as concorrentes, a redução da carga tributária para fazer frente ao mercado cinza, o dos fabricantes que atuam na informalidade.

A iniciativa deu resultado. O mercado cinza, que no segundo trimestre de 2005 respondia por 74% dos 5,2 milhões de PCs vendidos anualmente no Brasil, caiu para 65% nos últimos três meses, graças à redução do PIS e da Cofins. Na Dell, essa mudança refletiu-se em aumento de participação de mercado. No segundo trimestre, 4,6% dos PCs vendidos no Brasil saíram da fábrica da Dell no Rio Grande do Sul que, há um mês e meio ganhou seu segundo turno, em função das exportações para a América Latina e África do Sul. Para o terceiro trimestre, até mesmo a concorrência esperava seu avanço. Em contato direto com o consumidor, graças a seu modelo de vendas em que não usa intermediários, a empresa tem oferecido modelos mais simples e baratos ? na semana passada, um Dell Desktop Dimension 3000, sem monitor, podia ser comprado pela internet por menos de R$ 1,2 mil, em 12 vezes no cartão de crédito.

Valor atraente para o mercado de 18,5 milhões de famílias brasileiras que ganham mais de três mínimos e que ainda não têm computador em casa. Mas nem tanto. A Dell decidiu não aderir ao PC Cidadão, o programa de PCs populares do governo. Hoje, há quase 15 concorrentes da empresa inscritos no programa. A Dell sabe que, em função do seu modelo de negócios, longe do varejo, não tem a mesma força que seus concorrentes para vender computadores mais simples a pessoas de menor poder aquisitivo. Presente nas grandes redes varejistas, a Positivo, líder de mercado com 6,6% de participação, por exemplo, está lançando o PCTV, computador de menos de R$ 2 mil que funcionará também como TV, com entrada para cabo e controle remoto. ?Será o único eletrodoméstico do cômodo?, afirma Hélio Rotenberg, diretor da Positivo Informática.

?Queremos participar da inclusão digital, mas com lucro?, afirmou à DINHEIRO Terry Kahler, vice-presidente e gerente-geral para a América Latina da Dell. Com os PCs ? que Michael Dell montava em seu alojamento na universidade ao criar a companhia ? virando commodities e reduzindo margens dos fabricantes, a opção da empresa foi se voltar preferencialmente para os clientes corporativos ou de maior poder aquisitivo. Perspectiva, aliás, que persegue em todo o mundo. Com um plano de atingir US$ 80 bilhões em faturamento ao ano até o final da década, a Dell busca aumentar suas vendas em 80%, em outras áreas. Já vendidas nos Estados Unidos, as TVs de alta definição, por exemplo, ainda são pouco significativas dentro do balanço da companhia. Mas seu mercado global é estimado em até US$ 30 bilhões anuais. Já entre os clientes corporativos, os resultados têm sido expressivos. Para conquistá-los a Dell montou áreas como uma central de atendimento em Round Rock. Ali, numa parede gigantesca, são mostrados canais de notícia e de previsão de tempo, bem como os atendimentos feitos minuto a minuto a seus clientes. Num grande mapa via satélite e atualizado em tempo real, é possível localizar cada um desses clientes e o tipo de problema que está tendo. Em casos de grandes crises, como no ataque ao metrô londrino ou durante o furacão Katrina, foi esse sistema que manteve funcionando ininterruptamente os sistemas de clientes da Dell. Neste mês, a Positivo anunciou sua entrada no mercado corporativo no Brasil, com o lançamento de servidores e computadores específicos. Mas com trunfos como essa central, a Dell se sente segura nos mercados de maior rentabilidade. ?Ninguém roda uma planilha num servidor?, afirma Raymundo Peixoto, gerente-geral da Dell no Brasil. ?Clientes corporativos querem segurança e bons serviços e isso temos a oferecer?.

Inclusão, sim, mas com lucro

Pressionado pelos acionistas, às vésperas da divulgação de resultados abaixo do esperado, Michael Dell mostrou como pensa: computadores populares sim, mas desde que dêem lucro.

Nicholas Negroponte, do MIT, acaba de lançar um programa de computadores populares no Brasil. Eles concorrem com a Dell?
Há alguns anos, Nicholas falava desse programa com computadores a US$ 5. Agora, os computadores já custam US$ 100. Acho que é inflação! Na verdade, já temos computadores de US$ 100, mas são os que não queremos mais usar.

Por que?
Deve-se ser muito cuidadoso com as expectativas que se vendem. É fácil vender computadores a US$ 100, mas aqui cabem várias perguntas. Muitos desses equipamentos não são terminais, mas apenas mostram informação obtida em algum outro lugar. Para dispor dessa informação, é necessário algum tipo de infra-estrutura que permita a conexão em alta velocidade. Mas há isso nos países do terceiro mundo? Outro desafio é que nem todo aplicativo funciona por esse meio. Além disso, por que um computador custa mais de US$ 100? Porque as fábricas e o custo de desenvolvimento são de US$ 3 bilhões.

Como fazer então inclusão digital?
Essa é outra boa questão: é de um computador que essas pessoas precisam? Ou eles precisam de água limpa e remédios? Sim, existe a oportunidade digital mas houve antes uma revolução industrial e muitas dessas pessoas não tiveram acesso a ela. Não têm sequer eletricidade. Eles não serão ajudados de maneira fantástica se tiverem computadores. Seria melhor se tivessem acesso a água limpa e remédios.

Especialistas afirmam que, no futuro, os computadores serão simples e os aplicativos ficarão em bases externas. O sr. concorda?
Não. O sistema operacional é a plataforma que permite o desenvolvimento de aplicativos e nem todos eles estarão na internet. Vamos dizer que você está num avião e quer usar o computador. Você precisará usar a internet, mas é caro e não são muitas companhias que a oferecem. Além disso, empresas e pessoas estão fazendo operações cada vez mais complexas e demandando capacidade maior. Esse modelo funcionaria em conexão por fibra óptica, mas há pouca no mundo. E, se tudo estivesse na rede, onde você buscaria as informações? Num servidor? Somos o maior vendedor de servidores dos Estados Unidos. Aí também estaremos bem.

 
Dell no mundo
Maior fabricante de PCs do mundo, a Dell tem 18% do mercado global

Faturamento: US$ 49 Bilhões
Base de vendas:
85% vendas corporativas e institucionais
15% consumidor final
Vendas por produto:
Desktops: 37%
Negócios corporativos: 20%
Equipamentos móveis: 26%
Dell no Brasil:
Servidores (1ª do mercado): 32%
PCs (2ª do mercado): 4,6%
Notebooks (2ª do mercado) :20,8%