Liminares concedidas pela Justiça nas últimas semanas estão permitindo que empresas mantenham benefícios fiscais que seriam limitados com a regulamentação das subvenções, impondo derrota para o governo em uma de suas principais medidas na busca pelo déficit fiscal zero em 2024.

Ao menos três decisões em diferentes Estados foram expedidas pelo Judiciário em favor de empresas e representantes de setores que não concordam com o entendimento do governo e buscam evitar o pagamento de tributos federais envolvidos na medida.

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A MP das subvenções foi sancionada em dezembro após meses de negociações com o legislativo e tem impacto estimado em R$ 35 bilhões em 2024, segundo o governo. O texto limita a investimentos de empresas os benefícios fiscais federais baseados em incentivos estaduais, o que na prática proíbe a extensão desses subsídios para gastos com custeio das companhias.

A adoção da medida pelo governo foi alvo de questionamentos de entidades de classe que alegavam haver afronta ao pacto federativo porque a Receita Federal estaria limitando um benefício originado em decisões de governos regionais. Ações também questionam a abrangência da trava imposta pelo governo.

Em um dos processos, aberto em São Paulo pela Laticínios Catupiry, a empresa alegou que tem direito a créditos presumidos do imposto estadual ICMS — redução tributária baseada em operações feitas pela companhia — e que esse incentivo não pode ser incluído no cálculo de Imposto de Renda (IRPJ) e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) porque os benefícios “não constituem renda”.

“Em razão do princípio federativo, a tributação pela União sobre os créditos presumidos derivados de políticas fiscais e desenvolvimentistas de Estados implicaria no desrespeito à autonomia deste ente”, diz a companhia na ação.

O pedido foi acatado de forma liminar na última terça-feira pela Justiça Federal, que determinou a suspensão da incidência de IRPJ e CSLL sobre os créditos presumidos de ICMS da empresa.

Decisão similar foi proferida neste mês em Brasília em favor do Sindicado do Comércio Atacadista do Distrito Federal. Nesse caso, o benefício de ICMS não entrará na base de cálculo de Pis e Cofins.

Procurado, o Ministério da Fazenda afirmou que receitas decorrentes de subvenções sempre integraram a receita bruta das empresas e estiveram sujeitas à tributação federal, enfatizando entender que “se consagrará vencedora nas ações que tratam do tema”.

“Quando um benefício fiscal é concedido por Estado ou Distrito Federal, não deve ser compulsoriamente replicado pela União Federal em tributos de sua competência privativa, sob pena de ofensa ao princípio federativo”, afirmou a Fazenda.

O economista-chefe e sócio da Warren Investimentos, Felipe Salto, avaliou que a judicialização era esperada, mas considerou a nova lei “bastante clara” ao definir que “benefício fiscal do ICMS, não importa de que tipo, deve ser tratado como um crédito e, como tal, está sujeito à tributação federal, devendo passar por avaliação, caso a caso, da Receita”.

Para Salto, que já previa anteriormente um ganho menor que o previsto pelo governo com a medida, se o tema escalar ao Supremo Tribunal Federal (STF), “a coisa deve caminhar bem rápido, até porque a consequência fiscal e econômica é enorme”.

“A judicialização, no limite, será uma pedra no caminho, mas não acho que terá o condão de evitar a ação da Receita no sentido de buscar a arrecadação perdida”, disse.

Clarissa Machado, sócia da área tributária do escritório Trench Rossi Watanabe, que atua em ações envolvendo o assunto, afirmou que as liminares são uma boa notícia para os contribuintes pois confirmam que o pacto federativo prevalecerá.

“Os créditos presumidos são créditos não recuperáveis que o governo estadual abdicou de receber e que o governo federal, por sua vez, não pode tributar”, afirmou.

O escritório ressaltou que STF deverá julgar em breve uma ação que trata especificamente da tributação de créditos presumidos, podendo firmar um entendimento geral sobre o tema.