Esqueça tudo o que os analistas
de mercado indicaram, no início do
ano, como boas opções de investimento na bolsa. O cenário de instabilidade ? com o dólar em alta, a crise energética e previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) reduzida pela metade ? modificou tanto as previsões que é preciso olhar pelo avesso todas as avaliações de seis meses atrás. ?Houve uma inversão tão grande que é como se o mercado tivesse dado um giro de 180 graus?,
diz Júlio Ziegelman, diretor de renda variável do BankBoston.
?A direção agora é outra, completamente oposta.? E como direção oposta entenda deixar de lado as empresas com produção voltada para o mercado interno e rever como boas opções os papéis daquelas exportadoras, que dependem menos do desempenho nacional para terem bons resultados.

Desde janeiro, a Bolsa de Valores de São Paulo acumula queda em dólar de 25%. Ações como as do Pão de Açúcar, Saraiva e AmBev, que até maio eram tidas como ótimas ofertas, saem dos holofotes. ?Essas serão as primeiras afetadas com a queda no índice de crescimento do País?, avalia Ziegelman. O raciocínio é simples: se a economia vai mal, o consumo interno cai e leva junto a produção e os resultados das indústrias. A previsão feita no início do ano, de que o cenário nacional tendia a recuperação e com ela todas as empresas com foco interno ganhariam peso, ficou para trás. Então, risque das opções de compra as companhias que de alguma forma dependem do consumo interno, seja nos setores de alimentos, bebidas, fumo ou publicações editoriais, por exemplo.

Por outro lado, a temida crise americana não veio. Ou, pelo menos, não na proporção que se imaginava. Isso leva as empresas exportadoras de novo ao foco dos analistas, mesmo com a alta sem freio do dólar. Embraer, CST, Vale do Rio Doce, Aracruz e Petrobras são apenas algumas das ações que ganham novo fôlego neste segundo semestre. O que não significa que alguém deva entrar na bolsa neste momento na carona das exportadoras. Num período de instabilidade como o atual, o mais seguro é procurar um fundo de capital protegido. Para Alexandre Póvoa, diretor de investimentos do ABN Amro Asset, os papéis de empresas que exportam são alternativas para quem já tem dinheiro em renda variável. ?Não recomendo novas aplicações antes de agosto?, explica Póvoa. Ele aposta que só no segundo semestre será possível dimensionar os estragos da crise energética e esperar alguma desaceleração da moeda estrangeira.

Dívida. Enquanto agosto não chega, siga a dica dos analistas de confiar desconfiando. Até mesmo a lista das exportadoras precisa de uma avaliação mais detalhada antes de virar opção de compra. Imagine, por exemplo, que por melhor que sejam os resultados comerciais de uma empresa como Embraer (que mantém lá fora grande parte dos seus negócios), seu lucro pode chegar ao final do ano em zero por causa da alta do dólar. Isso porque, assim como a maioria das empresas brasileiras exportadoras, o índice de endividamento em moeda estrangeira é elevado. A dívida da Embraer equivale a 69,8% do seu patrimônio, sendo que 60% desse total é em dólar. ?O câmbio no nível atual prejudica não só o desempenho do papel nos pregões como o valor dos dividendos, que está diretamente ligado ao lucro operacional da companhia?, conta Fernando Exel, da Economática, empresa de dados financeiros de São Paulo. E detalhe: a Embraer não está entre as empresas com maior índice de endividamento do País.

Exel calcula que o nível médio de dívida dos grupos brasileiros, considerando as 304 com patrimônio acima de R$ 100 milhões, é de 57,4%. Ou seja, essas companhias têm um comprometimento médio de 57,4% do patrimônio com dívidas. Não é um porcentual elevado se comparado aos Estados Unidos. Entre as empresas americanas, a média é 78,57%. ?Numa economia estável, o nível de endividamento é um ótimo parâmetro para avaliar o ritmo de investimentos de um grupo empresarial?, ressalta Exel. Mas num momento de instabilidade como o atual, o índice acaba pesando contra o investidor.