22/07/2024 - 20:08
Afastado do Tribunal de Justiça do Paraná após afirmar que as mulheres “estão loucas atrás dos homens”, o desembargador Luis Cesar de Paula Espíndola teve holerite mensal médio de R$ 120 mil brutos, ou R$ 90 mil líquidos em 2024. Nos primeiros seis meses do ano, ele acumulou R$ 542 mil líquidos – desse montante, penduricalhos e pagamentos retroativos bateram R$ 392,2 mil.
O afastamento de Espíndola foi determinado há dez dias pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, em razão de “manifestações de conteúdo potencialmente preconceituoso e misógino em relação à vítima menor de idade” – o desembargador disse que “as mulheres estão loucas atrás dos homens” durante julgamento de um caso em que uma menina de 12 anos teria sido vítima de assédio de um professor.
Em nota, Espíndola disse que “não teve a intenção de menosprezar o comportamento feminino”. “Lamento profundamente o ocorrido e me solidarizo com todas e todos que se sentiram ofendidos com a divulgação parcial do vídeo da sessão”, afirmou, em texto divulgado pelo Tribunal de Justiça do Paraná.
Enquanto estiver afastado de suas funções na Corte paranaense, o desembargador seguirá recebendo seus proventos. O subsídio – expressão usada desde 2006 para tratar dos salários dos magistrados – de Espíndola é de R$ 39,7 mi, fora direitos pessoais e eventuais e indenizações que engordam seu contracheque.
Esse plus – eventuais e pessoais – é concedido aos juízes com amparo na Lei Orgânica da Magistratura, em Regimentos Internos dos Tribunais e em legislações específicas.
Na primeira metade de 2024, por exemplo, Espíndola recebeu R$ 241,8 mil em “pagamentos retroativos”. O montante supera o valor que era devido a Espíndola pelos subsídios referentes aos seis primeiros meses do ano – R$ 236,1 mil.
O contracheque do magistrado não detalha quais verbas foram pagas em caráter retroativo. A reportagem entrou em contato com o Tribunal de Justiça do Paraná e aguarda retorno.
O contracheque do juiz também foi abastecido por licenças compensatórias (R$ 85,8 mil) e “indenização de remuneração” (R$ 27,3 mil).
Além disso, o pagamento de verbas retroativas levou o magistrado a receber o abono permanência, reembolso pago ao servidor que escolhe trabalhar mesmo depois de ter adquirido condições para se aposentar. Sob essa rubrica, o magistrado incorporou mensalmente R$ 6 mil.
Mesmo com o valor bruto do contracheque de Espíndola batendo mais de R$ 120 mil em cinco dos seis primeiros meses de 2024, o maior desconto lançado nos holerites pelo abate-teto foi de R$ 7,6 mil.
O abate-teto é a retenção de valores que superam o teto do funcionalismo público, ou seja, o subsídio de ministro do STF, R$ 44 mil.
Na matemática salarial da toga, também nas contas do Ministério Público e de outras corporações públicas, penduricalhos não entram no abate-teto, sob o argumento de direito adquirido. Muitos agregados que encorpam esses contracheques também não sofrem incidência de imposto.
Investigação no CNJ
O afastamento do desembargador Luiz César de Paula Espíndola, determinado monocraticamente pelo ministro Luís Felipe Salomão, deve ser submetido ao crivo do Plenário do Conselho Nacional de Justiça assim que o recesso do Judiciário terminar.
A medida foi decretada na iminência do julgamento, pelo Plenário do CNJ, de um procedimento em que o desembargador foi enquadrado na Lei Maria da Penha. Ele foi sentenciado em março de 2023 pelo Superior Tribunal de Justiça sob acusação de ter agredido uma irmã dele e a própria mãe, de 81 anos, em 2013.
Neste processo de violência doméstica, Espíndola foi condenado à detenção de quatro meses e 20 dias, em regime aberto. Na ocasião, o colegiado decidiu suspender a execução da pena do desembargador por dois anos.
A reclamação disciplinar no âmbito do CNJ sobre a declaração “as mulheres estão loucas atrás dos homens” consiste na sétima apuração envolvendo o magistrado. Desta vez, a investigação se refere à sua conduta durante o julgamento da 12ª Câmara Cível da Corte do Paraná.
A sessão versava sobre o assédio a uma menina de 12 anos. Um professor havia pedido seu telefone e “mandava mensagens no horário da aula, elogiando-a, e pedindo que ela não contasse a ninguém”. O assédio fez com que a criança não quisesse mais ir à aula. Ela ia para a escola, mas ficava no banheiro.
A 12.ª Câmara do TJ do Paraná iria decidir se mantinha as medidas protetivas concedidas à menina e se iria manter o afastamento do professor do convívio da menina. A Câmara manteve as protetivas, com o voto divergente de Espíndola.
Depois do julgamento, mas ainda na sessão, o desembargador apontou “discurso feminista desatualizado” e disse: “Se Vossa Excelência sair na rua hoje em dia, quem está assediando, correndo atrás de homens, são as mulheres. Porque não tem homem. É um mercado que está bem diferente. Hoje em dia as mulheres estão loucas atrás de homens, porque são muito poucos. É só sair à noite, eu não saio muito à noite, mas conheço funcionárias. A mulherada está louca atrás do homem. Louca para levar um elogio, uma piscada, uma cantada educada, porque elas é que estão cantando, assediando.”