O desmatamento na Amazônia caiu 22,3% em um ano, segundo dados apresentados pelo Ministério do Meio Ambiente nesta quinta-feira, 9. O balanço compreende o período entre agosto de 2022 e julho deste ano, parte no governo Jair Bolsonaro (PL) e parte na gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A floresta, porém, tem sofrido nos últimos meses com uma onda de queimadas, com destaque para a região do Amazonas, onde nuvens de fumaça encobrem várias cidades, entre elas Manaus.

No total, foram desmatados no bioma 9.001 km² neste doze meses, conforme os dados consolidados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. A perda de cobertura vegetal é mapeada por meio de satélites e a contagem da taxa de desmatamento sempre é feita de agosto de um ano até julho do ano seguinte.

Segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, os resultados mostram avanço, mas em patamares ainda muito elevados de destruição. Além disso, o espalhamento recente das queimadas e a fragilidade política do governo no Congresso podem comprometer a melhora nos próximos meses.

“Pegamos um passivo de 6 mil quilômetros (quadrados de área desmatada) do governo Bolsonaro que estará sendo computado para o desmatamento de 2023, mas conseguimos uma redução de 42% (nos meses de janeiro a julho) graças às ações emergenciais dentro do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAM)”, disse a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

É a primeira vez desde 2019 que a taxa de desmate fica abaixo de 10 mil km². O governo tem apontado o aumento da capacidade de fiscalização federal em campo na ordem de quase 200% e a retomada na aplicação de multas como fatores que contribuíram para a queda da devastação da floresta.

Sobre as queimadas, Marina falou a respeito dos impactos do El Niño, agravados pelas mudanças climáticas. O ministério tem destacado o aumento de 18% no número de brigadistas, com 2.101 agentes. O governo também afirma ter distribuído quase R$ 700 milhões em recursos, em diversas áreas, para ajudar na crise de estiagem e queimadas no Amazonas. Marina disse ainda que o governo está agindo tanto na resposta emergencial , como em aspectos estruturantes. Segundo ela, a agenda da adaptação aos efeitos das mudanças climáticas está “muito atrasada no mundo inteiro”

Ao Estadão, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, admitiu nesta semana que a estrutura de combate ao fogo não é suficiente e disse que vai pedir mais recursos ao Fundo Amazônia, no fim do ano, para essas ações. Apesar da piora do cenário, o governo não apresentou nesta quinta novas estratégias de resposta imediata para frear o avanço das chamas na região.

Para especialistas, a comunidade científica internacional já alertava há vários meses sobre as previsões de estiagem no Norte do País a partir do 2º semestre e há falhas no planejamento estratégico do governo para mapear as áreas mais suscetíveis a queimadas e prevenir a expansão das chamas pela floresta.

Em relação aos riscos de nova alta no desmate após o avanço do fogo, o ministério afirmou que os dados preliminares apontam redução das taxas de destruição nos meses de agosto, setembro e outubro. Apesar da projeção o secretário Extraordinária de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente, André Lima, afirmou que há um contexto de risco climático para o próximo ano.

“Esse El Niño é ainda mais forte que o de 1997, o que torna muito mais desafiadora nossa ação de manutenção e de ainda mais redução de desmatamento”, afirma Lima. “Isso tem efeito grande na degradação florestal, tornando-a mais vulnerável a incêndios de grandes proporções mesmo nas áreas de florestas mais preservadas. Tem também aumento no risco de desmatamento por meio da degradação florestal progressiva. A cada ano queima, vai queimando, torna mais seco, ainda mais vulnerável a um novo risco de incêndios.”

Lima também destacou medidas de incentivo à economia sustentável, com apoio a 6 mil produtores locais; verba para pesquisas em biodiversidade (R$ 60 milhões), e apoio federal a municípios críticos para desmate, com R$ 600 milhões do Fundo Amazônia; entre outros.

A apresentação dos dados de queda de desmate e a crise de escalada das queimadas ocorrem às vésperas da Cúpula do Clima (COP-28), que ocorre a partir do fim do mês os Emirados Árabes Unidos. No evento, é esperado que o Brasil retome protagonismo nas negociações climáticas e seja cobrado pelas promessas de preservação ambiental feitas no último ano.

Marina disse acreditar que as queimadas na Amazônia possam dar sinal negativo ao mundo. Segundo ela, o mundo sabe que o governo age para conter a destruição e assumiu o País diante de “combinação perversa de destruição de políticas públicas, incentivo à criminalidade, e El Niño” potencializado pela mudança do clima.

O governo ainda vai decretar emergência permanente em 1038 municípios mapeados pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) como suscetíveis a eventos climáticos extremos.

Secretária executiva da Casa Civil, Míriam Belchior afirmou que o governo vai selecionar projetos no âmbito do Novo PAC que tenham como foco a adaptação a mudanças climáticas.

Queimadas e fragilidade na relação com o Legislativo são gargalos

Para Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, os resultados mostram um retorno de ações efetivas em campo, mas outros fatores podem atrapalhar novas melhoras. “A fragilidade política do governo no Congresso, contudo, pode minar todo esse esforço e dificultar o alcance da meta de desmatamento zero até 2030?, diz ela, que presidiu o Ibama na gestão Michel Temer (2016-2018).

É uma redução que merece ser celebrada, mas precisa lembrar que 9 mil km² é um valor alto para Amazônia e precisa continuar nessa tendência de queda acelerada para zerar essa destruição, já que vemos os impactos desse desmatamento na vida de muitas pessoas, não só as que estão na Amazônia, mas fora delas também”, diz Mariana Napolitano, diretora de Estratégia do WWF-Brasil.

“Um desses impactos são as queimadas, a seca extrema que ocorre no bioma agora no mês de outubro e que é uma combinação dos efeitos do desmatamento com aquecimento é global”, acrescenta. Na Região Norte, a estiagem tem interrompido o transporte fluvial e atrasado a entrega de comida e remédios. Além disso, estudos mostram que os efeitos das queimadas no Pantanal e na Amazônia afetam a saúde até dos moradores de São Paulo.