O IPO do Facebook, a abertura de capital mais esperada dos últimos anos, que espera captar US$ 5 bilhões, deve ter início em maio. A boa notícia é que os brasileiros podem se tornar sócios da maior rede social do mundo. A má notícia é que é preciso um razoável esforço e muita paciência para poder acrescentar os papéis da empresa fundada e controlada pelo americano Mark Zuckerberg ao seu portfólio. Ou seja, curtir a sensação de virar acionista de uma das grifes mais promissoras do mundo digital não é para qualquer um. Antes de entrar nos detalhes, vale lembrar que aplicar no lançamento de ações de uma empresa é sempre arriscado. Isso é ainda mais verdade no caso da companhia fundada por Zuckerberg. 

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Sérgio Correia, LLA Investimentos: “Os sócios de Mark Zuckerberg vão correr os riscos

da empresa e os riscos cambiais”

 

“Não se conhece direito as finanças da empresa e não há histórico para consulta, e além disso o preço pelo qual os investidores vão negociar também é uma incógnita”, diz Sérgio Manuel Correia, da LLA Investimentos. Essas restrições são aplicáveis a qualquer empreendimento ligado à tecnologia. Há um risco adicional. “No caso de investimento no Exterior, o risco de variação cambial também é grande.” Aos fatos. É possível investir no Facebook diretamente, por meio de fundos ou, eventualmente, em certificados de ações que vierem a ser lançados no mercado brasileiro. O investimento mais direto é comprar ações e, para isso, é preciso abrir uma conta de investimentos no Exterior. Chamadas de off shore, essas contas destinam-se a não residentes nos Estados Unidos que querem ter dinheiro no mercado americano. 

 

Também é necessário abrir uma conta em uma corretora na terra do Tio Sam. Esses processos são teoricamente simples: bancos e corretoras cobram apenas a apresentação de documentos pessoais e comprovantes de renda, e não exigem nem que o cliente faça um depósito inicial. Para evitar lavagem de dinheiro, porém, os bancos estadunidenses têm muito cuidado na análise dos dados do cliente estrangeiro. A abertura de conta pode ser negada se houver, por exemplo, incongruência entre os dados declarados à Receita Federal brasileira e os informados ao banco americano. “Um caso comum é quando um cliente vende um imóvel por valor diferente do que consta na sua declaração de Imposto de Renda”, diz Gilberto Poso, superintendente executivo de gestão de patrimônio do HSBC. “Nesses casos, o banco americano costuma telefonar ao cliente para obter esclarecimentos ou documentos adicionais e, se não ficar satisfeito, pode recusar-se a abrir a conta.” 

 

Uma vez cadastrado na corretora dos Estados Unidos, o cliente envia as ordens de compra e venda das ações do Facebook, da mesma forma que ocorre no mercado doméstico: por meio de home broker ou pelo envio de ordem para o corretor por e-mail ou telefone. O preço do serviço varia. Como no Brasil, algumas corretoras cobram um percentual por transação, e outras uma taxa fixa. Para transferir o dinheiro ao Exterior para comprar as ações, é preciso fazer uma operação de câmbio em um banco brasileiro e solicitar a transferência do dinheiro para uma instituição americana, sujeitando-se às taxas do dia. O banco brasileiro fica encarregado de avisar ao Banco Central os motivos da saída dos recursos. Se tiver mais de US$ 100 mil no Exterior, o investidor precisa preencher anualmente a Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior, que não deve ser confundida com a declaração de Imposto de Renda. 

 

Trata-se de uma declaração adicional, disponível no site do BC e que tem de ser preenchida pelo cliente – não, o banco não faz isso para você.A parte trabalhosa começa mesmo na hora da realização de lucros. Quando vende as ações, o investidor tem de informar a Receita Federal sobre os ganhos de capital e com o câmbio, de acordo com a Medida Provisória nº 2.158-35/2001. Funciona assim: por exemplo, o investidor comprou US$ 100 mil em ações quando o dólar de envio estava em R$ 1,80, totalizando R$ 180 mil. Imagine que, ao vender as ações, esse investidor ganhou 10%. Se o dólar continuar inalterado a R$ 1,80, o investidor lucrou R$ 19.500 e terá de pagar 15% de imposto sobre esse valor, por meio de “recolhimento obrigatório”, mais conhecido como carnê-leão. 

 

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Gilberto Poso, executivo do HSBC: “Os bancos nos Estados Unidos

são muito exigentes quanto à precisão dos dados”

 

“Mesmo que não traga o dinheiro de volta ao Brasil, o investidor terá de pagar esse imposto sobre os ganhos”, diz o contador Jadson Ricarte, membro do Conselho Federal de Contabilidade. Esse recolhimento deve ser efetuado até o último dia útil do mês seguinte àquele em que o rendimento foi recebido. Se vender seus papéis com o dólar a R$ 1,90, o investidor terá dois ganhos, o cambial e o com a valorização das ações. Nesse caso, o imposto será cobrado em cima de R$ 209 mil (US$ 110 mil x R$ 1,90). Se, ao contrário, vender as ações com prejuízo devido ao câmbio – com o dólar a R$ 1,50 no momento da venda, por exemplo –, o investidor vai receber R$ 165 mil (US$ 110 mil x R$ 1,50) e terá um prejuízo de R$ 15 mil. “Nesse caso, não se recolhe o imposto”, diz Ricarte. Há formas de isentar de imposto os novos ganhos com a variação cambial.

 

O segredo chama-se reinvestimento de lucro. Se os US$ 110 mil do exemplo anterior forem reinvestidos e, após alguns meses, essas ações se valorizarem para US$ 150 mil, o ganho com o dólar sobre a valorização adicional a partir de US$ 110 mil é isento de imposto. Nos US$ 40 mil ou R$ 76 mil restantes incide alíquota de 15%. Não se sinta sozinho se você achou complicado. “Essa conta é chata mesmo e afugenta o investidor, que tem medo de não saber fazê-la”, diz Correia, da LLA. Além disso, lembra ele, os contadores brasileiros não estão acostumados com esse processo. “Quem conhece esse macete cobra caro, o que aumenta o custo de investir lá fora e faz algumas pessoas desistir”, afirma. Segundo o Conselho Federal de Contabilidade, os contadores cobram, em média, dois salários mínimos para realizar esse tipo de cálculo. 

 

“Normalmente, porém, os clientes que investem no Exterior exigem outros trabalhos do contador e a cobrança do serviço é caso a caso”, afirma Ricarte. Esses ganhos entram no cálculo do imposto de renda a pagar para o ano. Além da opção de investir diretamente nas ações do Facebook, o brasileiro que quiser um pedacinho do bolo de Zuckerberg pode optar por fundos exclusivos, que acessam aplicações no Exterior. Sendo o único cotista de um deles, o investidor pode recomendar ao gestor onde colocar o seu dinheiro. “O cliente não pode dar uma ordem de compra, mas o gestor ouve sua opinião sobre aplicações em que deseja participar”, diz Gustavo Aranha, responsável por produtos de private banking da Credit Suisse Hedging Griffo. 

 

Esses fundos são indicados para quem tem mais de R$ 20 milhões disponíveis para aplicação. “A grande vantagem dos fundos exclusivos é que a tributação é mais simples, pois as perdas e os ganhos são calculados como cotas e sobre elas incide imposto de renda”, diz Aranha. Outra opção é aplicar o dinheiro por meio de fundos de investimento convencionais que operam com ações de companhias estrangeiras. O inconveniente para o investidor é não saber quantas ações do Facebook estarão na carteira e por quanto tempo. Final­mente, é possível curtir o IPO esperando que algum banco brasileiro lance BDRs (certificados de ações de empresas estrangeiras negociados na BM&FBo­vespa) do Facebook, o que deve ocorrer nos próximos meses. E aí, curtiu?

 

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