04/12/2015 - 16:25
Da Espanha até o Brasil, a hipótese de uma quebra do gigante das energias renováveis Abengoa ameaça numerosos empregos e projetos em todo o mundo e pode supor um forte golpe aos bancos espanhóis.
“Se endividaram muito (…) O total de passivo pode estar acima dos 25 bilhões de euros”, afirmou nesta sexta-feira o ministro espanhol da Indústria, José Manuel Soria.
Criticando uma gestão desacertada do grupo, acrescentou: “Não estamos num momento em que o Estado, quando há uma empresa em apuros, socorre. Ninguém está achando que o governo (espanhol) injetará mais liquidez”.
Empresa familiar fundada há 70 anos na Andaluzia, sul da Espanha, a Abengoa se transformou em um emblema da indústria energética espanhola.
A multinacional destaca-se nos setores de energia solar, eólica, biocombustíveis e tratamento e salinização da água. Emprega 28.700 pessoas, mais de 13.000 na América Latina.
A incerteza sobre o seu futuro chega em um mal momento para o governo conservador de Mariano Rajoy, em campanha para as eleições legislativas de 20 de dezembro.
No dia 25 de novembro convocou os credores para negociar e desde então bancos, sindicatos e o governo espanhol tentam esclarecer sua situação.
Sete bancos – os espanhóis Banco Santander, Bankia, Banco Popular, CaixaBank e Banco Sabadell, o britânico HSBC e o francês Credit Agricole – encarregaram a companhia de auditoria e assessoria KPMG de verificar as contas da Abengoa e suas centenas de filiais, segundo a Bloomberg.
“O tema da Abengoa está causando muito rebuliço. Há muito nervosismo e muita vontade de que o impacto seja o menor possível”, avalia Iván San Félix, analista na sociedade de gestão de ativos Renta 4, em Madri.
“Mas dependerá do quão exigente o comitê de credores, liderado pelo Banco Santander, vai querer ser com a companhia. Nesse tipo de situação, costuma-se dizer que uma parte da dívida não se paga, mas se compensa com ações”, acrescentou.
Agora, a Abengoa tem quatro meses para chegar a um acordo com seus credores. “Será um processo muito complexo, muito longo”, adverte José Carlos Díez, economista-chefe da sociedade de valores Intermoney.
No final de setembro, a Abengoa registrava uma dívida bruta de quase 9 bilhões de euros. Mas Antoine Bourgault, analista da ISM Capital, em Londres, lembra que “os investidores estão escaldados por outras quebras na Espanha, onde foram encontradas dívidas embaixo do tapete”.
A quebra do gigante dos alimentos congelados Pescanova em 2013, após maquiar suas contas para reduzir a dívida, ainda é lembrada, ressalta.
O setor bancário espanhol, que recupera pouco a pouco seu dinamismo após ter saído no início de 2014 de um plano de resgate europeu de 41,3 bilhões de euros, também pode ser afetado, lembra a agência de classificação de risco Standard & Poor’s.
Os bancos espanhóis têm cerca de 40% da dívida bancária de Abengoa e “começarão a guardar provisões” em 2015 e 2016 para cobrir as perdas eventuais, o que afetará seus resultados, afirma a S&P.
Os sindicatos também estão na expectativa, depois de não ter conseguido se reunir com a direção. “Esperamos o relatório da KPMG”, disse Francisco Carbonero, secretário-geral do sindicato Comisiones Obreros de Andaluzia, região que aglutina aproximadamente 4.000 funcionários da Abengoa, sem contar os terceirizados.
A quebra da empresa ultrapassaria em muito as fronteiras espanholas. O grupo realiza quase 87% de seu faturamento no exterior, especialmente nos Estados Unidos e no Brasil.
Atualmente conta com mais de 70 projetos em cerca vinte países e seu maior mercado são os Estados Unidos, à frente do Brasil e do restante da América Latina.
No Brasil, essas dificuldades já são sentidas, segundo o sindicato Sintepav, que reúne funcionários do setor da construção. Cerca de 1.500 pessoas já perderam seus empregos e o sindicato prevê um total de 5.000 demissões.