DINHEIRO ? Logo que assumiu a presidência da Câmara Americana, o sr. publicou um artigo no qual diz que o Brasil tem, sim, condições de voltar a crescer a 5% ao ano. Isso já vale para 2007?
ALEXANDRE SILVA
? Depois de um ano em que a gente cresce menos de 3%, dizer que podemos crescer 5% no ano que vem não é verdade. A gente pode até crescer 5%, mas não vai ser uma coisa sustentada. Várias coisas precisam ser feitas em termos de investimentos, em infra-estrutura principalmente, para que o País possa crescer 5% de forma sustentada. E, se esses investimentos começarem a ser feitos agora, levará algum tempo até que a economia reaja.

DINHEIRO ? Então a meta não é factível…
SILVA
? Mas o Brasil precisa crescer. A China está crescendo a 10% há vários anos e pretende continuar por muito tempo. A Índia está crescendo a 8%. A Argentina está se recuperando, evidentemente, mas está crescendo bem mais do que a gente. A Rússia está crescendo. O Brasil, se você olhar do ponto de vista macro, tem extensão territorial, população, clima, recursos naturais, eficiência em petróleo, minerais de todos os tipos, incluindo minério de ferro de alta qualidade, potencial eólico, potencial hídrico grande e água doce em abundância. Ou seja, tem todas as condições para se tornar uma megaeconomia no futuro. O que a gente precisa é encontrar um caminho.

DINHEIRO ? Alguma pista?
SILVA
? Se a gente olhar o que está acontecendo hoje na China e na Índia, verá que esses países, de forma pragmática, decidiram estrategicamente crescer. O relacionamento com os Estados Unidos, por exemplo, é estratégico. Hoje a China e os Estados Unidos são parceiros íntimos. Então, a gente tem um dever de casa a fazer.

DINHEIRO ? A gente, no caso, é o governo ou a iniciativa privada?
SILVA
? A iniciativa privada com certeza vai estar pronta para investir aqui. Hoje, com a liquidez que existe no mundo e aqui no Brasil também, eu acho que dinheiro privado não vai ser problema. Agora, as condições precisam ser adequadas para que esse investimento privado aconteça.

DINHEIRO ? O sr. fez viagens recentes à China e à Índia e disse que há exemplos de lá a serem seguidos aqui.
SILVA
? Uma coisa que todo mundo fala neste país é que a gente precisa melhorar a educação. Na China e na Índia, a quantidade de pessoas estudando nos diversos níveis, inclusive fora do país, é uma coisa incrível. Não dá para comparar com os nossos números. Eu fiquei impressionado com o que eu vi na China. Os investimentos colossais em aeroportos, estradas, construções, fábricas. É uma coisa impressionante a determinação estratégica deles de crescer.

DINHEIRO ? O que acha das prioridades diplomáticas do governo Lula? Do foco em mercados pouco convencionais?
SILVA
? Procurar se relacionar com o mundo todo é positivo. O Brasil tem hoje, em termos de parceiros internacionais, uma posição bastante equilibrada. A gente não tem nossos ovinhos todos numa cestinha. O único país que representa hoje, individualmente, mais de 10% do nosso volume de importações e exportações são os Estados Unidos.

 

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“Furlan foi um exemplo positivo, e Gerdau (foto) é um nome maravilhoso. Lúcido e preparado”.

DINHEIRO ? Então a atual política tem seu aval?
SILVA
? Uma coisa que a gente não pode esquecer é que, desde 1927, os Estados Unidos são nossos principais parceiros. É a maior economia do mundo. É nosso vizinho. O Brasil é a maior economia latino-americana. Então, a gente pode fazer negócios com o mundo inteiro, mas não dá para esquecer que existe esse megamercado aqui do nosso lado.

DINHEIRO ? Os Estados Unidos ficaram esquecidos neste primeiro mandato?
SILVA
? Não digo que ficaram esquecidos, porque, independentemente até do governo, as empresas tratam de estabelecer esses vínculos. Mas o comércio com outras regiões cresceu mais do que com os Estados Unidos. E, como eu disse, os Estados Unidos são a maior economia do mundo e merecem uma atenção especial. Do ponto de vista estratégico, precisamos ter uma posição mais clara em relação ao que queremos com os Estados Unidos.

DINHEIRO ? Com os democratas dominando o Congresso americano, os Estados Unidos serão mais protecionistas?
SILVA
? Tradicionalmente, os democratas são considerados mais protecionistas. Mas hoje em dia, nesse mundo globalizado, ninguém compra nada de outro país só para ajudar esse outro país. Existe o interesse de fazer comércio com o mundo inteiro. Se os Estados Unidos forem querer se isolar do mundo, não vai dar certo para eles. Se a gente vê os Estados Unidos importando volumes incríveis da China e agora da Índia, é porque isso é um fator de controle da inflação deles. Eles compram coisas baratas do resto do mundo e podem se dedicar a coisas de maior valor agregado e nível tecnológico mais alto.

DINHEIRO ? Os acordos bilaterais entre países americanos mataram a Alca (Área de Livre Comércio das Américas)?
SILVA
? México, Estados Unidos e Canadá fizeram o Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte). Evidente que ele trouxe problemas para o México, mas a resultante foi altamente positiva. O Chile assinou um acordo de livre comércio com os Estados Unidos, e o resultado para os chilenos foi fantástico. O aumento das exportações do Chile para os Estados Unidos foi uma coisa incrível. Assim como a quantidade de negócios que empresas americanas fizeram a mais no Chile por conta disso. Os países, individualmente, estão defendendo os seus interesses. A pergunta que fica no ar é: como é que a gente vai tratar disso? Via Mercosul, negociando em bloco? Ou vamos negociar um acordo direto Brasil?Estados Unidos?

 

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“Jack Welsh teve seu momento. Fez um belo trabalho na GE, como outros CEOs”.

DINHEIRO ? Com o Mercosul em vigor, teoricamente, não é possível negociar bilateralmente.
SILVA
? É uma situação complexa. Existe o Mercosul, é um fato que existe. Veja o caso do Uruguai, que é parte do Mercosul e falou numa negociação direta com os Estados Unidos. É um negócio complicado. Mas não dá para ficar parado, esperando o bonde passar. O Brasil é uma economia muito grande, muito diferente de outros países da América Latina. Tem uma infra-estrutura sofisticada, um parque industrial sofisticado, um agronegócio de grande volume e sofisticado, com alta tecnologia. É diferente do Chile, da Argentina, da Colômbia, do México. Então cada um tem que olhar seus interesses.

DINHEIRO ? O que deveria ser feito?
SILVA
? É lógico que, quando se parte para um acordo bilateral, alguns perdem e alguns ganham. O que é importante é que a resultante seja favorável para os dois lados. Se não for, o acordo não fica de pé. Se ajustes precisam ser feitos, que se façam esses ajustes para minimizar o impacto nos setores que vão ser prejudicados. Mas sem dúvida o Brasil precisa abrir mais a sua economia para o mundo. O comércio externo brasileiro é aproximadamente 25% do PIB. Muito pouco. Se a gente olhar o Chile é 60%. Então, o Brasil precisa se abrir mais.

DINHEIRO ? O Mercosul está em processo de extinção?
SILVA
? Não, eu acho que não. O nosso relacionamento comercial com a Argentina é importantíssimo. E os outros países do Mercosul são parceiros importantes também. O Mercosul existe e tem que ser olhado com atenção. O que a gente precisa é tomar cuidado para o Mercosul não ser um problema para seus membros.

DINHEIRO ? Que impacto tem o fator Chaves?Evo Morales sobre os negócios na região?
SILVA
? As empresas privadas são pragmáticas. Não compete à iniciativa privada fazer avaliação ideológica ou política. O importante é que, à exceção de Cuba, todos os outros países exercem a democracia na região. Muito diferente de outras regiões do mundo.

DINHEIRO ? É viável falar em crescimento por meio da abertura comercial com a atual política monetária brecando o aumento da produção?
SILVA
? Eu acho que a política monetária do governo Lula foi boa. Nós estamos com a inflação sob controle, a balança comercial está bem e o nível de reservas é fantástico, como nunca houve. A taxa de juros é um problema, sem dúvida. Mas se o remédio para controlar a inflação é esse, então ele é positivo. A dose é que é o problema. Talvez a dose tenha sido um pouco exagerada. Talvez. Eu não sei. Mas a verdade é a seguinte: nós vamos fechar o ano com inflação de menos de 4%. Isso é importantíssimo. Inflação baixa é o maior instrumento de distribuição de renda.

 

DINHEIRO ? Que lhe parece a idéia de levar homens de negócios, como Jorge Gerdau, para o governo?
SILVA
? O ministro (Luiz Fernando) Furlan foi um exemplo positivo. Gerdau é um nome maravilhoso. É uma pessoa bem-sucedida, lúcida, preparada. E tem outros. Eu vejo isso de forma positiva. Um governo com pessoas de vários setores diferentes.

DINHEIRO ? Como o Brasil aparece no mapa da GE?
SILVA
? A GE está olhando com muita atenção para as regiões em desenvolvimento no mundo. O nosso CEO, Jeffrey Immelt, esteve aqui no início do ano passado e novamente no início deste ano. Na primeira vez, ele veio curioso. Veio para ver pessoalmente o que estava ouvindo falar sobre as oportunidades de negócio aqui no Brasil. Neste ano, no início do ano, ele repetiu a dose. Veio menos curioso, agora para ver resultados. No ano de 2005, nós crescemos 40%. E boa parte desse crescimento foi por conta da visita dele.

DINHEIRO ? Como foi o seu encontro com Jack Welsh (lendário ex-presidente da GE, que visitou o Brasil no mês passado)?
SILVA
? Uma coisa interessante que pouca gente sabe é que a GE tem 127 anos e teve nove CEOs, contando com o Jeffrey Immelt, que está há apenas cinco anos na posição. Então, a média por CEO é de quase 15 anos. É a cultura da empresa. Pessoas diferentes, cada um no seu momento, que vêem e constroem algo em cima do que o seu antecessor deixou. O Jack teve o momento dele, passou 20 anos no cargo. O Jeff está tendo o momento dele, e está transformando a empresa. Está fazendo a GE mais ágil, com portfólio mais adequado à situação mundial atual.

DINHEIRO ? O sr. quer dizer que a gente tende a valorizar demais a figura do Jack Welsh?
SILVA
? O Jack teve o momento dele, fez um trabalho fantástico na GE, como cada um dos outros oito CEOS. Assim tem sido a história dessa empresa.