02/08/2019 - 16:33
O diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Magnus Osório Galvão, anunciou nesta sexta-feira (2) a sua exoneração, depois de uma polêmica com o presidente Jair Bolsonaro sobre os dados que mostram um forte avanço do desmatamento na Amazônia.
“Minha fala sobre o presidente gerou constrangimento, então eu serei exonerado”, disse Galvão, um físico de 71 anos, após se reunir com o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes.
“Bolsonaro sabe que seu governo é o principal responsável pelo atual cenário de destruição da Amazônia. A exoneração do diretor do Inpe é apenas um ato de vingança contra quem mostra a verdade”, afirmou Márcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace.
A polêmica começou em 19 de julho, quando Bolsonaro, cético da mudança climática e defensor da abertura de áreas protegidas a atividades agrícolas e mineiras, pôs em dúvida dados do Inpe que mostram um aumento de 88% do desmatamento na floresta amazônica em junho, em comparação com o mesmo mês de 2018.
“Pelo nosso sentimento, isso não corresponde à verdade e parece até que [o presidente do Inpe] está a serviço de alguma ONG”, afirmou Bolsonaro em um café da manhã com correspondentes estrangeiros.
No dia seguinte, Galvão reagiu, declarando que Bolsonaro “fez acusações indevidas a pessoas do mais alto nível da ciência brasileira” e atribuiu as suspeitas emitidas pelo chefe de Estado a “uma piada de um garoto de 14 anos que não cabe a um presidente da República fazer”.
Galvão, que recebeu forte apoio da comunidade científica, retomou as críticas no dia 21, afirmando que Bolsonaro “tomou uma atitude pusilânime, covarde, de fazer uma declaração em público talvez esperando que peça demissão, mas eu não vou fazer isso”.
– Pressão internacional –
A tensão se intensificou na quinta-feira, quando Bolsonaro disse que os dados do Inpe “não correspondem à verdade” e prejudicam sua fama e a do Brasil. Ele acrescentou que “se [Galvão] quebrar a confiança, ele será sumariamente demitido”.
O Inpe publicou novos dados, relatando um aumento de 40% no desmatamento nos últimos 12 meses.
Os números oferecem argumentos aos setores e organizações europeus que questionam o recente acordo de livre comércio alcançado em junho entre a União Europeia (UE) e o Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai).
“Os números sobre desmatamento revelam o que todos sabem – que está avançando de maneira muito significativa. Esses números criaram um problema para o governo, porque a pressão nacional e internacional cresceu muito”, disse à AFP João Paulo Capobianco, vice-presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade e ex-vice-ministro do Meio Ambiente (2007-2008).
“Existe uma ofensiva muito grande de setores que têm lucros com a ocupação da Amazônia, e o presidente da República já demonstrava mesmo antes de ser eleito uma completa ignorância da questão ambiental. Não a considera uma questão relevante”, acrescentou Capobianco.
Ao ser questionado na semana passada sobre o impacto ambiental de um projeto de turismo na zona do Rio de Janeiro, Bolsonaro respondeu que esse tema “só importa aos veganos que comem só vegetais”.
A questão ambiental está intimamente vinculada no Brasil à dos territórios indígenas, que Bolsonaro quer que deixem de ser reservas para poder integrar seus habitantes às “maravilhas da vida moderna”, como disse no mês passado.
Nesse campo, o presidente sofreu um revés na quinta-feira, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou uma medida que transferia a demarcação de terras indígenas da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura.