Michael Eisner, o presidente da Walt Disney Company, nunca escondeu a irritação ao ouvir comentários ? cada vez mais freqüentes ? sobre o passado rico e glamouroso de sua companhia. Ele sabe que saudosismo demais tem um único significado: o de que as coisas no presente não vão lá muito bem. As ações da Disney, que em 2000, eram cotadas a US$ 44, hoje não passam dos
US$ 14. Os parques já não têm mais a mesma freqüência. A emissora de TV ABC, que sempre foi um dos ícones do grupo, perdeu pontos preciosos de audiência e a rede de lojas Disney Stores, antes uma grande fonte de receita, será colocada à venda. Pior: a empresa pode estar perdendo a parceira Pixar, de Steve Jobs, que assinou quatro dos maiores sucessos da Disney no cinema nos últimos anos. E para completar o quadro o balanço do primeiro trimestre deste ano acusou uma redução de
US$ 1 bilhão nas receitas da companhia de Mickey Mouse em relação ao quarto trimestre de 2002. Bons tempos aqueles em que a Disney era glamourosa, hein Eisner!

A situação financeira fez o comandante do Reino Encantado mudar a postura. Afinal, se o passado era tão bom como dizem os amigos e inimigos da Disney, por que não tirar lições dele? É exatamente isto que o presidente da companhia vai fazer daqui por diante. A Disney, que completa 80 anos em 2003, volta a ter a ?cabeça? dos anos 80. A começar pela conduta do próprio Eisner. Quando chegou à corporação, o executivo impressionava pela humildade. Nos últimos tempos, também impressionou pela falta dela. ?O principal problema de Eisner foi ignorar a concorrência. Quando ele descobriu que havia estúdios como DreamWorks, por exemplo, fazendo bons filmes, já era tarde demais?, comenta um executivo de Hollywood. ?E os filmes são o motor de todas as outras divisões Disney.?

Fórmula. Eisner pretende comandar a virada da seguinte forma:
1) vender tudo o que estiver fora do foco principal da companhia. Inclua-se neste rol a Disney Store, rede com 547 lojas, e o time de beisebol Angels, que deve ser negociado por US$ 180 milhões. Ponto 2) Reanimar a ABC. A rede de TV caiu do primeiro para o quarto lugar na preferência dos telespectadores entre 18 e 49 anos, os que realmente contam para os anunciantes. A queda foi motivada por um erro de conteúdo que, segundo críticos da Disney, deu ênfase aos programas ?muito sérios?, em detrimento das séries cômicas que fazem estrondoso sucesso nos EUA. ?A ABC, de agora em diante, será uma emissora voltada para comédia?, garante Susan Lyne, presidente da rede. 3) Aumentar a freqüência nos parques. A saída é reforçar o marketing e rezar para que a indústria do turismo volte ao normal.

De todas as mudanças, a mais complicada de ser implementada é na área de filmes animados. Na dos filmes convencionais, para adultos, os resultados são satisfatórios. Os últimos longas da divisão Miramax ? Sweet Home Alabama, Bringing Down the House e Chicago ? custaram
US$ 30 milhões cada. Renderam, juntos, US$ 425 milhões. O problema está na divisão infantil. Nos últimos anos, a Disney se deparou com uma situação inédita: concorrência. Enquanto a DreamWorks (de Steven Spielberg) ganhava seu primeiro Oscar com o ogro Shrek, a Disney era obrigada a engolir o maior fiasco de sua história: Treasure Planet. No intervalo das surras, a companhia até conseguiu ganhar alguns rounds. A conquista foi possível com a ajuda da Pixar, de Jobs, dono também da Apple. Juntas, elas produziram sucessos como Toy Story e Monstros S/A. Estava claro, a partir dali, que histórias de príncipes não renderiam mais tantos dividendos quanto as fábulas criadas em computador.

Então Jobs é a salvação? Mais ou menos. No começo, a sua Pixar precisava muito mais da força do Reino Encantado do que o contrário. O roteiro era pensado na Disney, o marketing e a distribuição também. À Pixar cabia o desenvolvimento do filme. Só que Jobs descobriu que sem a sua empresa, Eisner faria novos Treasure Planets. E cobrou por isso. A relação comercial, antes de 70% a 30% dos lucros em favor da Disney, mudou. Pixar, agora, quer a maioria dos dividendos, num acordo de aluguel do sistema para a parceira. Funciona assim: A Pixar produziria tudo e ficaria com o lucro, enquanto a Disney distribuiria o filme por uma taxa inferior a dez por cento dos ganhos. ?Não alugamos nada de ninguém?, esbravejou Eisner em reunião com acionistas. A Pixar está cada vez mais distante da Disney.

Antes de se afastar, porém, a dupla ainda vai dividir os ganhos do filme Finding Nemo, que está em cartaz nos EUA e conta a história de um peixinho que quer se livrar da superproteção paterna. Os especialistas dizem que será um novo hit. Há ainda dois projetos combinados em contrato: The Incredibles e Cars. Depois disso, o futuro da dupla é incerto. Eisner diz que sua companhia já tem conhecimento suficiente par rodar os próprios filmes de animação gráfica. E que poderia criar e digitalizar novas histórias com antigos personagens, como Peter Pan. Ou seja, voltar aos anos 80 com a tecnologia de 2003. ?Todas estas mudanças terão impacto daqui a cinco ou seis anos. É preciso ter paciência?, diz Eisner. É que mais os acionistas têm feito nos últimos anos.