Não é mais um mistério que, para uma empresa se fortalecer a médio e longo prazos, é preciso promover mudanças nos modelos de produção, operação e comercialização. Urgências associadas à crise climática batem à porta dos tomadores de decisão diariamente, mas a mensagem entregue pode ainda não estar clara: a economia circular não é mais uma opção, mas um elemento-chave para garantir a sobrevivência e competitividade de um negócio.

Se, por muito tempo, o modelo linear ditou produções em massa, com um crescimento baseado na exploração de recursos naturais, as empresas chegam, hoje, ao ponto sem retorno, em que avanços tecnológicos deixaram um rastro de resíduos e poluição. Agora, precisam cumprir acordos setoriais, estabelecer metas ESG e net zero, atender a exigências de consumidores, buscar novos materiais e desenvolver soluções efetivas para cuidar dos passivos gerados. Porém, metas sem planos de ação podem ficar apenas nas capas de revistas.

De acordo com a organização Circle Economy, o mindset circular aplicado aos negócios pode auxiliar na redução de 39% das emissões de gases de efeito estufa até 2032, ao reduzir, reutilizar, recuperar, reciclar insumos e transformar produtos em serviços. A circularidade precisa estar cada vez mais associada às estratégias de baixo carbono das empresas – não somente nas decisões sobre design de produtos ou novas tecnologias, mas sobre responsabilidade compartilhada, criação de mercado e investimentos.

Para que as ações sejam eficazes, deve-se enxergar a economia circular não como um ativo de marketing, mas uma prioridade nas discussões internas da empresa, do chão de fábrica à presidência, para transformar processos com um olhar sistêmico. Embora a tecnologia seja importante, ela é só uma parte. Precisamos integrar os atores e múltiplos interesses ao longo da cadeia produtiva para gerar soluções em escala.

“Economia circular não se faz sozinho. Uma ação sem ganho de escala é um projeto, e não uma solução. O engajamento estruturado em articulação com outras empresas e setores é a virada de chave do linear ao circular, viabilizando a cadeia reversa dos materiais”

Além disso, a definição de lucro e valor se dá por uma nova régua econômica. O que pode parecer, à primeira vista, com um custo desnecessário é o que vai garantir a sobrevivência do negócio adiante. É fundamental alcançar contas mais complexas, analisando não só o custo para as indústrias, mas também o custo para a sociedade. Apostar na circularidade, com recursos, defesas públicas e compromissos que saem do papel, será um diferencial competitivo.

De todas as dicas, a que talvez seja a mais dolorosa: economia circular não se faz sozinho. Uma ação sem ganho de escala é um projeto, e não uma solução. O engajamento estruturado em articulação com outras empresas e reunindo diversos setores costuma ser a virada de chave do linear ao circular, viabilizando a cadeia reversa dos materiais.

Ao redor do mundo, inclusive no Brasil, hubs de economia circular trazem mediadores para mostrar os benefícios estratégicos da circularidade, transformar relações comerciais e redefinir papéis e responsabilidades, ao integrar diversas companhias numa agenda comum de discussão. Trocas de informações necessárias ao redesenho de processos só acontecem em ambientes de confiança. São esses ecossistemas que vão potencializar soluções circulares, por construírem uma inteligência coletiva que dificilmente seria estruturada de forma isolada pelas empresas.

Beatriz Luz é fundadora e diretora da Exchange 4 Change Brasil e do Hub de Economia Circular Brasil