Janeiro foi atípico para o mercado financeiro brasileiro. O real avançou 4,86% em relação ao dólar. Foi a maior apreciação mensal da moeda brasileira frente à americana desde novembro de 2020 (6,82%). Considerando-se apenas os meses de janeiro, foi a mais alta desde os 5,57% de 2019. 

O real se destacou. Entre 33 moedas relevantes, foi a segunda maior alta, só superada pelo peso chileno, com uma apreciação de 6,4%. No último dia do mês, a taxa de câmbio era de R$ 5,306, a menor desde 22 de setembro do ano passado (R$ 5,303).

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O movimento também foi atípico para as ações. O Ibovespa encerrou a 112.143 pontos, nível comparável ao de outubro de 2021, com uma alta acumulada de 6,98%. Foi o melhor desempenho mensal desde dezembro de 2020 e o melhor janeiro desde 2019. 

Esse movimento de alta do real e das ações é explicado por dois motivos. O primeiro é um processo de acomodação dos mercados, tanto desenvolvidos quanto emergentes, à mudança esperada nas condições da economia americana. Em meados de janeiro, após a primeira reunião do ano, o banco central americano deixou claro que os juros vão subir e que a liquidez vai ficar apertada nos Estados Unidos ainda no primeiro trimestre deste ano.

Essa mudança de rumo levou a uma forte correção em Wall Street. Em janeiro, o índice americano S&P 500, o mais representativo do mercado acionário, recuou 5,3%. O mercado americano permanece em excelente forma. A alta nos 12 meses findos em janeiro ainda é de 21,6%, uma das maiores dos últimos tempos. Porém, os especialistas estão convencidos de que haverá uma reacomodação. Com os juros subindo nos Estados Unidos, parte dos novos recursos que migrarem para o mercado deverão procurar alternativas mais rentáveis, e o Brasil se destaca neste cenário.

Por quê? Devido à alta dos juros e à baixa nos preços das ações. O ano de 2021 foi atípico devido à alta da inflação. No entanto, a perspectiva para 2022 é de uma volta das taxas de juros reais brasileiras ao campo positivo. Considerando-se a edição mais recente do Relatório Focus, a projeção para este ano é de uma inflação de 5,3% e de taxas de juros de 11,75%. Um cálculo muito simples indica uma taxa de juros real acima de 6% ao ano nesse período. 

Pode ser que a inflação suba um pouco além disso, e pode ser que o Banco Central (BC) demore um pouco mais para elevar os juros a esse patamar. Ainda assim, os juros reais seriam de cerca de 5% ao ano. Considerando-se a inflação nos Estados Unidos medida pelo índice de preços ao consumidor, os juros reais por lá são de quase 7% negativos. Isso torna os ativos brasileiros atrativos, apesar das condições adversas da economia.

O mesmo raciocínio vale para as ações. O Ibovespa caiu 17% no segundo semestre do ano passado. As ações ficaram baratas, ainda mais considerando-se os bons resultados esperados. Um bom exemplo são os grandes bancos de varejo. Suas ações caíram ao durante 2021. Uma das causas foi o temor de que a alta dos juros elevasse a inadimplência das carteiras de crédito. Outra foi a preocupação com a concorrência das fintechs.

A relação Preço/Lucro dos bancos de varejo encerrou 2021 ao redor de 7. Na prática, isso quer dizer que os lucros esperados iriam repor o capital investido na ação em sete anos. Historicamente, essa relação para os bancos brasileiros fica ao redor de 11. Ou seja, um desconto de um terço do preço.

O mercado brasileiro se tornou atrativo. Quando 2021 acabou, os gestores de recursos internacionais se viram diante de um novo ano, tendo de entregar bons desempenhos para garantir seus bônus (e seus empregos). E os preços de liquidação da B3 foram suficientes para atrair recursos em uma quantidade capaz de valorizar as ações e a reduzir a cotação do dólar em relação ao real.