Em sessão reduzida na volta do Carnaval, o dólar à vista caiu mais de 2,5% e voltou a fechar abaixo de R$ 5,80, acompanhando a onda de enfraquecimento da moeda americana no exterior. O real apresentou o melhor desempenho entre as principais moedas globais, refletindo também os movimentos dos dois últimos dias, quando o mercado local esteve fechado.

Investidores reagem à perspectiva de queda maior de juros pelo Federal Reserve neste ano, após dados aquém do esperado do mercado de trabalho, e a sinais mais amenos de Donald Trump em relação a tarifas. A retomada das negociações entre EUA e Ucrânia para entendimento sobre exploração de minerais, considerado um prenúncio para um acordo de paz, também contribuiu para o recuo do dólar.

Os ruídos políticos domésticos provocados pela indicação da presidente do PT, Gleisi Hoffman, para a Secretaria de Relações Institucionais (SRI) no fim da semana passada ficaram em segundo plano. A ascensão de Gleisi ao posto de articuladora política do governo, aliada ao mal-estar provado pelo bate-boca entre Trump e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, levaram o dólar a superar R$ 5,90 na última sexta-feira.

Com início dos negócios às 13h nesta Quarta-Feira de Cinzas, o dólar abriu em queda firme e já recuava mais de 2% antes da primeira meia hora de pregão. Com mínima a R$ 5,7525, a moeda fechou a R$ 5,7560, em baixa de 2,71%, após ter avançado 3,24% na semana passada. No ano, a divisa acumula desvalorização de 6,86%.

Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis moedas fortes, o índice DXY caiu mais de 1%, furando o piso dos 105,000 pontos, com mínima aos 104,259 pontos no fim da tarde. Destaque para a baixa de mais de 1,5% em relação ao euro, diante do aumento dos gastos da União Europeia em defesa.

Relatório ADP mostrou que o setor privado dos EUA gerou 77 mil empregos em fevereiro, bem abaixo das expectativas (143 mil). As atenções se voltam agora ao relatório oficial de emprego (payroll) na sexta-feira, 7. De outro lado, dados do setor de serviços e de encomendas à indústria vieram melhores que o esperado.

Monitoramento de ferramenta do CME Group mostram chances superiores a 30% de corte de 75 pontos-base na taxa básica americana neste ano, com junho despontando como o mês mais provável para a redução inicial, com mais de 80% de probabilidade.

“A mudança de narrativa deu força para as moedas emergentes, já que agora se espera que o Fed implemente medidas de alívio mais abrangentes do que o Banco Central Europeu nos próximos 12 meses”, afirma, em nota, a economista-chefe da gestora americana VanEck, Natalia Gurushina, acrescentando que os adiamentos de última hora em imposição de tarifas também “estão ajudando” os mercados emergentes.

À tarde, o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, disse em entrevista a Fox News que Trump está inclinado a excluir o mercado do Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA, na sigla em inglês) do processo de aumento de tarifas. Em seguida, contudo, Trump comentou que os esforços do Canadá para conter o contrabando de fentanil aos EUA ainda não são “bons o suficiente”. A Casa Branca informou que Trump vai conceder prazo de 1 mês para aplicação de tarifas apenas a veículos da USMCA.

O economista André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferências Remessa Online, destaca que o DXY já acumula queda de 3% em março, o que favorece as moedas emergentes, com destaque para o real e o peso chileno.

Galhardo atribui parte desse movimento a um possível acordo de cessar-fogo na Ucrânia, com sinais de reaproximação entre Trump e Zelensky, após o entrevero no Salão Oval da Casa Branca na semana passada. O presidente ucraniano disse hoje que as equipes dos dois países estão reunidas e que é possível ver o resultado das conversas já na próxima semana.

“Outro fator que contribui para a valorização as moedas emergentes são os dados recentes da economia americana. Apesar de desempenho levemente acima das projeções, eles sinalizam desaceleração entre janeiro e fevereiro”, afirma Galhardo. “Isso abre espaço para que o Fed reduza os juros em junho e realize mais dois cortes no segundo semestre, caso os impactos das tensões comerciais sobre preços não sejam imediatos ou significativos.”