02/09/2009 - 7:00
DINHEIRO – As grandes economias mundiais irão encolher neste ano, enquanto é esperada uma estagnação no Brasil. Esse contraste já se reflete nos balanços financeiroos da Basf?
ROLF-DIETER ACKER – Em todo lugar, a crise ainda existe. Se compararmos o ano passado com este, houve uma retração na demanda mundial. Mas alguns países estão melhores que outros. Acredito que o Brasil terá em 2009 uma estagnação positiva, dado o cenário de queda em boa parte do mundo. Aqui os números da Basf indicam crescimento. Metade do faturamento da companhia no continente vem do setor de tintas e do agronegócio. Ambos estão bem e apresentam potencial de crescimento. Em 2008, o setor agro cresceu 27%, com vendas de 769 milhões de euros, e o de tintas, 13%.
DINHEIRO – De que forma a crise afetou a Basf?
ACKER – Evidentemente, sempre há um impacto. Como estamos em diversos ramos da indústria, sentimos também quando a crise chegou. Se a economia desacelera, a indústria produz menos e, assim, caem as encomendas. Mas já reagiu e vemos um crescimento, mesmo que o Brasil não cresça muito. Alguns dizem que a recuperação mundial virá em formato de V. Outros em U ou em W. É difícil saber como será.
DINHEIRO – Como a Basf vê o Brasil dentro dos Brics?
ACKER – A prioridade é a China em razão do gigantesco potencial do mercado interno e que mantém elevadas suas taxas de crescimento. Depois vem o Brasil, que terá em dois ou três anos a maior produção agrícola do planeta, à frente dos Estados Unidos, e uma grande população entrando para o mercado de consumo. A Rússia e a Índia dependem muito de iniciativas externas. O Brasil, atualmente, depende só de si.
DINHEIRO – As taxas de crescimento não preocupam?
ACKER – Os números absolutos não importam. Importa mais que até a estagnação, se houver, será positiva. Todos os mercados podem amadurecer suas economias, inclusive o Brasil. A crise, para nós, é um bom teste.
DINHEIRO – Depender demais do mercado interno não é um grande risco? Há um limite, não?
ACKER – Não porque há muito espaço para avançar no mercado doméstico.
Se o mercado interno estivesse saturado, seria fundamental exportar. Mas o Brasil tem mantido as exportações, ao mesmo tempo que amadurece o consumo interno. Essa é uma particularidade da economia brasileira. No entanto, é fato que todas as economias dos Brics sairão mais fortes dessa crise.
DINHEIRO – A valorização do real não atrapalha?
ACKER – Se você perguntar para os empresários, eles vão sempre dizer que sim. Principalmente para os exportadores. Mas é um erro criticar a valorização do real porque esse é um indicador de que as coisas por aqui vão bem. Torcer pela disparada do dólar seria como torcer contra o País. É muito fácil para quem atua com o comércio exterior ficar sentado no sofá, assistindo ao faturamento subir com a desvalorização do real. Dólar caro é um veneno doce. O que atrapalha é a oscilação.
DINHEIRO – O que os empresários deveriam fazer?
ACKER – A lógica é outra. Se o dólar cai, é sinal de que está entrando moeda estrangeira na economia, de que o consumo interno deve crescer e de que há a chance de investir na modernização dos processos produtivos e aumentar a produtividade e, por consequência, a competitividade.
DINHEIRO – Isso no longo prazo…
ACKER – Sim. Não devemos pegar as ondas da economia. Sempre vai subir ou descer. Uma moeda forte é bom sinal. Significa a volta da confiança e bom cenário para a indústria e para os investimentos.
DINHEIRO – Passada a crise, a geografia da economia mundial será outra?
ACKER – Não acredito. A discussão agora é como estão, e como ficarão, os Estados Unidos. Eles são responsáveis por 25% do consumo mundial, e o segundo colocado tem menos da metade. Essa realidade não irá mudar durante muitos anos. É fato que a Europa vai levar mais tempo para voltar a crescer, e os emergentes, como o Brasil, ganharão mais espaço nos temas mundiais. Por isso, vivemos tempos interessantes.
DINHEIRO – Entre os setores em que a Basf está, quais são os melhores e os piores no Brasil?
ACKER – O mercado agrícola é o carro-chefe. No ano passado, o setor de defensivos agrícolas movimentou no Brasil US$ 6,1 bilhões, atrás somente dos US$ 8,5 bilhões dos Estados Unidos. Essa área responde por 30% da nossa receita no continente. As vendas de tintas (a Basf é dona da marca Suvinil) têm uma fatia de 20% da receita. Ou seja, ambos são os melhores para a Basf.
DINHEIRO – E quais são os setores que estão mal?
ACKER – Por outro lado, áreas ligadas a commodities sofreram com a queda das cotações. É o caso das mineradoras, petroquímicas e setor plástico, onde também estamos. Há mercados menores, como o de químicas especiais para vitaminas, cosméticos, etc.
DINHEIRO – O recente salto da construção civil e da indústria automotiva tem puxado a receita da Basf?
ACKER – Sempre ajuda, mas não é significativo. As oscilações para baixo ou para cima são pequenas. Quando há construção de imóveis, vendemos muita tinta para construtoras. Quando a procura por imóveis novos cai, cresce a procura por tinta para pequenas reformas. Ou seja, nos últimos anos, as vendas estão crescendo de forma consistente, sem muitas variações. Já no caso das montadoras, quando a produção cresce, há naturalmente uma demanda maior por tintas automotivas porque há mais carros no mercado. Em resumo, temos compartilhado com todos os setores seus desempenhos, mas nosso desempenho é independente da conjuntura.
DINHEIRO – E o incentivo da redução do IPI?
ACKER – Foi ótimo. Com a crise, o governo precisava reagir e fez isso na hora certa. O governo brasileiro fez um excelente trabalho, assim como fizeram os Estados Unidos, a União Europeia – onde a Alemanha deu dinheiro para consumidores trocarem de carro com mais de dez anos de uso – e a China.
DINHEIRO – Como presidente da Basf na América do Sul, o sr. tem acompanhado a forte influência da política nas economias, não?
ACKER – No continente, a política tem muita força na economia. Nesse cenário, o Brasil é mais sólido. Peru, Chile e Colômbia são também firmes nesse sentido. Argentina e Venezuela são diferentes, mas temos boas operações lá.
DINHEIRO – O que dizer do aumento do crédito no Brasil?
ACKER – A taxa de juros está baixa e vai cair um pouco mais. Será importante para os consumidores brasileiros nos próximos anos. Além da taxa, o aumento do volume de crédito evidentemente ajuda a estimular a economia e favorece o consumo. Mas nossos produtos não demandam muito crédito direto. Por isso, a influência e indireta.
DINHEIRO – A Basf pretende ampliar os investimentos no Brasil?
ACKER – Vamos investir US$ 250 milhões entre 2009 e 2012 em desenvolvimento e pesquisa de novos produtos, modernização das fábricas e ganho de eficiência.
DINHEIRO – O investimento leva em conta as incertezas do cenário mundial?
ACKER – Em 2011, faremos aniversário de 100 anos no Brasil. Já vimos todo tipo de cenário aqui. O segredo para continuar crescendo é sempre investir, enxergar as potencialidades e aproveitar as oportunidades. Historicamente, no Brasil os desafios são sempre positivos.
DINHEIRO – Passada a crise, o Brasil terá mais importância sob a ótica da matriz?
ACKER – O Brasil sempre esteve nas prioridades da matriz na Alemanha. Ainda existe muita coisa que precisa melhorar aqui, principalmente na questão da infraestrutura. Essa é a base de todo e qualquer crescimento e, agora, os governos estão tomando consciência disso. Mas, mesmo assim, o potencial de crescimento da economia brasileira desperta o interesse de qualquer empresa no mundo.
DINHEIRO – Os atuais projetos em infraestrutura são suficientes para garantir a vinda de novos investimentos?
ACKER – Ainda não. Na China, por exemplo, primeiro eles constroem portos, aeroportos e rodovias, ou seja, toda a infraestrutura para o funcionamento de uma grande empresa. Aqui no Brasil, é o contrário. Primeiro a empresa é convidada, depois as obras começam a ser feitas.
DINHEIRO – Muitos analistas dizem que a reação da economia mundial virá em 2010, puxada pelos emergentes, inclusive o Brasil. O sr. compartilha dessa opinião?
ACKER – Sou sempre um otimista e acredito na força da economia brasileira. O Brasil sempre foi para a Basf uma terra de grandes desafios e oportunidades. Desta vez não será diferente.